Folha de S. Paulo
Se ideologia tivesse peso, presidente
deveria ter retirado indicação durante a sabatina
Cristiano
Zanin tentou escapar quando senadores levantaram o assunto da
descriminalização das drogas na
sabatina de junho. O futuro ministro disse que não comentaria o julgamento em
curso no STF,
mas acabou falando o que pensava: "A droga é um mal que precisa ser
combatido".
Em menos de um mês na cadeira, o ministro mostrou que aquela não era só uma conversa mole para ganhar o apoio de parlamentares de direita. O voto de Zanin contra a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, na quinta (24), situou o indicado por Lula numa posição mais conservadora do que integrantes nomeados por Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer.
Governantes usam uma soma de critérios em
nomeações para tribunais superiores. Em geral, a escolha leva em conta
alinhamento ideológico, portfólio jurídico, relações pessoais, condições
políticas e atributos como gênero ou raça.
O peso de cada item varia, e um presidente
pode até escolher um desconhecido. O que não se espera é que ele indique um
ministro que siga a ideologia do campo adversário.
O conflito prematuro de Zanin com a
esquerda sugere quatro cenários hipotéticos sobre o processo de escolha: Lula
nem perguntou o que Zanin pensava sobre temas como drogas; Zanin enrolou Lula
quando o petista tocou no assunto; Zanin avisou que era conservador, e Lula não
ligou; ou Zanin disse ser progressista e traiu Lula.
No último caso, o petista ainda poderia ter
retirado a indicação durante a sabatina de Zanin. As outras hipóteses, mais
prováveis, indicam
que Lula não deu bola para ideologia. Bateu o martelo pensando na relação
de confiança com o novo ministro, no chamado garantismo e numa revanche
simbólica contra a Lava Jato.
Embora tenha se atualizado em tópicos da
chamada plataforma progressista, o próprio Lula
se definia no passado como conservador. Em 2009, ele disse que a
legalização das drogas era um caminho errado. "Temos de ser mais duros,
precisamos evitar que as pessoas consumam."
É,talvez o Lula,no fundo,pensa como Zanin.
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