Valor Econômico
Crescimento de longo prazo é um fenômeno
mais de oferta do que de demanda
Com a queda da taxa de juros, o Banco
Central abre as comportas da economia para aumentar o crescimento. Certo? Não.
O crescimento econômico vem do aumento da produtividade, e não da queda dos
juros. Os juros têm efeito de curto prazo, estimulando ou desestimulando a
demanda. Mas o crescimento de longo prazo é um fenômeno mais de oferta do que
de demanda. “O crescimento econômico não tem nada a ver com os juros”, disse
Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação
Getulio Vargas, FGV Ibre.
“Os juros reagem ao crescimento, mas eles
não produzem crescimento”, sintetizou Pessôa.
Há países que têm uma situação crônica de
carência de demanda agregada. Esse é caso do Japão, que desde meados dos anos
1990 vive nessa situação. Países que têm esse problema crônico vivem anos
seguidos de deflação, taxa de juros zero etc.
Já no Brasil, “temos um problema de excesso
de demanda sobre a oferta”, salienta Pessôa.
Na reunião do Comitê de Política Monetária,
ocorrida nesta semana, o Banco Central cortou a taxa Selic em 0,50 ponto, de
13,75% ao ano para 13,25% ao ano. Foi uma decisão apertada. O placar foi de
cinco votos a favor do corte de 0,50, inclusive o do presidente do BC, Roberto
Campos Neto, e quatro votos por um corte menor, de 0,25 ponto.
Lula, que fez duras críticas ao Banco Central por não reduzir os juros nas reuniões passadas e na quarta feira -, enquanto o Copom se reunia ele dizia, em entrevista aos correspondentes estrangeiros, que o presidente do BC não entendia nada de Brasil -, ontem nada comentou.
Há quem diga que uma das aspirações do
presidente é reproduzir o boom de consumo que teve nos mandatos anteriores
dele, quando uma boa parcela da população trocou de geladeira, de televisão,
viajou de avião e comprou carro.
Para isso, porém, é preciso crédito a juros
mais baixos. Esse desejo seria maior do que criar as condições para um
crescimento de longo prazo, fundamentado na expansão da oferta.
Ele pode sonhar com isso entre 2025 e 2026,
mas não em 2024. O próximo ano ainda será de esforço para levar a taxa de
inflação para a meta.
O crescimento baixo no Brasil é um fenômeno
de oferta agregada, e não de demanda agregada, e aumentar a demanda porque se quer
mais crescimento tem um resultado certo: vai se colher mais inflação.
A preocupação, hoje, não é crescer mas
trazer a inflação na meta, segundo Pessôa, para quem “se formos bem-sucedidos,
iniciaríamos um processo de aceleração do crescimento com a inflação na meta a
partir de 2025/26. Crescer agora não é prioridade da política monetária”.
Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro
do FGV Ibre, salienta que há uma longa jornada a ser seguida, em que a questão
fiscal é o calcanhar de Aquiles. Faltam definições sobre diversas despesas, a
exemplo do salário mínimo, qual afinal será a política de reajuste real do
salário mínimo?
“A produtividade é baixa e, se vamos ficar
inflando os salários, o custo unitário do trabalho aumenta e a inflação de
serviços não cede”, teme ela.
Tem, ainda, a pressão do funcionalismo por
aumento dos salários, sem reajustes desde 2019, quando começou o governo de
Jair Bolsonaro. “Estamos ainda distantes do paraíso. Temos um bom purgatório
pela frente”, diz Silvia Matos, que lembra, também, que com a queda dos preços
das commodities, cai a arrecadação de impostos e contribuições, e toda a
política fiscal está ancorada no aumento das receitas.
“Para superarmos nossos problemas de baixo
crescimento temos que ter reformas estruturais para aumentarmos a
produtividade”, diz o pesquisador do FGV Ibre.
A reforma tributária é a coisa mais
importante para garantirmos um crescimento maior da produtividade do trabalho
nos próximos 20 anos, ressalta ele. “A reforma tributária é um grande gol de placa”,
concorda Silvia Matos. “ A meta futura de inflação de 3%, também”, acrescenta
ela, para quem “ estamos na primeira etapa da queda dos juros reais”.
Ela receia, porém, que o governo interrompa
antes da hora a política econômica que está seguindo, já se dando por
satisfeito e, assim, coloque os ganhos acumulados até aqui a perder.
Se não deu tempo de ler mais nada, mas deu para ler este artigo com atenção, quem pode fazer isso aproveitou bem o tempo de leitura.
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