O Globo
Pode ser que a direita se fortaleça mais
ainda com a saída de Bolsonaro. O presidente Lula pode se preparar para a
batalha eleitoral movendo-se para o centro, mas terá de se convencer de que a
esquerda não lhe bastará para a reeleição
Há indicações de que o ex-presidente
Bolsonaro já está preparando sua atuação no próximo período de inelegibilidade,
que o tirará da disputa da Presidência da República em 2026, mas não o impedirá
de permanecer na ação política ativa. Bolsonaro está escolhendo candidatos não
“tremendamente bolsonaristas” para apoiar nas eleições municipais, para manter
acesa a possibilidade de derrotar o PT.
O presidente Lula continuará sendo o grande líder petista, e ninguém duvida de que será candidato à reeleição, na tentativa de alargar o tempo de domínio eleitoral de seu partido, que não tem nenhum líder até o momento que possa se igualar a ele em termos de popularidade. O ministro da Justiça, Flávio Dino, é o mais “midiático” de seus assessores, e o da Fazenda, Fernando Haddad, aquele com mais chance de se eleger se a economia estiver indo bem. Nesse caso, porém, não haverá razão para que Lula não seja o candidato, se a idade permitir.
Em Brasília, não há muita dúvida de que o ex-presidente Bolsonaro será considerado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A dúvida é quando terminará o julgamento, provavelmente não nesta quinta-feira, porque o relatório é muito longo. São tantas coisas acontecendo ou que já aconteceram, relatadas em outros processos, que parece impossível ele escapar de ser punido.
Ainda mais agora que o relator, ministro
Benedito Gonçalves, foi autorizado a incluir em seu relatório fatos que
contextualizem as acusações, sem ser obrigado a se ater especificamente à
reunião de Bolsonaro com os embaixadores para criticar as urnas eletrônicas.
Está claro que já será declarado inelegível neste primeiro processo. Mas não há
dúvida nenhuma de que, mesmo fora da disputa eleitoral, continuará sendo o
grande líder da extrema direita, um cabo eleitoral mais forte que o candidato
que não poderá ser.
Seus seguidores mais fiéis são uma minoria
extremista. Isolados, não o elegeriam em 2018, muito menos lhe dariam a votação
expressiva que obteve em 2022. Assim como a não presença de Lula na urna
eletrônica pela primeira vez desde 1989 ajudou Bolsonaro a obter vitória
tranquila em 2018, o antipetismo também o levou a quase vencer em 2022.
Hoje, ele sabe que “tremendamente bolsonaristas”
são também tremendamente minoritários, e, sem ser ele, não há um extremista que
possa disputar com Lula em 2026. Os ultras formam um grupo que faz muito
barulho, mas é pequeno. A direita, no entanto, continua em plena atividade, com
vários representantes importantes, como o governador de São Paulo, Tarcísio de
Freitas. Ele provavelmente será o desaguadouro desse eleitor de direita que
perderá Bolsonaro como candidato, mas continua antipetista.
O Congresso permanece dominado pela direita
e pelo Centrão. A única chance de Lula — que parece estar indo bem neste
caminho — é a economia crescer. Se os sinais da economia se recuperarem, Lula
poderá vir a ter uma relação mais equilibrada com o Congresso e com o
presidente da Câmara, Arthur Lira, e dar uma equilibrada no seu governo. Talvez
a direita fique até mais forte com Tarcísio ou Romeu Zema, governador de Minas
Gerais, do que com Bolsonaro, um extremista e radical, coisa que Tarcísio não
é.
Pode ser que a direita se fortaleça mais ainda com a saída de Bolsonaro. É nessa direção que ele vai em seu futuro papel de cabo eleitoral, ciente de que, sem a polarização com Lula, não teria sucesso em 2022. A ausência de Lula em 2018 expôs a fraqueza do PT, que não preparou líderes para substituí-lo. A ausência de Bolsonaro poderá facilitar a vida da direita civilizada, que tem vários candidatos em busca dos votos centristas. O presidente Lula pode se preparar para a batalha eleitoral movendo-se para o centro, mas terá de se convencer de que a esquerda não lhe bastará para a reeleição.
Boa análise.
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