domingo, 9 de abril de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

É absurdo anular acordos de leniência da Lava-Jato

O Globo

Ação movida por três partidos no Supremo cria revisionismo para expurgar corrupção da História

É completamente descabida a ação conjunta movida por PSOLPCdoB e Solidariedade junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) exigindo a suspensão do pagamento de indenizações e multas pelas empresas cujos executivos confessaram atos de corrupção desmascarados pela Operação Lava-Jato. Sob o argumento ardiloso de que os acordos de leniência assinados pelas empresas foram “pactuados em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional”, os três partidos pretendem acabar com o que chamam de “hermenêutica punitivista e inconstitucional do lavajatismo”. O STF deveria negar imediatamente o pedido.

Os erros e ilegalidades cometidos pelo então juiz Sergio Moro em conluio com procuradores são todos de conhecimento público, assim como suas decisões sobre a própria carreira política fora do Judiciário. Nenhum desses fatos, contudo, justifica interromper o ressarcimento do Estado por criminosos confessos.

Os três partidos tentam sustentar que o Brasil viveu um período de violação generalizada de direitos fundamentais, batizado com o epíteto curioso de Estado de Coisas Inconstitucional. Esquecem que as empresas brasileiras envolvidas na Lava-Jato fizeram acordos com a Justiça de outros países, como Estados Unidos ou Suíça. Será que, na visão de PSOL, PCdoB e Solidariedade, nesses lugares também houve atropelo indiscriminado de direitos fundamentais?

O revisionismo proposto pela ação conjunta pretende expurgar da História brasileira o maior caso de corrupção já desvendado por aqui. Em certa medida, lembra as ordens do líder soviético Josef Stálin para apagar de fotografias as imagens de ex-aliados que haviam se tornado inimigos.

Amplos setores da esquerda acreditam na teoria da conspiração segundo a qual a Lava-Jato foi fruto de uma operação conjunta entre juízes, Ministério Público, Polícia Federal, autoridades americanas, adversários do PT, imprensa e quem mais lhes convém colocar no balaio. Entre os motivos alegados está a noção estapafúrdia de que o objetivo da operação era prejudicar a ascensão de um Brasil rico em petróleo e a operação das empreiteiras brasileiras no exterior. A conveniência política dessa narrativa é óbvia: com ela, os culpados são magicamente transformados em vítimas. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva espalha essa versão, provando que, na hora de disseminar desinformação, pouco deve ao antecessor.

Infelizmente, o pedido de suspensão dos pagamentos não é um caso isolado. A Lei das Estatais, uma das poucas respostas institucionais sólidas aos casos de corrupção desmascarados, começou a ser alvejada mesmo antes da posse. Em dezembro, o PCdoB ajuizou ação no STF questionando a quarentena a dirigentes partidários e de campanha eleitoral indicados para estatais. Em decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski ainda sujeita a julgamento em plenário, parte sensível da lei foi anulada. Espera-se que os ministros derrubem tanto essa liminar quando o pedido descabido de suspensão do pagamento de indenizações e multas. A Petrobras recebeu de volta mais de R$ 6 bilhões roubados, uma pequena fração dos desvios descobertos. É preciso evitar que a corrupção se repita.

Exigir nota fiscal eletrônica do ouro não basta para coibir garimpo ilegal

O Globo

Medida é necessária, mas atividade que cresceu no vácuo do Estado não desaparecerá de uma hora para outra

Não é sem tempo a decisão da Receita Federal de exigir nota fiscal eletrônica para operações com ouro no Brasil. A medida, obrigatória a partir de julho, tem como objetivo coibir a farra da ilegalidade. O documento será emitido na primeira compra do ouro bruto, na importação, exportação e em transações de instituições financeiras. O controle frágil, a dificuldade de rastreamento e a falta de transparência na cadeia de produção são apontados como incentivos à proliferação de garimpos clandestinos, que provocam graves danos ao meio ambiente e tragédias humanitárias como a dos ianomâmis.

Atualmente as operações são feitas com notas fiscais de papel, fáceis de fraudar e difíceis de fiscalizar. O quadro é agravado por uma legislação leniente, aprovada em 2013, no governo Dilma Rousseff. Um “jabuti” incluído pelo deputado Odair Cunha (PT-MG) numa Medida Provisória sobre seguro agrícola estabeleceu a presunção da boa-fé na compra de ouro. Na prática, basta o vendedor dizer que o metal tem origem legal, mesmo que tenha vindo de reservas indígenas ou áreas de preservação ambiental. Ainda que posteriormente sejam comprovadas irregularidades, o comprador não será punido. Na última quarta-feira, uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF, suspendeu o trecho da lei que permite esse absurdo.

O vale-tudo que impera no setor beneficia garimpeiros ilegais e comerciantes que “esquentam” o ouro obtido irregularmente. Não são poucos. Entre 2015 e 2020 foram vendidas no Brasil 229 toneladas de ouro com indícios de irregularidade, segundo estudo do Instituto Escolhas. É quase metade da produção nacional.

A extração ilegal de ouro é nociva para a população e o meio ambiente, pois contribui para o desmatamento e a contaminação dos rios, afeta atividades como pesca, turismo e subsistência das comunidades ribeirinhas. Em reservas indígenas, tem consequências desastrosas. Lideranças locais relatam que, além de levarem doenças às aldeias, os invasores fazem aumentar casos de violência, prostituição e alcoolismo.

Ainda que louvável, a nova norma da Receita não resolverá o problema do garimpo ilegal. Só surtirá efeito com outras medidas de combate às atividades irregulares. É verdade que a troca de governo representou uma mudança na atitude diante do problema. Mas os desafios são imensos. Somente nas terras ianomâmis havia 20 mil garimpeiros. Muitos já foram afastados do local nos últimos meses, mas há grupos que resistem.

A queima de máquinas, equipamentos, balsas e aviões não fará desaparecer de uma hora para outra uma atividade que durante anos cresceu no vácuo de fiscalização, sob vista grossa das autoridades e uma legislação frouxa. O ministro Gilmar deu 90 dias para o governo criar um marco normativo para o comércio de ouro. É preciso correr. Se não forem oferecidas alternativas aos milhares de garimpeiros na ilegalidade, eles voltarão. A nota fiscal eletrônica e a decisão do Supremo são passos importantes, mas insuficientes.

Haddad e o gasto

Folha de S. Paulo

Ministro acerta ao mirar despesas, dado que meta de superávit continua incerta

Em entrevista à Folha, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mostrou compreensão de sua principal missão no cargo —atuar como zagueiro, em suas palavras, protegendo o Tesouro Nacional para que o governo tenha condições de realizar políticas sustentáveis.

Para tanto, será preciso atuar ao mesmo tempo na recomposição de receitas e no controle das despesas.

No primeiro quesito, o ministro acerta ao apontar para benefícios injustificáveis a setores específicos, que minam a capacidade fiscal —tradição do patrimonialismo.

Eliminá-los é tão desejável quanto difícil, mas cabe o esforço. Cumpre escolher as batalhas, sob pena de resistência geral que no passado inviabilizou progressos. É notória a permeabilidade do Congresso a grupos de interesse.

Do lado do gasto, faltam esclarecimentos. Foi positiva a apresentação dos termos gerais do que se pretende como nova regra fiscal. Descartaram-se, ao menos para o momento, teses mais exóticas de que não há restrições para os dispêndios. Agora, o debate se afunila em torno da velocidade e da dimensão do ajuste necessário.

Os parâmetros apresentados indicam aumento da despesa entre 0,6% e 2,5% ao ano acima da inflação e, ao mesmo tempo, explicitam uma meta de melhoria do saldo primário —que passaria de um déficit de 0,5% neste ano para uma sobra de 1% do PIB em 2026.

Permanece duvidoso, contudo, como tal trajetória será obtida, na medida em que um conjunto grande de gastos obrigatórios tem crescimento contratado acima da inflação (caso da Previdência) ou regras vinculadas à receita que serão restauradas (educação e saúde).

Sem tratar desses mecanismos, a nova regra poderá cair no risco de sempre, o de comprimir despesas não obrigatórias, sobretudo investimentos. É positivo, nesse contexto, que Haddad se mostre disposto a propor alterações nos parâmetros que guiam os desembolsos obrigatórios, o que depende de reformas constitucionais.

Quanto ao resultado primário, também não está claro como se retornará ao terreno positivo. No regramento atual, baseado na Lei de Responsabilidade Fiscal, a meta do ano é referência crucial.

Desvios de receitas e gastos são avaliados bimestralmente e, se for necessário, há contingenciamento, além de impedimentos à criação de compromissos permanentes sem contrapartida.

A credibilidade da política econômica depende mais do que das boas intenções do ministro. É preciso que o projeto de lei complementar em elaboração pela Fazenda não enfraqueça as restrições e, além da busca por novas receitas, também demonstre que haverá controle das despesas públicas.

Quantidade e qualidade

Folha de S. Paulo

Liberar abertura de cursos de medicina é correto, mas não resolve disparidades

O Ministério da Educação autorizou a abertura de novos cursos de medicina em instituições privadas de ensino superior, que havia sido barrada por portaria de Michel Temer (MDB) em 2018, sob o argumento de que a proliferação de escolas diminuíra a qualidade.

O problema maior da educação médica no país, porém, não está no número de cursos, mas na formação deficiente e na distribuição desigual entre as regiões.

No ano da portaria de Temer, o Brasil era o segundo país com maior número de faculdades de medicina no mundo: 322 para cerca de 210 milhões de pessoas. A Índia, primeira colocada, tinha 400, mas com o sêxtuplo da população. Nos EUA, eram 131 para cerca de 320 milhões de habitantes.

A quantidade não é acompanhada de qualidade. No exame realizado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, que não é obrigatório para o exercício da profissão, mais da metade dos prestantes acaba reprovada.

A formação poderia melhorar se avaliações como a do Cremesp se tornassem obrigatórias para a atuação profissional —assim como ocorre com os formados nos cursos de Direito, que precisam passar na prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Em relação ao número de médicos por habitantes, não temos excesso de profissionais. Há 502.475 médicos no país, com média de 2,4 profissionais para cada mil habitantes, enquanto a média da OCDE é 3,2, e 4 em Portugal.

Há distorções, repita-se, na distribuição: 55% dos médicos estão no Sudeste, que tem 42% da população, enquanto o Nordeste tem 18% dos profissionais e concentra 27% dos brasileiros. No Rio de Janeiro, há 3,7 médicos por mil habitantes, mas no Maranhão há 0,8.

Para minar essas discrepâncias, a nova regra condiciona a criação de vagas e cursos ao chamamento público —quando o governo federal indica em quais municípios as faculdades poderão ser abertas, considerando as necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS).

A volta do programa Mais Médicos, reformulado com incentivos para fixação dos profissionais, é outro recurso para tentar sanar disparidades regionais.

Mas problemas complexos exigem mais do que medidas paliativas. É preciso oferecer condições de trabalho atrativas para médicos e úteis à população, como infraestrutura e novas tecnologias capazes de gerar resultados duradouros.

Menos ideologia, mais tecnologia no campo

O Estado de S. Paulo.

A reforma agrária de molde coletivista proposta pelo MST nada faz pelos pobres no campo, que precisam ser donos de sua terra e participar da revolução tecnológica da agricultura nacional

Segundo apuração do Estadão, o número de invasões de terra em três meses de governo Lula da Silva já superou todo o primeiro ano do governo Jair Bolsonaro. O MST anuncia novas ações para o chamado “Abril Vermelho”. É cedo para dizer se elas se consolidarão em uma tendência. A atitude ambivalente do governo não é alvissareira. Por um lado, Lula, ao longo da campanha, aludiu a um novo rumo para os assentamentos, prestigiando-os como cooperativas. Também fez acenos de reconciliação com o agronegócio. Mas eles eram maculados por uma oscilação entre uma atitude vitimista – na qual Lula se colocava como “incompreendido” – e recobros de vilipêndios ao agro como vilão ambiental, quando não “fascista e reacionário”. Sentindo-se encorajado, o líder do MST, João Pedro Stédile, reavivou a retórica da luta de classes anunciando o retorno às invasões.

Mas o fato é que, seja pela força das circunstâncias ou por convicção (ou a falta dela), esse modus operandi está em declínio. Nas últimas décadas a média de invasões por ano caiu linearmente, de 305 no governo FHC para 27 no governo Temer. Se forem retomadas no governo Lula, será um esperneio incapaz de disfarçar sua obsolescência. Nem por isso deixarão de ser contraproducentes.

Em meados do século passado, as ideologias que nutrem o MST propunham, com suas concepções de reforma agrária, um remédio ineficaz para um mal-estar real: a cultura das velhas oligarquias e sua materialização num sem-número de latifúndios improdutivos. Hoje nem sequer o diagnóstico está correto.

Desde os anos 70 o campo viveu um êxodo para as cidades ao mesmo tempo que protagonizou uma revolução agrícola. Sistemas de crédito aliados à pesquisa e inovação (sobretudo pela Embrapa) criaram novas técnicas que impulsionaram a produtividade, expandiram as fronteiras agrícolas e inseriram o agro na cadeia capitalista global. Com a estabilização da economia depois do Plano Real, o Brasil passou de importador a um dos maiores exportadores do mundo. Os salários no campo subiram, os preços dos alimentos caíram e as divisas do superávit da balança agrícola pagaram as contas de importações de bens industriais.

Os latifúndios improdutivos deram lugar a latifúndios ultraprodutivos. Em especial no Sul e Sudeste, o dinamismo brotou forte também entre pequenos e médios agricultores, que encontraram no cooperativismo a sua força, consolidando uma nova classe média rural.

É verdade, contudo, que esse processo espetacular não foi de todo inclusivo. A pobreza e a improdutividade ainda prevalecem em amplas populações de pequenos agricultores, a maioria no Nordeste. A solução não pode ser nem deixar que esses bolsões sejam esvaziados pela imigração, na expectativa de que sejam ocupados por grandes corporações agropecuárias enquanto as cidades são empilhadas com degredados do campo, muito menos deslocá-los para assentamentos tutelados pelo governo e movimentos como o MST. O foco deve ser conferir a essas pessoas acesso à cadeia agropecuária moderna.

Isso passa por um programa robusto de titulação, para que assentados (em especial na Amazônia) se responsabilizem por suas propriedades e extraiam delas seus frutos. Mas a terra, por si só, é condição necessária, não suficiente. Programas de capitalização, como o Pronaf da gestão FHC, depois desvirtuado na gestão petista, resguardavam fatias dos recursos do crédito rural a pequenos produtores. Mas o grande diferencial de produtividade hoje é a tecnologia. O drama dos agricultores pobres é, mais do que tudo, a exclusão tecnológica. O maior desafio do Estado é arquitetar políticas públicas consistentes de democratização da tecnologia e de capacitação em técnicas e gestão para que a população rural pobre possa prosperar, seja como empreendedores, seja como empregados qualificados. A base de tudo, por óbvio, é melhorar a educação no campo.

Trata-se, em outras palavras, de emancipar essas pessoas marginalizadas integrando-as à revolução do agronegócio, e não de antagonizá-las a ela arrastando-as ao passado: à revolução anacrônica e malfadada do MST.

O segredo das cidades empreendedoras

O Estado de S. Paulo.

Estudo mostra que municípios propícios ao empreendedorismo cultivam ambiente regulatório, infraestrutura, mercados, acesso ao capital, inovação, capital humano e cultura empreendedora

O que torna as cidades amigáveis ou hostis ao empreendedorismo? Quais cultivam ambientes de negócios promissores, quais estão defasadas? Para responder a estas questões, a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) avalia há 10 anos os 101 municípios mais populosos do Brasil, indexando evoluções e retrocessos em um ranking.

O ecossistema do empreendedorismo é mensurado por sete fatores: ambiente regulatório, infraestrutura, mercado, acesso ao capital, inovação, capital humano e cultura empreendedora.

Um bom ambiente regulatório depende tanto de uma burocracia ágil quanto de volumes simples e suaves de tributos associados a gastos públicos de qualidade. Estratégias digitais são imensamente eficazes para facilitar a vida dos empreendedores. A qualidade dos gastos públicos está associada a quatro fatores: autonomia (a capacidade de financiar a administração com receitas locais); gastos equilibrados com pessoal (deixando margem a investimentos); liquidez (recursos em caixa); e investimentos (focados no bemestar da população).

Além do ambiente regulatório, os negócios prosperam em bons ambientes físicos, ou seja, infraestrutura que garanta conectividade física e virtual com outros mercados e condições financeiras e humanas para operações de produção. Além de acesso a rodovias, portos e aeroportos, uma internet veloz é crucial.

Cidades com boas taxas de crescimento, renda, gastos e sofisticação mercadológica oferecem maiores potenciais de clientela e também de parcerias com outros empreendedores.

O empreendedorismo também prospera quando uma cidade oferece acesso ao capital. Populações com altos índices de poupança geram oportunidades de investimentos diretos. Se não forem suficientes, é preciso boas instituições financeiras para operações de crédito. Por último, os empreendedores podem financiar seus negócios vendendo ações ou parte da empresa. Metrópoles como São Paulo, com seus hubs de corretoras, fundos e fintechs, são especialmente propícias.

A revolução industrial 4.0 exige condições favoráveis não só a novos empreendimentos, mas a empreendimentos inovadores, através dos chamados Sistemas de Hélices Quíntuplas: governo, universidade, indústria, sociedade civil e meio ambiente. A proporção de acadêmicos, profissionais e investimentos ligados à ciência e tecnologia é decisiva, assim como o é o capital humano. Empreendedores com maior nível educacional têm mais chance de sobreviver e prosperar. O ecossistema urbano ideal é aquele que oferece boa educação básica e superior, além de cursos técnicos e de capacitação através de sinergias entre o mundo empresarial e o educacional.

A confluência desses fatores leva ao cultivo das crenças e valores do empreendedorismo, como a disposição a assumir riscos e a sede por inovação.

Mas essa cultura pode ser galvanizada por iniciativas municipais, como agências de fomento.

No ranking, São Paulo e Florianópolis mantêm-se estáveis na liderança. Mas ele mostra que intervenções focadas podem produzir resultados imediatos. Com investimentos em estrutura física e tecnologia, em 10 anos o judiciário de Goiânia passou de um dos mais morosos a um dos mais ágeis do País. Brasília, Boa Vista (RR) e Aparecida de Goiânia (GO) foram as cidades que mais subiram. A primeira, por simplificações tributárias e burocráticas; a segunda, por criar uma agência de fomento a pequenos empreendedores; e a terceira, por uma conjunção desses dois fatores.

Comparativamente, o ambiente de negócios no Brasil é notoriamente ruim. Não há muito a esperar de um governo federal atavicamente hostil à iniciativa privada. Mas as prefeituras, mais próximas dos cidadãos e com poder de resolver problemas concretos dos empreendedores, podem, numa pressão difusa, de fora para dentro e de baixo para cima, colaborar para reverter esse quadro.

Nessa missão, o Índice da Enap oferece dados valiosos para os governos emularem as melhores práticas, para os empresários buscarem as melhores oportunidades e para os cidadãos cobrarem seus gestores e incentivarem seus empreendedores.

Nunca tantos moraram na rua

O Estado de S. Paulo.

A rica SP concentra a maior parte dessa população pobre, o que simboliza a complexidade do problema

Está em curso uma batalha judicial a respeito da remoção pela Prefeitura de São Paulo de barracas instaladas em locais públicos por pessoas em situação de rua. Recentemente, o Tribunal de Justiça de São

Paulo derrubou uma decisão liminar que, atendendo ao pedido do deputado federal Guilherme Boulos e do padre Júlio Lancellotti, havia proibido essa conduta da administração municipal. Os autores da ação, assim como a Defensoria Pública de São Paulo, disseram que vão recorrer da decisão do tribunal.

Essa disputa, que tem sido acompanhada de inflamados discursos político-ideológicos dos dois lados, tem o sério risco de ignorar a parte mais vulnerável na história: as pessoas que estão em situação de rua. Não se pode transformar o drama dessa população em disputa político-eleitoral. Cuidar das pessoas e cuidar do espaço público não são ações antagônicas. Fazem parte do mesmo esforço para zelar pelo interesse público, o que exige, como é óbvio, um olhar especialmente atento para quem está em condições de maior vulnerabilidade.

Para desenhar e implementar políticas públicas efetivas, é fundamental conhecer esse fenômeno social, com suas causas, suas dinâmicas e também sua exata extensão. Segundo a série histórica elaborada pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a partir de dados do Cadastro Único (CadÚnico), a cidade de São Paulo nunca teve tantas pessoas em situação de rua como agora. Atualmente, são mais de 52 mil pessoas que vivem nas ruas da capital, o que corresponde a 25% do total da população em situação de rua no País (206 mil pessoas). Na análise desses números, devese ter em conta a subnotificação, estimada em cerca de 35%.

Em relação à cidade de São Paulo, os números dos anos anteriores são 37,2 mil (2021), 48,1 mil (2020), 44,3 mil (2019) e 38,8 mil (2018). A maioria das pessoas em situação de rua é do sexo masculino (mais de 80%) e negra (mais de 70%). Metade da população que vive na rua não completou o ensino fundamental.

O aumento das pessoas em situação de rua relacionase com o crescimento da pobreza e das desigualdades sociais, mas os números revelam que não é apenas uma questão de pobreza regional ou de falta de desenvolvimento econômico. Região mais rica do País, o Sudeste concentra 62% das pessoas em situação de rua.

Só conhecendo a situação concreta dessas pessoas, o poder público poderá atuar de forma adequada. Por exemplo, no levantamento relativo ao ano de 2021, 82% das pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo eram beneficiárias do programa de distribuição de renda do governo federal, então chamado Auxílio Brasil.

Cuidar de quem está morando na rua é muito mais do que apenas discutir onde essas pessoas podem se instalar. É prover condições de subsistência e autonomia, para que elas possam deixar de viver na rua. E é também entender as causas desse fenômeno, atuando para evitar que outros cheguem à mesma situação de vulnerabilidade.

 

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