O Globo
Diante da convicção que vai para um lado e
da conveniência de imagem que aponta para outro, não resolver é visto como
única solução possível
A discussão sobre o marco temporal como
critério definidor para a demarcação de terras indígenas virou uma batata
quente que os três Poderes passam às mãos uns dos outros, sem que ninguém queira
decidir. Nesta quarta-feira é grande a possibilidade de o Supremo Tribunal
Federal, diante de um tubérculo cada vez mais incandescente e difícil de
descascar, adiar de novo a tarefa.
A ministra Rosa Weber não aceitou ser ela a jogar o problema para a frente e manteve a sessão do plenário para tratar do Recurso Extraordinário 1.017.365, cuja análise está suspensa desde 2021, quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vista no momento em que havia um voto a favor da revogação do entendimento do marco temporal, dado pelo relator, Edson Fachin, e um a favor da sua adoção, do ministro Nunes Marques.
Moraes tem se notabilizado por, em questões
controversas que dividem a Corte, oferecer votos que tentam apontar um caminho
intermediário entre duas posições antagônicas. Difícil imaginar que solução
seria essa para uma questão que, como todas no Brasil de hoje, foi de tal forma
ideologizada e aparelhada politicamente que um consenso se torna algo
praticamente impossível de alinhavar.
Não começou com esse recurso, nem com o
Projeto de Lei 490, que a Câmara aprovou a toque de caixa na semana passada, a
tentativa de estabelecer a Constituição como marco de tempo para que povos
indígenas possam pleitear a homologação de novos territórios. Foi o ministro
Menezes Direito quem, em 2009, conseguiu aprovar, na discussão da demarcação da
terra Raposa Serra do Sol, 12 condicionantes à decisão da Corte que, seguindo
voto do ministro Ayres Britto, aprovou a demarcação contínua do território,
localizado no Estado de Roraima.
Em 2017, Michel Temer assinou um parecer da
Advocacia-Geral da União tornando a tese do marco temporal vinculante para toda
e qualquer demarcação de terras indígenas dali em diante. É nesse ponto que se
encontra o impasse atual.
Ainda que Moraes tente estabelecer um “voto
médio” que nem paralise todas as demarcações de agora em diante — como
entidades ligadas aos direitos indígenas argumentam que acontecerá caso o marco
temporal seja aprovado em definitivo — nem desagrade ao agronegócio, é
considerado provável entre os ministros um novo pedido de vista.
Passado o governo Jair Bolsonaro e
verificadas as sucessivas investidas contra a integridade e os direitos dos
povos indígenas, os ministros não querem se ver associados a uma votação que
será interpretada, no exterior e em largos setores da sociedade, como nova
investida contra os direitos dos povos originários. Mas, reservadamente, muitos
deles demonstram considerar que o estabelecimento da Constituição como marco
para a concessão de novas terras foi um critério acertado.
Diante da convicção que vai para um lado e
da conveniência de imagem que aponta para outro, não resolver é visto como a
única solução possível. “O tempo acaba por decidir”, me disse um ministro nesta
terça-feira.
Existe grande possibilidade de, caso se
confirme um novo adiamento, alguns ministros cujo voto é pró-indígenas, contra
a adoção do marco temporal, peçam para antecipá-lo. Deverá ser o caso da
própria presidente da Corte, que se aposenta em outubro e não quer deixar o
Supremo sem se manifestar a respeito da matéria candente.
Se o STF preferir passar a batata, também
não será o Senado a fazer o purê. Rodrigo Pacheco foi claro em dizer que agirá
de forma “prudente” e “cadenciada” nesse caso, uma forma mineira e polida de
dizer que engavetará o projeto à espera de um clima menos acirrado para
votá-lo.
Quando a polarização política paralisa
aqueles que têm o dever constitucional de tomar decisões, se vê que o estrago
nas instituições é profundo e está longe de ser debelado.
Marco Temporal é o cacete.
ResponderExcluirEstas terras todas eram dos povos que aqui já habitavam ; são destes povos!
▪Se há alguma delimitação de território a ser feita, assim mesmo porque a nossa presença como invasores aqui já é um fato consumado, é a de até onde nós podemos ir:: nós, e não eles, os donos!
O que nós devemos fazer é pedirmos desculpas e junto com os donos originais demarcarmos os nossos limites,…
E o restante todo do território é deles, de todas as nações indígenas.
Estamos fazendo há 500 anos com os indígenas o que os russos fazem há 200 com o povo da Ucrânia:: tomando à força o que não é nosso; logo nós, que valorizamos tanto o direito à propriedade.
Edson Luiz tem razão.
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