Folha de S. Paulo
Receita do governo e nomeações de Lula vão
influenciar inflação, Selic e taxas de mercado
A grande querela nacional sobre a queda de
mísero 0,25 ponto percentual na Selic deve esfriar depois dessa ata
da reunião da diretoria do Banco Central, divulgada nesta terça-feira. Deve
haver um chorinho de corte da Selic, de 13,75% para 13,50%, em agosto.
O problema maior, como se tem escrito nestas colunas,
é quão rápido a Selic vai
cair e até que nível. Quanto a isso, nem a ata do BC nem as notícias da
inflação por ora permitem estimar que a redução de juros seja rápida e grande.
Além do mais, daqui até o final do ano, dois motivos vão mudar a música da inflação e dos juros no mercado: o tamanho do déficit nas contas do governo e as novas indicações de Luiz Inácio Lula da Silva para a direção do BC.
A partir desta metade do ano, com a
aprovação do dito arcabouço fiscal de Lula-Haddad, os donos do dinheiro grosso
e credores do governo vão verificar se a arrecadação federal vai ser bastante
para o cumprimento das metas de redução do déficit. Se não for o caso, as
perspectivas para dívida pública azedam um tanto mais e, assim, os juros de
prazo mais longo na praça do mercado podem parar de cair.
Fernando
Haddad (Fazenda) e equipe estão caçando o que chamam de jabutis,
medidas do Congresso ou da Justiça que facilitavam uma sonegação legalizada,
para falar francamente. Falta saber quando começa a pingar o dinheiro. A
arrecadação de maio deu algum ânimo. Mas o ano até aqui não tem rendido o
bastante para reduzir o buraco nas contas.
Em dezembro, acabam os mandatos de dois
diretores do BC. Lá por outubro ou novembro, devem ser conhecidos os nomes dos
novos diretores. No começo de 2025, pois, Lula terá indicado quatro dos nove
diretores. Mesmo com Lula 3 ainda em minoria, por assim dizer, o jeitão do BC
pode mudar muito e, assim, mexer nas expectativas dos povos do mercado para
2025. Parece longe, mas não é. Em caso de nomeações destrambelhadas, podemos
ver efeitos dessas decisões já no final deste 2023.
Em resumo, a dita "ata do Copom"
afirma que, com nova baixa das expectativas e da inflação, a Selic cai essa
miséria de 0,25 ponto em agosto. A inflação de junho deve vir perto de zero. As
expectativas devem cair mais um tanto, até porque o Conselho Monetário Nacional
não deve fazer a bobagem de mexer na meta de inflação de 3% para os próximos
anos na reunião desta quinta-feira, como praticamente cobrou o pessoal do BC.
Por outro lado, o BC afirmou que a inflação
de serviços e outros índices mais sujeitos à influência da política monetária
estão muito altas ainda (em torno de 6%) e caem devagar. Fica implícito que o
mercado de trabalho deveria esfriar.
Além disso, o BC acredita que agora é mais
alto o nível real da Selic que mantém a inflação estável. Pode se contestar a
conta do BC, mas é outra má notícia sobre o tamanho e velocidade do corte de
juros que está por vir. Enfim, o nível a que as taxas de juros no mundo rico
vão chegar também vai ter influência aqui, em dólar e juros.
Há uma grande névoa nesse cenário. Mais do
que de costume, está difícil de saber o tamanho da desaceleração da economia e
do efeito dessa paulada da Selic a 13,75% por tanto tempo. Por falar nisso, a
taxa real de juro de um ano tem aumentado. Desde o início de abril, saiu de
6,9% para quase 7,5%.
Talvez o assunto possa mudar, enfim, para a
economia dita real. Que setores podem elevar o investimento? Parece haver coisa
engatilhada na indústria extrativa, no saneamento, comunicações. O governo vai
conseguir fazer concessões de obras? Vai tomar medidas que facilitem o
investimento privado? O investimento público direto, via Orçamento, vai
continuar miudinho. O que vem a ser enfim esse projeto de "transição
verde" na economia?
São tantas a perguntas...
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