terça-feira, 4 de julho de 2023

Dora Kramer – Aviso aos navegantes

Folha de S. Paulo

Os males do sistema político/partidário vêm de muito antes da reeleição

A Justiça Eleitoral é habitualmente generosa para com governantes, sejam eles vencedores ou perdedores. Abusos de poder são frequentes e raríssimas as punições. Na esfera do Executivo, então, só ocorreram quando o prefeito ou o governador estavam fora dos cargos.

Com presidentes da República nunca acontecera. Vimos agora, e pela primeira vez, um ex-presidente ser castigado devido ao abuso das prerrogativas em campanha eleitoral.

O Tribunal Superior Eleitoral tornou Jair Bolsonaro inelegível cinco meses depois do término do mandato, numa decisão inédita que pode ser didática caso o rigor venha a se configurar como regra.

Veremos daqui em diante se os críticos da sentença poderão ou não acusar o tribunal eleitoral de ter feito juízo de exceção. Verdade que os ilícitos de Bolsonaro foram além das fronteiras eleitorais. Enveredaram pelo campo da agressão ao Estado de Direito e a isso o ex-presidente ainda responderá na esfera criminal.
Mas é na questão dos excessos dos poderosos na caça a votos que reside a lição a ser aprendida e seguida. Se não com a estridência e a contundência do agora inelegível ex-presidente, é fato que governantes extrapolam limites, notadamente quando buscam um segundo mandato consecutivo.

Aqui costuma-se culpar o instituto da reeleição por essas malfeitorias. Muita gente boa considera que a licença de renovação no cargo seja o grande mal da política brasileira e que a coisa estaria resolvida com o fim da reeleição instituída em 1997. Antes o problema fosse esse.

Os males do sistema político/partidário são antigos. Vêm de longe, não só por defeito da norma, mas por causa dos malfeitos das pessoas conjugados à leniência da Justiça por décadas.

Acabar com a reeleição não resolve. Ajuda quando se aplica com rigor a lei que, como ouvi certa vez de Roberto Campos (o avô), será forte o suficiente desde que a lei não seja fraca.

 

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