Folha de S. Paulo
Receita federal cai mais rápido; preço de
petróleo e dividendos de estatais fazem estrago
A arrecadação do governo diminui cada vez
mais rápido, soube-se nesta quarta-feira (30) com a divulgação dos números das
contas federais. Quanto mais diminuir, mais difícil será atingir a meta de
déficit primário zero de 2024, que tem causado um sururu entre a maior parte
dos ministros de Luiz Inácio Lula da Silva
e Fernando
Haddad (Fazenda).
Se a receita continuar a baixar, maior a
disputa política: ou se vai gastar menos no "Novo PAC" ou déficit e
dívida serão ainda maiores.
Petróleo, Petrobras e
dividendos pagos por estatais têm muito a ver com o estrago. Menos concessões
de serviços à iniciativa privada também.
A maior parte da baixa da arrecadação não se deve à diminuição da receita de impostos. A perda vem da conta de "receitas não administradas pela Receita Federal": dividendos (parte dos lucros) de estatais, receitas de exploração de recursos naturais ou de concessões (pagamento de direitos de exploração de um serviço público, isto é, privatização de serviços). Mesmo que a economia volte a crescer e as empresas a pagar mais impostos, pode ser que essas outras receitas não cresçam, é fácil perceber.
A receita total do governo federal caiu
2,19%, em termos reais (na comparação dos 12 meses somados até julho de 2023
com os somados até julho de 2022). Descontadas as transferências de receita
obrigatória para estados e municípios (receita líquida), a baixa foi de 3,24%.
A receita total em 12 meses caiu do
equivalente a 23,33% do PIB em dezembro de 2022 para 22,15% do PIB. A receita
líquida, aquela que de fato fica à disposição do governo federal, caiu de
18,74% para 17,78% do PIB (baixa de 0,94% do PIB, ora uns R$ 97 bilhões).
Notem: o governo precisa aumentar sua
receita em algo perto de 1,1% do PIB de 2023 para 2024 a fim de atingir a meta
de déficit primário zero (receitas e despesas, afora juros, equilibradas).
A baixa na receita de impostos foi de 0,4%
do PIB.
A queda da receita com dividendos de
estatais foi de 0,22% do PIB (0,12% do PIB da Petrobras, 0,09% do BNDES). A
redução do preço do petróleo e da parcela do lucro distribuído pelas estatais
fez o estrago.
No caso de "receitas de exploração de
recursos naturais", a baixa foi de 0,21% do PIB. É o dinheiro recolhido da
exploração de recursos minerais (royalties, participações, Contribuição
Financeira pela Exploração Mineral). O grosso dessas receitas vem de petróleo,
gás e minério de ferro.
A receita de concessões caiu muito. É
sempre muito variável. Depende, claro, do volume de concessões de serviços à
iniciativa privada. A baixa foi de 0,37% do PIB.
A perda de arrecadação com a baixa do preço
do petróleo e seus efeitos secundários deve ter sido ainda maior, pois também
diminuiu o faturamento e lucro das empresas do setor, a
começar pela Petrobras, que assim tendem a pagar menos impostos.
O Brasil se tornou um país petroleiro e
deve sê-lo ainda mais nos próximos anos. A receita petrolífera e suas variações
vão pesar cada vez mais nas contas dos governos, não apenas o federal. Criar
gastos permanentes e/ou altos com base nas receitas muito voláteis do petróleo
tende a dar em besteira. Outro motivo para prestar atenção a esses
números: muita
gente no governo Lula quer diminuir o pagamento de dividendos das empresas
públicas ("estatais"). A conta já começou a chegar, de leve,
mas vai ser bem mais alta. De resto, se a lucratividade dessas empresas
diminui, também cai a distribuição de dividendos.
Mais ainda: não é possível contar como
receita de concessões ao setor privado como fonte regular de arrecadação,
claro. Mas mais concessões aumentam a taxa de investimento na economia e rendem
uns trocados grossos para o governo.
Parte do petismo governista deveria pensar
nesses números.
Verdade.
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