O Estado de S. Paulo
Quem criticar e ‘discriminar’ o senador Do Val, alvo de ação da PF, deveria ser preso?
No dia seguinte à aprovação do projeto
contra a “discriminação” de políticos, a Polícia Federal fez uma operação de
busca e apreensão, ontem, dentro do Congresso e do apartamento funcional do
senador Marcos do Val (Podemos-ES). A Câmara tenta criar cidadãos de primeira e
segunda classe, enquanto a PF insiste em mostrar que “todos são iguais perante
a lei”.
O projeto cria privilégios inadmissíveis para Pessoas Politicamente Expostas (PPEs), sem debate e conhecimento da sociedade. De repente, do nada, a urgência foi colocada em votação na noite de anteontem, aprovada rapidinho e, já na sequência, o projeto foi vitorioso, por 252 a 163 votos, prevendo multa e prisão de até quatro anos para agentes financeiros que se neguem a abrir contas ou crédito para os PPEs investigados e processados.
O presidente da Câmara, Arthur Lira,
articulou a aprovação no escurinho do cinema, os líderes aderiram, o governo
lavou as mãos e tudo foi resolvido num estalar de dedos. A autora do projeto é
a deputada Danielle Cunha (União BrasilRJ), filha do ex-presidente da Câmara
Eduardo Cunha, cassado, condenado e preso por corrupção, e a votação começou
antes da apresentação formal do parecer do relator, deputado Cláudio Cajado
(PP-BA), da confiança de Lira.
O projeto segue agora para o Senado e,
aparentemente, não foi só a sociedade brasileira que foi pega de surpresa, o
próprio Senado também. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, disse que nem
sabia do que se tratava. O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues,
admitiu que é, “no mínimo, polêmico”.
O resultado é que, em vez de proteger os
políticos, a Câmara acaba de aumentar a ira da sociedade contra eles. E o pior
é que só Novo, PSOL, PCdoB e Rede se colocaram contra. O PT liberou geral, o PL
se dividiu, o governo se embolou com Lira.
No lado oposto, Pacheco foi previamente
avisado da operação da PF no gabinete e no apartamento funcional do senador Do
Val, que já deu entrevista dizendo que agiu como espião do ministro Alexandre
de Moraes, do STF, contra o então presidente Jair Bolsonaro. Do Val não tem um
tico de credibilidade e suas histórias não têm pé nem cabeça.
É assim que o Congresso, pilar da democracia, mancha a própria imagem, esgarça a confiança da sociedade nos Poderes, nos partidos e nos políticos. Para “descriminalizar” a política é preciso que deputados e senadores parem de legislar em causa própria, de chantagear os governos e de usar energia para ampliar seus privilégios – que não são poucos! Quem “discriminar” Do Val vai ser preso?
Tá.
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