quinta-feira, 27 de julho de 2023

Bruno Carazza - Até quando valerá a pena para Simone Tebet continuar no governo?

Valor Econômico

Nomeação a contragosto de Pochmann para o IBGE colocará ministra num dilema

Nunca saberemos quantos dos 4.915.423 eleitores de Simone Tebet decidiram votar em Lula no segundo turno depois que a ex-senadora do MDB declarou seu apoio ao petista. No entanto, levando-se em conta que a vitória sobre Bolsonaro se deu pela margem apertadíssima de 2.139.645 votos (1,8% do total), é justo atribuir a Tebet o papel de fiel da balança nas eleições presidenciais de 2022.

A adesão de Simone Tebet à campanha lulista fez com que seu nome fosse tido como certo nas bolsas de apostas para a composição do governo durante a transição. Só não se sabia qual seria o prédio da Esplanada que ela comandaria. Pela sua importância na votação, Tebet pleiteava um cargo de peso, e cogitou-se o Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família, ou outra pasta de impacto social e orçamento robusto, como Saúde e Educação.

Ao fim das negociações, Tebet contentou-se com o Ministério do Planejamento. Apesar da importância econômica, a pasta sempre teve relevância política menor, e tradicionalmente foi comandada por tecnocratas ou políticos de menor expressão. José Serra foi exceção, embora justificável pelo fato de ser economista e ter voz junto a FHC, e a passagem de onze dias do poderoso Romero Jucá no início do governo Temer foi um relâmpago em dia de céu azul.

A situação de Tebet no Planejamento, porém, é diferente. Embora tenha saído da eleição com um capital político considerável, a ministra do MDB não desfruta da confiança que técnicos e políticos do PT que a antecederam possuíam junto a Lula, como Guido Mantega, Nelson Machado, Paulo Bernardo, Miriam Belchior ou Nelson Barbosa.

Não por outra razão, Tebet recebeu um ministério desidratado de áreas tradicionalmente subordinadas ao Planejamento, como a gestão de carreiras e logística federais, o controle das estatais, a estratégia de digitalização dos serviços públicos e a Secretaria do Patrimônio da União. Esses setores acabaram alocados no novo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, conduzidos pela economista Esther Dweck, quadro técnico da nova geração do PT.

O Ministério do Planejamento no governo Lula 3 manteve, contudo, as áreas de planejamento e de orçamento. Simone Tebet, porém, não tem o conhecimento do funcionamento da máquina pública como possuíam João Sayad, Antonio Kandir, Paulo Paiva, Pedro Parente ou Esteves Colnago, alguns de seus antecessores de perfil mais técnico. É natural, portanto, que leve um tempo para se inteirar dos assuntos da área até propor algo realmente novo e transformador – e isso é quase impossível de ocorrer, pois são temas funcionam há décadas de forma quase automática.

Pode-se argumentar que Simone Tebet foi prestigiada por ser uma das vozes mais relevantes nas decisões de política econômica, uma vez que tem assento no Conselho Monetário Nacional. Sim, Tebet está em posição de paridade com Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, nas decisões sobre metas de inflação e políticas de crédito. Mas, sem a formação em economia, fica difícil para a ministra ter o peso que outros ministros da pasta tiveram na equipe econômica do passado, como Celso Furtado, Roberto Campos, Mario Henrique Simonsen ou Delfim Netto.

Diante dessas dificuldades de espaço no governo, um nicho no qual a ministra pode fazer a diferença está na área de estudos e avaliações de impacto. Tendo sob o seu comando o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além da Secretaria de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas, Tebet tem à sua disposição pesquisadores de primeira linha e abundância de dados para produzir cálculos, estimativas e recomendações que podem influenciar o debate de políticas públicas e econômicas no governo.

No entanto, a notícia recente de que Lula faz questão de nomear o economista Márcio Pochmann, para a presidência do IBGE, à revelia de Simone Tebet, indica um enfraquecimento ainda maior da ministra. Ex-presidente da Fundação Perseu Abramo, think thank do PT, Pochmann é um nome que enfrenta forte resistência até mesmo entre economistas heterodoxos, e teme-se que comprometa a credibilidade técnica do IBGE com o propósito de justificar teses favoráveis ao governo.

Com pouca margem de manobra para influenciar as decisões do governo e sofrendo pressão do PT para ocupar postos estratégicos da sua própria pasta, é de se perguntar até que ponto valerá a pena para Simone Tebet permanecer no governo.

É bem verdade que a política sul mato-grossense não tem muitas opções. Sem cargo eletivo, se Tebet deixar o ministério amargará uma quarentena voluntária até as eleições do ano que vem, se quiser disputar alguma prefeitura, ou um longo afastamento da política até 2026. Além disso, por ser proveniente de um Estado com uma população fortemente bolsonarista, a associação de Tebet a Lula aumenta a sua rejeição em seus redutos eleitorais.

Sob esse ponto de vista, por uma estratégia de sobrevivência, Simone Tebet pode se ver forçada a permanecer como ministra até 2026, mesmo pagando o preço de uma relevância cada vez menor no governo.

Do ponto de vista de Lula, não seria de todo mal se a ex-candidata à Presidência pelo MDB se revoltasse contra a ingerência política na nomeação de Pochmann para o IBGE e apresentasse sua carta de demissão.

Sendo chantageado para ceder ministérios ao Centrão, o Planejamento seria um ativo relevante para colocar na mesa de negociações, sem ter que ceder áreas consideradas vitais pelo PT.

A ver como se resolverá o dilema de Simone Tebet.

 

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