sexta-feira, 2 de junho de 2023

Claudia Safatle - Novo marco fiscal não muda trajetória da dívida

Valor Econômico

Regra melhora o resultado primário em mais ou menos 0,2% do PIB por ano, o que resulta em 1% do PIB de ajuste a cada cinco anos

As várias mudanças feitas no texto do marco fiscal sugerem que a Câmara melhorou substancialmente o arcabouço concebido para substituir o teto do gasto público, mas não o suficiente para garantir que a dívida pública cairá como proporção do PIB. O novo marco fiscal, por si só, não muda a trajetória da dívida bruta/PIB. Ele melhora o resultado primário em mais ou menos 0,2% do PIB por ano, o que resulta em 1% do PIB de ajuste a cada cinco anos. É preciso 1,5% de primário para estabilizar esse indicador de solvência do Estado brasileiro.

Se o governo conseguir apurar as receitas que faltam para fechar as contas com equilíbrio - são cerca de R$ 150 bilhões -, aí sim poderá falar em zerar o déficit no próximo ano. Mas a dívida bruta continuará subindo até a casa dos 77% do PIB em 2026.

Analistas do setor privado, porém, falam que a dívida subirá para a casa dos 80% a 81% do PIB, segundo a pesquisa Focus, do Banco Central.

Técnicos oficiais chamam a atenção, porém, para a capacidade do governo de encontrar receitas tributárias onde ninguém imagina que há.

Exemplo disso foi o empenho do governo em aprovar, no Congresso, uma medida enviada pelo então presidente Bolsonaro, no fim do ano passado, que trata de preços de transferência. Foi importante alterar o modelo brasileiro de preços de transferência principalmente depois que os EUA adotaram medidas que ampliaram a incidência de dupla tributação nas transações entre os países.

O texto aprovado na Câmara e no Senado, conforme sugestão do Executivo junto com a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, alterou o sistema de tributação da renda nas transações de empresas multinacionais (brasileiras ou estrangeiras) que operam a partir do Brasil com suas matrizes e sucursais no mundo. O modelo, agora, está mais alinhado com o da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico).

Outra questão se refere ao ICMS, cujos créditos estavam sendo abatidos da base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL das empresas. Ao proibir que isso fosse feito, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) abriu a porta para que o Tesouro Nacional embolse cerca de R$ 57,98 bilhões no próximo ano e R$ 61,21 bilhões em 2025. Para este ano eram esperados R$ 31,86 bilhões em sete meses.

OS parâmetros aprovados no arcabouço fiscal, que seriam temporários - com duração de um mandato de quatro anos a partir do qual o novo governante fixaria os seus parâmetros -, tornaram-se permanentes.

No Senado, a expectativa do governo é que não sejam feitas mudanças estruturais no texto aprovado que o obrigue a voltar para a Câmara. Há a intenção de retirar o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) das novas regras fiscais, mantendo como era, segundo disse o relator da proposta, senador Omar Aziz (PSD-AM), em entrevista à GloboNews.

É curioso como, sem mais nem menos o Congresso Nacional decidiu que a sociedade brasileira não está mais cansada de pagar impostos. Ao contrário, para um governo que não gosta de cortar despesas, foi o que sobrou.

Não sei se vão conseguir zerar o déficit primário no ano que vem, mas que vão trabalhar duro para isso, vão, sustentam fontes da área econômica.

O mercado, por sua vez, está pessimista ao calcular para 2024 um déficit de 0,8% do PIB, na média, percentual que neste ano deverá ser de 1,3% do PIB, com a dívida passando para a casa dos 80% do PIB no ano que vem.

Já no governo, os dados são bem mais otimistas. Este ano o governo conta com um déficit de 0,5% do PIB, no ano quem vem ele zera. Em 2025 produz-se um superávit de 0,5% do PIB e, em 2026, este sobe para 1% do PIB. E a dívida bruta fica em cerca de 77% do PIB.

Uma coisa é dada como certa na área econômica: o governo terá que reduzir ou até mesmo eliminar os gastos com saúde e educação abatidos do Imposto de Renda, além de tributar os dividendos. Ao comentário de que subtrair as despesas com saúde e educação seria uma pancada na classe média, uma fonte argumentou que não. “Afinal, apenas 1% da população frequenta hospitais e escolas privadas”, respondeu

 

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