quarta-feira, 28 de junho de 2023

Vinicius Torres Freire - Juros, déficit e nova direção do BC

Folha de S. Paulo

Receita do governo e nomeações de Lula vão influenciar inflação, Selic e taxas de mercado

A grande querela nacional sobre a queda de mísero 0,25 ponto percentual na Selic deve esfriar depois dessa ata da reunião da diretoria do Banco Central, divulgada nesta terça-feira. Deve haver um chorinho de corte da Selic, de 13,75% para 13,50%, em agosto.

O problema maior, como se tem escrito nestas colunas, é quão rápido a Selic vai cair e até que nível. Quanto a isso, nem a ata do BC nem as notícias da inflação por ora permitem estimar que a redução de juros seja rápida e grande.

Além do mais, daqui até o final do ano, dois motivos vão mudar a música da inflação e dos juros no mercado: o tamanho do déficit nas contas do governo e as novas indicações de Luiz Inácio Lula da Silva para a direção do BC.

A partir desta metade do ano, com a aprovação do dito arcabouço fiscal de Lula-Haddad, os donos do dinheiro grosso e credores do governo vão verificar se a arrecadação federal vai ser bastante para o cumprimento das metas de redução do déficit. Se não for o caso, as perspectivas para dívida pública azedam um tanto mais e, assim, os juros de prazo mais longo na praça do mercado podem parar de cair.

Fernando Haddad (Fazenda) e equipe estão caçando o que chamam de jabutis, medidas do Congresso ou da Justiça que facilitavam uma sonegação legalizada, para falar francamente. Falta saber quando começa a pingar o dinheiro. A arrecadação de maio deu algum ânimo. Mas o ano até aqui não tem rendido o bastante para reduzir o buraco nas contas.

Em dezembro, acabam os mandatos de dois diretores do BC. Lá por outubro ou novembro, devem ser conhecidos os nomes dos novos diretores. No começo de 2025, pois, Lula terá indicado quatro dos nove diretores. Mesmo com Lula 3 ainda em minoria, por assim dizer, o jeitão do BC pode mudar muito e, assim, mexer nas expectativas dos povos do mercado para 2025. Parece longe, mas não é. Em caso de nomeações destrambelhadas, podemos ver efeitos dessas decisões já no final deste 2023.

Em resumo, a dita "ata do Copom" afirma que, com nova baixa das expectativas e da inflação, a Selic cai essa miséria de 0,25 ponto em agosto. A inflação de junho deve vir perto de zero. As expectativas devem cair mais um tanto, até porque o Conselho Monetário Nacional não deve fazer a bobagem de mexer na meta de inflação de 3% para os próximos anos na reunião desta quinta-feira, como praticamente cobrou o pessoal do BC.

Por outro lado, o BC afirmou que a inflação de serviços e outros índices mais sujeitos à influência da política monetária estão muito altas ainda (em torno de 6%) e caem devagar. Fica implícito que o mercado de trabalho deveria esfriar.

Além disso, o BC acredita que agora é mais alto o nível real da Selic que mantém a inflação estável. Pode se contestar a conta do BC, mas é outra má notícia sobre o tamanho e velocidade do corte de juros que está por vir. Enfim, o nível a que as taxas de juros no mundo rico vão chegar também vai ter influência aqui, em dólar e juros.

Há uma grande névoa nesse cenário. Mais do que de costume, está difícil de saber o tamanho da desaceleração da economia e do efeito dessa paulada da Selic a 13,75% por tanto tempo. Por falar nisso, a taxa real de juro de um ano tem aumentado. Desde o início de abril, saiu de 6,9% para quase 7,5%.

Talvez o assunto possa mudar, enfim, para a economia dita real. Que setores podem elevar o investimento? Parece haver coisa engatilhada na indústria extrativa, no saneamento, comunicações. O governo vai conseguir fazer concessões de obras? Vai tomar medidas que facilitem o investimento privado? O investimento público direto, via Orçamento, vai continuar miudinho. O que vem a ser enfim esse projeto de "transição verde" na economia?

 

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