O Globo
Danem-se as alternativas modernas. Como o
uso do crédito de carbono
Ao deixar uma escola, onde fizera um
discurso de campanha, o candidato à Presidência do Equador Fernando
Villavicencio recebeu três tiros na cabeça. Sete apoiadores seus ficaram
feridos. O atentado foi reivindicado por uma facção criminosa ligada ao
tráfico.
No rega-bofe de Belém, no Pará, não fosse
pelo presidente da Colômbia, Gustavo Petro,
uma das principais questões amazônicas não teria despertado atenção — o combate
ao crime organizado, na figura dos afamados PCC, Família do Norte e Comando
Vermelho.
Estive em Belém dias antes do encontro e, dos dez ambientalistas com quem conversei, 12 gritavam alertas aflitos contra as quadrilhas ligadas ao tráfico. Em Tabatinga, norte do Amazonas, onde o Exército mantém um batalhão (ou resort?), há intenso tráfego aéreo com aeronaves — e elas não estão ali em voos de lazer. As facções operam não apenas com drogas, mas ainda com um combo de contrabando de madeira, pesca ilegal e garimpo em terras indígenas. Claro, a cocaína é a cereja. O desmatamento é outra das atividades, aí em parceria com tipos diversificados de meliantes.
Petro, ao trazer o tema da violência à
folgança montada por Lula em
sua campanha pelo Nobel da Paz, conhece bem tais meandros. A Colômbia convive
há décadas com o problema do tráfico de drogas, por meio de seus diversos
barões, em joint venture com as famigeradas Farcs. O crime político na
Colômbia, mesmo hoje depois dos milhões de dólares americanos conseguidos pelo
ex-presidente Álvaro Uribe, ocorre à luz do dia. Não é uma situação
normalizada, apesar de Bogotá ter se tornado uma importante ponta de exportação
de produtos colombianos no norte da América do Sul.
Na Amazônia brasileira,
a violência política despertou atenção internacional com o assassinato do
jornalista Dom Phillips e do ambientalista Bruno Pereira, num anunciado revival
do que ocorreu anos atrás com Chico Mendes e Dorothy Stang. Ao que parece, a
coisa só piora. Os traficantes — opa! você já leu algo assim antes — se escudam
na eleição de autoridades municipais simpáticas à causa do crime. Como efeito
da tomada de poder, as campanhas eleitorais, principalmente às prefeituras, mas
também às fétidas câmaras municipais, tornam-se cada vez mais caras. Não se
economiza na tentativa de eleger um pau-mandado, um miliciano em figurino de
votos comprados. Eleitos, são compreensivos com os desmandos, como garimpo
ilegal, desmatamento e ainda com as pistas clandestinas abertas em meio à mata.
Tal tipo de tolerância — opa de novo! — repete o modelo de governança escandida
pelo bolsonarismo raiz.
Ao final, a Declaração de Belém, assinada
por oito países amazônicos, acena com a promessa de combate aos crimes diversos
cometidos na floresta. Talvez com a criação de algum novo organismo de
fiscalização. Por causa do governo de esquerda da Bolívia, não houve
compromisso assumido com o desmatamento zero até 2030. Assim, permanece a porta
aberta a um dos instrumentos usados pela criminalidade.
Se Petro, político de esquerda, ao menos
conseguiu deixar um de seus alertas sublinhado em compromisso assinado ao final
do repasto paraense, bateu na trave em seu outro pleito: a rejeição total à
exploração petrolífera na costa amazônica. Dias antes, depois de um refestelo
na paradisíaca Alter do Chão, à beira do Tapajós, o presidente Lula anunciou
que o povo local deve continuar a sonhar com poços da Petrobras na
região. Em momento sincrônico, a revista britânica The Economist dava o tom do
que pensa o capitalismo sobre a Amazônia: aquilo tudo é um baita ativo
financeiro a explorar, principalmente em seu subsolo rico em minérios, como lítio
ou grafite — fundamentais nos gadgets e nos aparelhos de segurança. Todo
pimpão, o ministro Alexandre Silveira corroborava a ideia que une a velha
esquerda brasileira, capitaneada por Lula, ao anacrônico capitalismo de cepa
extrativista. A Amazônia, pode esperar, ganhará alguns mimos eólicos para a
energia sustentável, porque ninguém é de ferro, e os meninos precisam de alguns
consolos, mas deve hospedar poços de petróleo e exploração de minérios mil (até
em áreas indígenas). Gente, Bolsonaro fez a cabeça de Lula.
Danem-se as alternativas modernas. Como o
uso do crédito de carbono pela preservação do maior manguezal contínuo do
planeta na costa dos estados amazônicos. Ou o turismo ambiental no coral
recifal — do tamanho do estado da Paraíba! — descoberto em 2016 na margem
equatorial brasileira. Dizia Oswald de Andrade, com seu humor premonitório,
quando observava os entusiasmos pátrios com os muitos faustos econômicos:
— O Brasil é um país cheio de gente dando
adeus. Adeus ao futuro.
Adeus!
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