terça-feira, 18 de julho de 2023

Merval Pereira - Momento ‘estratégico’

O Globo

Lula tem falado de maneira consistente e persistente de questões estratégicas, e está em curso no governo uma agenda de controlar o desmatamento

O Brasil vive “momento especial de ouro”, repete o presidente Lula, convencido de que a questão climática não é mais um tema do futuro, mas é “agora que está acontecendo”. Esse estado de espírito otimista, explicitado na reunião da América Latina com a União Europeia que termina hoje em Bruxelas, tem base em dados que ainda serão divulgados oficialmente. Eles apontam uma queda consistente do desmatamento na Amazônia de 33,6% nos seis primeiros meses do ano, e neste mês a queda será altamente consistente, um mês em que o desmatamento deveria estar no pico, como antecipam membros do governo.

Lula, que antecipou esses números em Bruxelas, considera extremamente importante o encontro porque pode ajudar a concluir o acordo tão sonhado com a União Europeia. Nos encontros em Bruxelas, ele reiterou que o país não abre mão das compras governamentais, que vê como oportunidade para pequenos e médios empreendedores brasileiros. O acordo entre a União Europeia e o Mercosul deve sair até o fim do ano.

— Se no governo Bolsonaro o acordo ia ser feito, por que não seria agora? — pergunta a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

Lula disse em Bruxelas que a transição climática passou a ser prioridade no seu governo, e, de fato, nas suas recentes declarações, como no discurso na cerimônia de entrega das medalhas do Mérito Científico, ele dá a impressão de que caiu a ficha de que é a política ambiental do Brasil que poderá fazê-lo protagonista na cena internacional, e não a tentativa de negociar a paz na Ucrânia.

Houve uma mudança na abordagem, Lula tem falado de maneira consistente e persistente de questões estratégicas, e está em curso no governo uma agenda de controlar o desmatamento, proteger os povos originários, a transição ecológica comandada pelo Ministério da Fazenda de Haddad, a reindustrialização verde pelo Ministério da Indústria do vice-presidente Alckmin.

O presidente está dando muita importância à reunião em Belém, em agosto, dos oito países que fazem parte da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, que nunca se reuniu em 45 anos de criação, uma ocasião para que uma cúpula amazônica pense a região não mais como uma questão isolada de cada país. Até a França será convidada, devido à Guiana, uma maneira de incluí-la no rol dos países amazônicos, pois “é o único país europeu que tem fronteira com o Brasil e a América Latina”, ironiza Lula.

Na mesma capital do Pará haverá em 2025 a Conferência Global do Clima. Lula diz que quer que os estrangeiros venham discutir a Amazônia dentro dela, vamos trazer essa gente “para ser mordida por carapanãs”, denominação do tupi para pernilongo. O governo está convencido de que, quando usarmos nosso potencial eólico e solar, poderemos nos transformar em potência mundial do hidrogênio verde. A retomada de nossa indústria em novas bases, mais limpa e com baixa emissão de carbono, é o objetivo.

O Brasil presidirá no ano que vem tanto o Brics quanto o G20, composto dos países mais ricos do mundo, responsáveis por 86% das emissões do planeta, o que está sendo visto como um momento estratégico. Por isso, o programa de transição ecológica transversal, passando por vários ministérios, está sendo coordenado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Está sendo formatado também um Plano Safra para a agricultura de baixo carbono.

“Ações estratégicas que, se levadas de maneira estrutural e continuada, podem, ao final de quatro anos, criar as bases para o Brasil se tornar um país exportador de sustentabilidade”, um mantra da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que o governo incorporou como meta. Se todas essas agendas forem tratadas de forma continuada, Marina vê a possibilidade de termos uma mudança de chave na posição do Brasil nos novos ciclos de prosperidade econômica que estão se desenhando pelo mundo:

— O Brasil vai ter a chance de não ficar trancado do lado de fora. Muito pelo contrário, será a própria chave para a abertura desse novo portal de oportunidades para a humanidade.

 

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