Folha de S. Paulo
Virada de mesa manteria no poder Bolsonaro
e seus aliados, mas isso deve ser só coincidência
Anderson
Torres respirava golpismo. Como ministro da Justiça, participou
da live de 2021 em que Jair Bolsonaro lançou
suspeitas falsas sobre as urnas. Como conselheiro, frequentou o bunker
instalado no Alvorada após a derrota na eleição e guardou um documento
elaborado para virar a mesa. Como secretário de Segurança, acobertou a ameaça
de invasão da praça dos Três Poderes.
A atuação diligente de Torres no
bolsonarismo transformou seu depoimento na CPI do 8 de
janeiro numa exibição de cinismo. O ex-ministro descreveu os
ataques como um episódio imprevisto, tratou como
maluquice algumas ideias que circulavam em seu próprio grupo
político e tentou transferir responsabilidades para o campo adversário.
Bolsonaro fabricou por anos o combustível para uma revolta contra o resultado da eleição. Críticos e opositores levaram o risco a sério, assim como a turma em frente aos quartéis (além de grupos lá dentro). Mas Torres reproduz uma linha de defesa fantástica, em que os únicos céticos e inocentes seriam justamente os beneficiários de um golpe.
O ex-ministro não é capaz de esconder o
papel operacional claro que teve naquele processo. Na live de
2021, Torres emprestou verniz técnico às investidas de Bolsonaro,
levando para a mesa informações da Polícia Federal. Também recaem sobre ele
suspeitas sobre as blitze nas estradas do Nordeste no dia da votação e a guarda
da minuta do golpe.
Torres tentou convencer a CPI de que
"não havia indícios" de atos graves às vésperas do 8 de janeiro. Ele
direcionou a culpa para outros órgãos, ainda que seu gabinete na Secretaria de
Segurança do Distrito
Federal tenha recebido no dia 6 um alerta que falava em "prática
de atos de violência" e "tomada de poder".
Os bolsonaristas insistem no discurso de
que o golpismo foi um caso de ignição espontânea e que, na verdade, eles se
tornaram vítimas do 8 de janeiro. Uma virada de mesa manteria no poder
Bolsonaro e seus aliados políticos e militares, mas isso deve ser só uma
coincidência.
Então tá!
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