Folha de S. Paulo
Torcendo pelo dia em que 'coisa de preto'
seja sinônimo de denunciar crime de racismo.
Num país onde há racismo sem racistas,
a cassação do
mandato do vereador Camilo Cristófaro (Avante) pela Câmara
Municipal de SP é uma vitória a ser enaltecida por todos os que se consideram
antirracistas.
Não só pelo ineditismo da decisão – é a primeira vez que um político perde o mandato por quebra de decoro parlamentar em decorrência da prática de crime de racismo. Mas também pelo reconhecimento de que o Estado/Poder Público não deve deixar de punir a conduta de quem reconheceu "ter tido uma fala racista".
Tampouco pode recriminar o denunciante
atribuindo-lhe excesso de subjetividade na queixa, muito menos desconsiderar a
acusação com base num suposto convívio pacífico e na contratação de pessoas
negras pelo acusado. Vale independentemente de qualquer suposto esvaziamento
natural do dolo baseado na presunção de ausência de vontade de discriminar.
Como referi em minha coluna "Coisa de
preto" (17/7), Cristóforo afirmou "Eles arrumaram e não
lavaram a calçada. É coisa de preto, né" para se referir a um serviço mal
feito, em 2022. Depois deu desculpas divergentes para se justificar.
Contudo, o fato mais importante a ser
destacado talvez seja a reação da população negra, que saiu da passividade e
passou a valer-se dos mecanismos legais para exigir respeito à sua dignidade e
defender seus direitos.
Como diz um amigo, "ir à Justiça é um
processo muito custoso, doloroso, demorado e com resultados nem sempre
satisfatórios". Nesse sentido, exercer a cidadania tem um custo e exige
uma energia que nem todos possuem, mas felizmente cada vez mais pretos e pardos
se mostram dispostos a dispender.
Apesar de todo ônus que uma queixa de racismo
pode acarretar, as pessoas estão denunciando! No caso de Camilo Cristófaro, a
denúncia foi feita por outra parlamentar, a vereadora Luana Alves (PSOL), uma
mulher negra.
Torcendo pelo dia em que "coisa de
preto" será sinônimo de denunciar crime de racismo.
Eu também.
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