O Estado de S. Paulo
Como fez no campo externo, Lula vai ter de se reequilibrar entre MST e agronegócio
Assim como jamais deveria fazer loas à
China e à Rússia, duas ditaduras, e espezinhar os Estados Unidos e a Europa, as
grandes democracias ocidentais, o presidente Lula não deveria tomar partido tão
explicitamente entre o agronegócio e o MST. Mais impulsivo, emocional e língua
solta, ele tem de manter a cabeça fria e o pragmatismo dos dois primeiros
mandatos para se equilibrar entre interesses conflitantes.
A inédita opção da Agrishow por um ex-presidente, Jair Bolsonaro, contra o ministro da Agricultura do atual governo, Carlos Fávaro, pode ser entendida como declaração de guerra do agronegócio ao governo e ao próprio Lula, que contra-atacou suspendendo o patrocínio do Banco do Brasil à maior feira do setor no País. Guerra é guerra.
A má vontade do agronegócio com Lula é
antiga e o encanto com o bolsonarismo é forte, basta ver o mapa eleitoral de
2022. O problema é que a agricultura precisa do governo e quem ganhou foi Lula.
E Lula precisa da agricultura, que, bem ou mal, é quem segura o PIB. O setor
depende de instrumentos de governo, para produção interna, distribuição,
comercialização e exportações. E o governo depende do setor para garantir o
abastecimento, a economia, a balança comercial, empregos e renda.
Estar bem ou mal com o governo de plantão
faz toda a diferença para investimentos, financiamentos e regulamentações do
setor. E Lula estar bem ou mal com o setor define se o clima será de paz ou
guerra, inclusive no Congresso, onde a bancada ruralista não está para
brincadeira, e Lula tem CPIs, âncora fiscal e reforma tributária com que se
preocupar, além das sabatinas de ministros do STF e embaixadores.
Por falar nisso, enquanto o governo consome
energia com a CPI do golpe, o bolsonarismo se move por outra CPI, a do MST. Já
houve uma, duas, sei lá quantas investigações sem sucesso sobre o movimento,
que, inclusive, tem bons serviços prestados no campo, a famílias e à produção.
Mas o alvo da CPI não é o MST, é Lula, que baixou a guarda. Levou João Pedro
Stedile para a China, destacou o ministro da Fazenda para negociar com
invasores de terras e, agora, vai ter de se equilibrar melhor entre o
agronegócio e o MST, como se reposicionou nas questões externas.
Assim como há militares e militares, líderes no agronegócio discordam da desfeita da Agrishow e líderes no MST criticam invasões com menos de seis meses de governo. Em vez de optar por um lado dos conflitos, Lula precisa atrair os moderados de cada lado, como nas Forças Armadas. O Brasil está rachado ao meio. Além de não perder, ele precisa conquistar apoios no campo adversário.
O setor-agro é ogro.
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