Valor Econômico
Projetos e votações até o momento indicam
Lula 3 menos progressista do que dois mandatos anteriores
Aprovado o arcabouço fiscal, é iminente o
anúncio da reforma ministerial de Lula, com a entrada definitiva do governo de
dois dos três principais partidos do Centrão: o PP de Arthur Lira e o
Republicanos de Marcos Pereira.
Com a incorporação das duas legendas, Lula
amealhará o apoio formal de 14 partidos, responsáveis por 374 parlamentares: PT
(68), União Brasil (59), PP (49), MDB e PSD (43 cada), Republicanos (41), PDT
(18), PSB (15), Psol (13), PcdoB e Avante (7 cada), PV (6), Solidariedade (4) e
Rede (1).
Trata-se de uma base de 374 deputados (72,9% das cadeiras do plenário), suficiente para aprovar qualquer medida legislativa na Câmara com folga.
Na minha coluna de segunda-feira (21),
mostrei como
o governo Lula, mesmo antes da adesão de PP e Republicanos, tem sido
bem-sucedido na aprovação de sua agenda no Congresso.
Num levantamento de 155 votações realizadas
no plenário e nas comissões da Câmara desde o início da legislatura, as
propostas defendidas pelo governo receberam um apoio de 68% dos parlamentares.
Isso permitiu passar medidas importantes, como a ampliação do Bolsa Família, a
reformulação dos programas Mais Médicos e Minha Casa, Minha Vida, a reforma
tributária na Câmara e, ontem (22), o novo arcabouço fiscal.
O poder de atração
do governo foi tão forte que 8,8% dos votos a favor do desejado pelo Palácio do
Planalto vieram do PL, o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O embarque dos dois principais partidos do
Centrão ao governo, bem como a simpatia de parlamentares vinculados a siglas de
oposição, não significa, porém, que Lula tem uma avenida desimpedida para
aprovar sua agenda de governo.
Tomados isoladamente, os partidos de
esquerda e centro-esquerda elegeram em 2022 a menor bancada na Câmara dos
Deputados desde 1998. Lula, portanto, depende dos partidos de centro-direita e
do Centrão para governar. E isso condiciona significativamente os projetos que
o presidente petista tem conduzido no Legislativo.
As derrotas sofridas no primeiro semestre
emitem um sinal claro de que o apoio parlamentar não é irrestrito. Apesar do
amplo apoio que vem conseguindo na maioria das votações, o governo foi vencido
em projetos emblemáticos, como o marco temporal para demarcação de terras
indígenas e propostas relativas à Mata Atlântica (PL 364/2019) e à proteção de
vegetação nativa (MP 1150/2022). Também foi forçado a retroceder no decreto que
alterava o novo marco legal do saneamento. Na área social, não conseguiu
impedir a criação da CPI do Movimento dos Sem-Terra.
Esses exemplos demonstram que Lula enfrenta
fortes resistências dos parlamentares no que se refere a questões ambientais,
sociais e em tentativas de revogar medidas econômicas liberalizantes dos
governos Temer e Bolsonaro. Logo, insistir nesses temas pode ser arriscado.
A resistência de um
Congresso conservador, contudo, tem impactado até mesmo a capacidade de
iniciativa de Lula em promover medidas legislativas de caráter progressista.
Analisando as 30 medidas provisórias
editadas pelo presidente em seu terceiro mandato, assumem posição dominante as
normas de natureza econômica (12 MPs) e administrativas (6). Assuntos de
natureza social foram objeto de apenas 7 medidas provisórias.
No que se refere às demais propostas, uma
evidência da possível falta de espírito reformista de Lula nesta terceira
passagem pelo Palácio do Planalto está no fato de que até agora ele não remeteu
nenhuma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ao Congresso.
Quanto ao teor dos 19 projetos de lei
ordinária e 3 complementar, novamente a agenda econômica predomina. As 13
iniciativas sob a alçada do ministro Fernando Haddad tratam não apenas de temas
urgentes como o arcabouço fiscal ou a reformulação do Carf, mas principalmente
de regulamentação do mercado de capitais e do sistema financeiro.
A ênfase nesse segmento da economia é maior
do que na área social, sob essa ótica. Dos escassos
6 projetos de lei apresentados pelo governo até agora, a maioria tem valor
simbólico (como igualdade salarial entre gêneros e a instituição do Dia
Marielle Franco de enfrentamento à violência política) ou de impacto reduzido,
como a lei que amplia direitos à maternidade de beneficiárias do Bolsa-Atleta
ou o Programa de Aquisição de Alimentos.
De significativo mesmo apenas o programa de
escola em tempo integral, aprovado recentemente, ainda que seja uma política
que cabe aos Estados e municípios, restando ao governo federal o apoio –
necessário, sem dúvidas, e muito bem-vindo.
Esses dados evidenciam que, mesmo com o
apoio do Centrão e à formação de uma ampla base no Congresso, não há muito
espaço para uma agenda progressista neste governo Lula 3, levando-se em conta o
perfil bastante conservador da maioria dos parlamentares atuais.
Infelizmente.
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