Francês era especialista na evolução social do seu país e também profundo analista das realidades brasileira e chilena
PARIS e SÃO PAULO | AFP - O sociólogo francês Alain Touraine,
especialista na evolução social do seu país na segunda metade do século 20,
morreu nesta sexta-feira (9) em Paris, aos 97 anos. A informação foi confirmada
à AFP por sua filha, Marisol Touraine, ex-ministra da Solidariedade e Saúde da
França.
Intelectual de esquerda, mas com tendência
liberal, Touraine foi um meticuloso cronista das mudanças sociais na França a
partir dos anos 1950 e também um estudioso da classe trabalhadora chilena e da
realidade brasileira, que comentou em colunas na Folha entre o final dos
anos 1990 e início dos anos 2000.
Foi autor de dezenas de livros ao longo de
uma carreira universitária de mais de quatro décadas. Era viúvo da pesquisadora
chilena Adriana Arenas Pizarro, morta em 1990.
Nascido em Hermanville-sur-Mer, no noroeste
da França, em 3 de agosto de 1925, ele estudou história.
Embora vindo de uma família nobre e um tanto conservadora, na juventude se interessou muito pelo mundo operário e chegou a trabalhar brevemente em uma mina —experiência que mais tarde o ajudou a escrever um de seus primeiros estudos, sobre mineiros no Chile.
Trabalhou como pesquisador no Centro
Nacional de Pesquisas Científicas, o CNRS, entre 1950 e 1958. Em 1956 foi um
dos idealizadores do Centro de Pesquisas em Sociologia do Trabalho da
Universidade do Chile, onde conheceu sua esposa.
Os protestos estudantis e operários de maio
de 1968 na França o levaram a ampliar seu campo de estudos. Nesse mesmo ano
publicou "O Movimento de Maio ou O Comunismo Utópico".
No ano seguinte, como outros especialistas,
previu a chegada da "Sociedade Pós-industrial" e se interessou pelo
feminismo ou pelos movimentos regionalistas na França.
Em 1973, publicou "Vida e Morte do
Chile Popular", após o golpe de Estado. Touraine não deixou de olhar para
a América Latina, à medida que evoluía para posições mais liberais.
O intelectual também era amigo de Fernando
Henrique Cardoso há cinco décadas. Em 1995, disse à Folha que o ex-presidente
era um professor brilhante e a salvação para o Brasil. Em 2019, em uma viagem
de FHC a Paris, a dupla discutiu a situação da democracia do Brasil durante o
governo do também ex-presidente Jair Messias Bolsonaro.
Touraine opinou sobre os rumos da economia
e da política do Brasil em mais do que uma ocasião. Em textos para a Folha e em
declarações, comentou sobre temas como as origens e consequências da crise da
economia brasileira em 1999 e o engajamento do país no Mercosul, que defendia.
Touraine recebeu distinções como doutorados
honoris causa de instituições como a Universidade de Genebra, na Suíça, a
Universidade de Santiago, no Chile e a Universidade de Bolonha, na Itália.
Levou ainda o Prêmio Princesa das Astúrias na categoria de comunicação e
humanidades, compartilhado com Zygmaunt Bauman e foi reconhecido pelo Estado
francês com a medalha da Legião de Honra.
OBRAS FUNDAMENTAIS
A Sociedade Pós-Industrial
(1969)
Monografia sobre estruturas sociais em
países desenvolvidos, com referência particular à França —cobrindo aspectos
sociológicos de rápidas mudanças sociais, implicações econômicas, aspectos
políticos, aspectos sociológicos da organização empresarial, problemas de lazer,
agitação juvenil e movimentos sociais estudantis.
Vida e Morte do Chile Popular
(1974)
Diário sociológico feito entre julho e
setembro de 1973, quando o golpe militar derrubou o regime democrático
constitucional do Chile e de seu presidente, Salvador Allende.
Palavra e Sangue: Política e
Sociedade na América Latina (1989)
O autor considera a América Latina a
"classe média do mundo", um meio termo a partir do qual se pode ter
uma visão do conjunto da paisagem humana. Para elem vivemos no mundo da mesclagem.
As relações entre vida pública e privada —na Europa rigorosamente separadas—
confundem-se por aqui no clientelismo, no caciquismo, que transformam o poder
pessoal em poder político.
Crítica da Modernidade (1995)
Touraine defende a ideia de que a modernidade
é feita de complementaridades e oposições entre o trabalho da razão, a
liberação do sujeito e o enraizamento em um corpo e uma cultura.
Igualdade e Diversidade: O
Sujeito Democrático (1997)
A sociologia pode ser redefinida, deixando
de ser o estudo do funcionamento e da mudança dos sistemas sociais e
tornando-se a análise das condições de existência e de iniciativa de cada ator
social, pessoal ou coletivo, que é ao mesmo tempo diferente de todos os outros
e, como sujeito, igual a todos.
Um Novo Paradigma (2005)
Os antigos paradigmas estavam voltados para
a conquista do mundo, o novo está mais voltado para a conquista das pessoas.
Nesse sentido, é urgente saber onde estamos e que discurso sobre o mundo e
sobre nós pode nos tornar inteligíveis. Este livro, pretende conscientizar as
pessoas da ruptura que afasta todos deste passado ainda próximo antes de
definir a natureza desta mudança de paradigma.
O Mundo das Mulheres (2006)
Com esta obra Touraine espera demonstrar a necessidade de romper com a discussão do tipo "nada se pode fazer" e contribuir para levar a descobrir as mulheres enquanto atrizes sociais revelando os seus objetivos, os conflitos em que estão implicadas e a sua vontade de serem os sujeitos da sua própria existência.
Muito bom!
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