Folha de S. Paulo
Comando da Câmara indica os termos de um
acordo entre a direita parlamentar e Lula
A Câmara
aprovou a tramitação urgente do teto móvel de gastos Lula-Haddad, o
dito "arcabouço fiscal". Foi uma vitória por 367 votos a 102, com uma
abstenção —presença de 91,6% dos deputados.
Foi uma vitória de Fernando
Haddad, ministro da Fazenda,
e de Arthur
Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Derrota do comando do PT, que não
engole o "arcabouço fiscal" e ainda menos o ligeiro aperto que a
Câmara deu na regra de gasto. Essa tramitação também tem um recado para o
presidente da República.
Nada foi aprovado. O projeto será votado na semana que vem, dia 24. Os números da votação, porém, foram expressivos. A tramitação com urgência reduziu a possibilidade de haver emendas importantes ao projeto. O que importa aqui é menos política econômica e mais a política-politiqueira.
Sob certo aspecto, o governo venceu, depois
de semanas levando safanões, caneladas e rasteiras da Câmara. Sob outro
aspecto, é uma força um pouco ilusória ou sub judice.
Lira atuou um tanto a sua maneira de
trator. Quis mostrar ao governo que pode ser um bom sócio da administração
de Luiz
Inácio Lula da Silva, desde que tenha poder, que seja um pouco o semipremiê
que foi na segunda metade do governo das trevas. Lira ainda não tem esse poder,
diz gente do seu entorno e mesmo do Planalto, que agora parece começar a
entender o jogo.
Não foi a liberação de emendas
parlamentares e outros mimos que facilitou de modo relevante a vitória desta
quarta-feira. O dinheiro e os cargos ainda não chegaram em volume relevante.
Além disso, chegaram por pressão de Lula sobre seus ministros de casa.
Lira quis demonstrar boa vontade e força a
fim de obter de Lula um acordo: quer mais do que emendas para os seus. Quer ser
o diretor de trânsito desses dinheiros, dizer quem recebe, como e quando, em
acordo com suas lideranças amigas. Esse é o primeiro recado para Lula.
A vitória dependeu de um acerto entre a
cúpula da Fazenda e a cúpula de Lira. Não foi uma negociação mediada pela Casa
Civil ou pelo Planalto. Quando o assunto bateu por lá, como na segunda-feira
retrasada, chegou a empacar por uns dias, pois a Casa Civil então percebeu de
vez que a negociação era direta, Fazenda-Lira. Por disputa de poder e por ser
um centro mais petista do governo, a Casa Civil não gostou. Nem do
encaminhamento do assunto nem do teor da nova regra fiscal, ligeiramente mais
rígida.
Além do mais, deputados do PT e economistas
amigos de fora do governo chegaram a formular um plano alternativo. Havia
pressão de deputados próximos da cúpula do partido. Lula interveio e o
movimento parou.
Há um segundo recado para o governo, que
deveria estar ciente disso desde a eleição deste Congresso de direita.
Lira quer se mostrar o fiador da
responsabilidade econômica, por assim dizer. Em entrevistas em Nova York, na
semana que passou, reiterou, agora para o mundo, que vai barrar
"retrocessos" nas reformas liberais de 2016-2022. Diz que a nova
regra fiscal é um "assunto do país". Assim, satisfaz aliados fora do
Congresso, como na finança, parte dos parlamentares mais convicta dessas ideias
e outros que são apenas antipetistas e antilulistas.
A atitude de Lira e seu entorno quanto à
regra fiscal é facilitada pelo fato de o limite de gastos de Lula 3 ser bem
flexível. Dado o aumento de gasto a ser permitido para 2024, Lula deve ter
problema maior com as contas de seu governo apenas em 2025.
A votação desta quarta-feira pode ser o
começo de uma bela amizade entre Lula e o aspirante a semipremiê Lira. Lula
ainda tem dificuldades no Congresso. A Câmara apresentou sua proposta de regras
do jogo e o que tem a oferecer. Falta ver a reação de Lula e dos seus.
Eles venceram...
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