sexta-feira, 28 de julho de 2023

Vera Magalhães – Qual o caminho na economia?


O Globo

Opção por revisitar o governo Dilma não combina com festejar a decisão de uma agência de elevar a nota de crédito do país

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, celebrou de maneira elegante a decisão da agência Fitch de elevar a nota de crédito do Brasil: dividiu os louros com os demais Poderes, fez uma aposta na institucionalidade e na previsibilidade e deixou claro que o objetivo é que o país retome o grau de investimento que perdeu em 2018.

O relatório da agência, por sua vez, é reticente. Enxerga boas práticas do governo justamente no que advém da agenda Haddad: o arcabouço fiscal, a aprovação parcial da reforma tributária e uma aposta no que chamou de “pragmatismo”. Faz ressalvas, no entanto, à pregação de uma agenda não liberal e à defesa, aqui e ali, da revogação do que considera pautas reformistas, como a autonomia do Banco Central, o marco regulatório do saneamento básico e as mudanças nas leis trabalhistas.

No texto, existe quase uma torcida para que essa tentação de rever o que foi aprovado tenha ficado para trás e o pragmatismo prevaleça. Parece ser esse o empenho de Haddad, que tem contado, para isso, com o apoio do Congresso, a ajuda de decisões judiciais, uma nova boa vontade do mercado e uma parceria leal com o Planejamento sob o comando de Simone Tebet.

Nesse cenário de um governo que almeja pelo grau de investimento e está na iminência, ao que indicam todas as previsões, de ver finalmente prevalecer sua pregação pela queda dos juros na reunião do Copom na semana que vem, soa fora de timing o empenho pessoal do presidente Lula, passando por cima de Tebet, para nomear Marcio Pochmann para o IBGE.

O caso causou celeuma maior que uma nomeação para uma função técnica provocaria. A razão para isso é de natureza ideológica e está umbilicalmente ligada a essa bipolaridade que a Fitch enxerga em seu relatório e que tem permeado a discussão da política econômica do governo Lula 3, com Haddad sempre parecendo estar sob escrutínio da ala desenvolvimentista do PT, à espera da primeira brecha para disputar narrativas, decisões e postos.

Lula quer premiar aqueles que estiveram com ele na “travessia do deserto”, isso é algo evidente. Quando viu Pochmann submetido a uma fritura, tratou de consumar sua escolha para estancar o processo.

Acontece que o pé atrás com o economista advém do retrospecto de sua gestão à frente do Ipea, um órgão de tamanho bem mais reduzido do que agora vai pilotar.

Na esteira da confirmação de Pochmann para o IBGE, ganhou força o balão de ensaio de que Guido Mantega poderia ir para o comando da Vale, que vem tentando ser içado pelo PT desde o início do ano.

Trata-se de uma operação bem mais complexa, que envolveria convencer acionistas de uma empresa privada de capital pulverizado a premiar um ex-ministro da Fazenda visto por agentes internacionais — entre os quais as agências de risco que o Brasil precisa convencer se quiser mesmo de volta o tal selo de bom pagador — como responsável por heterodoxias que condenaram o país à recessão e ao descontrole fiscal e inflacionário.

O governo pode fazer uma opção por revisitar o caminho do governo Dilma na economia. Mas isso não combina com festejar a decisão de uma agência de elevar a nota de crédito do país e almejar por novas notícias como essa.

Não se trata de um julgamento simplista, do tipo mocinhos e bandidos: na avaliação feita por agências de risco, a responsabilidade fiscal e a agenda de reformas é que contam pontos, não o receituário de maior papel do Estado na indução do desenvolvimento.

O governo até aqui parece ter encontrado uma boa equação: conseguiu mais recursos para os programas sociais e de transferência de renda e tem lançado, sob um olhar cauteloso da Fazenda, programas pontuais de indução da atividade econômica para alguns setores industriais.

A fórmula do comedimento combinado a uma boa relação com a Câmara e o Senado nos levou de um BB- para um BB. Desviar desse trilho para o flerte com o ideário da nova matriz econômica certamente não será um caminho para chegar aonde o governo deseja.

 

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