domingo, 7 de maio de 2023

Celso Rocha de Barros - Quem vai delatar Bolsonaro?

Folha de S. Paulo

Escândalos do ex-presidente começam a andar como andavam escândalos em governos menos blindados

Com o caso da falsificação do registro de vacina, os escândalos de Jair Bolsonaro começam a andar como andavam os escândalos em governos menos blindados. Agora é ver quem vai delatar.

Em outros governos, a coisa começava com uma denúncia, pela imprensa ou pelas autoridades. A denúncia gerava desdobramentos políticos, como CPIs, quedas de ministros, inquéritos, delações premiadas, mobilizações da opinião pública e até pedidos de impeachment.

A turma do Jair chegou ao poder pisando nas ruínas do sistema político, destroçado pela Lava Jato. Aprenderam a lição: os partidos tradicionais haviam tolerado democracia demais, liberdade de imprensa demais, investigações demais, autonomia institucional demais, transparência demais.

Os bolsonaristas estavam decididos a não repetir o erro: blindaram-se com os militares, fizeram guerra à imprensa e ao STF, aparelharam o Ministério Público e a Polícia Federal, compraram o Congresso com o orçamento secreto. Suas relações suspeitas preferenciais foram com países árabes que só não são menos transparentes que a Coreia do Norte. Tudo isso com um toque de gênio: o apoio de Sergio Moro, a face pública da Lava Jato.

Com essa proteção, os bolsonaristas conseguiram evitar que as denúncias virassem CPIs, ações da PGR, processos de impeachment. Assim, o ouro dos pastores no MEC, a fraude na compra de vacinas, o próprio orçamento secreto, todos logo saíram do noticiário e foram morrer nas colunas de opinião, inclusive nesta.

Se o mesmo tivesse acontecido com o mensalão, ele teria sido só uma história sobre fraude nos Correios. Se o mesmo tivesse acontecido na Lava Jato, ela teria sido só uma história sobre lavagem de dinheiro usando postos de gasolina.

Agora Jair não é mais presidente, o golpe de 8 de janeiro deu errado e muita gente tem passado bolsonarista para limpar com gestos de independência.

A denúncia de falsificação de registro de vacinação não está com cara de que vai morrer no berço. Pelo contrário: já começou a se desdobrar. Entre as provas colhidas pela polícia está um áudio do ex-major Ailton Barros para o ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, em que propôs um golpe de Estado em dezembro de 2022.

Se as coisas voltarem a funcionar como antes, vamos assistir a uma progressão de prisões, confiscos de celulares, novas provas, novas denúncias, até que alguém faça delação premiada. Aí acaba para Bolsonaro.

Por enquanto, os dois principais candidatos a delator são Mauro Cid e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Ambos devem pegar cadeia longa, cadeia dura, se continuarem protegendo Bolsonaro.

E a questão começa a se impor: por que fariam esse sacrifício? O golpe deu errado. Jair ficará inelegível. Os políticos que pretendem sucedê-lo, como Tarcísio de Freitas e Romeu Zema, vão gastar capital político tentando tirar Anderson Torres ou Mauro Cid da cadeia? Os militares vão se meter nisso?

É sempre possível, porque tem gente aí que pode ter rabo preso na história do golpe. Mas os delatores em potencial não parecem confiantes.

Os bolsonaristas cometeram crimes de maneira tosca, de maneira mal disfarçada, porque contavam com o golpe. Contavam que não sobraria Estado de Direito para investigá-los. Semana passada ficou claro que sobrou mais do que eles esperavam. Veremos se será suficiente.

 

3 comentários:

  1. Uma vergonha esse cara afirmar que o sistema político foi destroçado pela Lava-jato. Em 2013 ele já estava totalmente desmoralizado, pois já estava claro que se tratava de um conjunto d quadrilhas especializadas em capturar o poder político e desviar recursos públicos. A Lava-jato só tornou transparente como isso era feito. Caras como esse, que abundam em nosso jornalismo fake, só se encarregam de normalizar a ladroagem e passar o pano para esses criminosos.

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  2. Eu não vejo erros na Operação Lava Jato!

    Até faço alguns reparos à Operação e aos que buscaram carreira política a partir dela, como::
    i))achei excessiva a condução coercitiva de Lula; e
    ii) Para mim foi uma grande decepção o ex-juiz Sérgio Moro, após fazer um trabalho razoavelmente bom para combater corrupção, eleitoralmente ter ido se juntar a um ator politico sabidamente corrupto e antidemocrático como Jair Bolsonaro.

    Mas há muito de elogiável na Operação Lava Jato@

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    1. Corrigindo: Mas há muito de elogiável na Operação Lava Jato!

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