domingo, 30 de abril de 2023

Vinicius Torres Freire - Era a ideia da "frente ampla"

Folha de S. Paulo

Previsão para alta do PIB de 2023 melhora, mas ainda é medíocre, como a de 2024

É bem possível que o crescimento da economia seja bem maior do que as previsões de quase estagnação que ainda são as da média de economistas do setor privado. O PIB cresceria 0,9% neste 2023, segundo a mediana das estimativas compiladas pelo Banco Central. Os economistas de um banco como o Bradesco, porém, já estimam alta de 1,8% do PIB.

É menos do que medíocre, mas com sufoco social um tico menor e com contas do governo menos avariadas.

Para 2024, a previsão é de crescimento de 1,4%; para o pessoal do Bradesco, 1,5%. Mal se entendeu o que se passou em 2022 (crescimento muito além do previsto) e as projeções deste início de ano estão muito furadas. Logo, tratar de 2024 parece chute distante.

Mas a questão tem interesse político, depende de muita política e, também, do que será de inflação e juros. Se o governo bobear em 2023, se não fizer as mudanças duras, pode ter outro crescimento menos do que medíocre em 2024 e, assim, perder as condições políticas de começar a reconstruir o país.

O crescimento um pouco maior neste ano, com alta ainda forte do salário médio (porém ainda baixo), sugere que as taxas de juros ficarão em níveis mais altos, por mais tempo. O ano de 2024 já está sendo contaminado por um IPCA ainda alto (deve fechar 2023 em 6%, com previsão de 4% para o ano que vem), por uma Selic que só deve começar a cair em agosto, se cair, e condições financeiras gerais apertadas. A contração do crédito bancário começou apenas no final de 2022 e ainda deve durar meses; o mercado de capitais levou tombo enorme.

Quanto à política, considere-se que o andamento da economia seja esse aí das previsões. No biênio 2023-24, o crescimento do PIB seria muito parecido com o de 2017-19 (depois da Grande Recessão, antes da epidemia). Ou seja, um ritmo intolerável para um país em que o nível da renda (PIB) per capita ainda é inferior ao de 2011 e que acabou de eleger um governo do qual espera renovação e reconstrução.

Mas é possível melhorar em 2024, mesmo que a economia não vá decolar, atualmente é otimismo prever crescimento além da média deste século, de 2,4% ao ano. Para tanto, é preciso um esforço político muito grande. O governo Lula 3 joga sua partida decisiva neste ano.

O crescimento pode ser um pouco maior se o dito arcabouço fiscal for aprovado com números e regras mais apertados do que o proposto pelo governo. Isto é, com aumento menor da despesa e normas que tornem possível o superávit primário planejado. Esse é o nó decisivo de Lula 3.

Esse aperto está na mão do Congresso. Mas é difícil que venha mudança maior do que uma regra de superávit obrigatório.

O restante é sabido. Uma reforma tributária leva tempo para fazer efeito prático, mas mudaria expectativas. O governo precisa aprovar as mudanças razoáveis que propôs no crédito. As regras de investimento em água e esgoto, "marco do saneamento", precisavam de aperfeiçoamentos, mas dificultar investimento privado é um tiro de bazuca no pé. Impede criação de emprego, melhoria social e cria desconfiança de que o governo optou de vez por intervenções erradas do Estado.

Rever as despesas obrigatórias e vinculações é outra tarefa para o ano. Por ora, o governo dá indícios de que vá piorar a situação, embora o ministro Fernando Haddad (Fazenda) tenha planos, ainda secretos, de melhorá-la.

A aprovação disso tudo depende de um grande acordo, explícito, apresentado com solenidade, conduzido pelo presidente da República, sem ruídos e falações disparatadas. Não é rotina de política politiqueira. O governo precisa rearrumar a casa, esclarecer programa, afinar discurso e convocar forças políticas e sociais relevantes para esse acordo. Era a ideia da "frente ampla".

 

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