sábado, 5 de agosto de 2023

João Gabriel de Lima* - O bônus de ter uma floresta

O Estado de S. Paulo

Após um período como vilão do clima, o Brasil volta a buscar protagonismo

Um dos assuntos mais comentados da COP do Egito, em novembro passado, foi a criação da “Opep das florestas”. Esse foi o apelido dado às conversas entre Brasil, Congo e Indonésia, que abrigam 52% das matas tropicais do planeta. Assim como os exportadores de petróleo, os três países começaram um intercâmbio – no caso, para preservar aquilo que o Estadão chamou, em editorial, de “tesouro verde”.

A Indonésia e o Congo são convidados especiais na Cúpula da Amazônia, que ocorre em Belém a partir da terça-feira, dia 8. O evento reunirá representantes dos países signatários do TCA, Tratado de Cooperação da Amazônia: Brasil, Colômbia, Peru, Equador, Bolívia, Suriname e Venezuela. Haverá espaço para propostas da sociedade civil, incluindo um documento multidisciplinar do movimento Uma Concertação pela Amazônia.

A colaboração entre esses países – os do TCA e os da “Opep das florestas” – ainda é superficial. Nos anos 2000, a Indonésia adotou alguns protocolos brasileiros de redução do desmatamento, na época em que éramos referência na área. Após um período como vilão do clima, o Brasil volta a buscar protagonismo: o desmatamento na Amazônia regrediu 7,4% nos últimos 12 meses, de acordo com os números divulgados na quinta-feira.

Houve um tempo em que ter uma floresta era encarado como um ônus. Isso mudou radicalmente na era da economia verde. Além de essenciais para a vida no planeta, florestas podem gerar recursos para diminuir as dificuldades sociais causadas pela transição para uma economia sustentável, por meio do mecanismo dos créditos de carbono – daí o apelido “tesouro verde”. Estima-se que esse mercado gere valores da ordem de US$ 50 bilhões até 2030.

O projeto que cria um mercado de carbono no Brasil tramita no Congresso e pode ser aprovado ainda neste ano. Se isso ocorrer, além de estabelecer tetos de emissões de carbono para alguns setores da economia – como ocorre na Europa e em alguns Estados americanos –, o governo poderá precificar a contribuição das matas preservadas e regiões de reflorestamento.

“Na Califórnia, os créditos de carbono criaram um mecanismo virtuoso que estimulou a inovação, com o surgimento de várias tecnologias verdes”, diz Gustavo Pinheiro, coordenador do portfólio de economia de baixo carbono no Instituto Clima e Sociedade. Ele é o entrevistado do minipodcast da semana.

Num mundo pressionado pela mudança climática, ter florestas é uma grande responsabilidade – mas é também um bônus, uma oportunidade na economia verde que se desenha para o futuro. É este espírito que deve animar os participantes da Cúpula da Amazônia.

*ESCRITOR, PESQUISADOR DO OBSERVATÓRIO DA QUALIDADE DA DEMOCRACIA NA UNIVERSIDADE DE LISBOA E PROFESSOR DA FAAP

 

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