Revista Veja
A escola não é vista com a nobreza de uma estrada
O título deste artigo lembra o pedágio cobrado aos usuários em rodovias, e raros lembrariam do pedágio pago para ir do presente ao futuro usando a escola. As classes médias e altas aceitam pagar o alto pedágio das mensalidades, e a nação aceita o custo ainda mais alto da omissão, do descuido do país com a educação de base. Dos atuais 50 milhões de crianças e adolescentes em idade escolar, estima-se que, graças ao gasto financeiro de até 150 bilhões de reais de mães e pais, 10 milhões deles terminarão o ensino médio minimamente alfabetizados para os desafios da contemporaneidade. No mesmo período, o Brasil pagará o amargo pedágio de desperdiçar ao redor de 40 milhões de cérebros que não terão o preparo necessário para facilitar a busca de felicidade pessoal e participar da construção de um país melhor e mais belo.
A parcela que paga não reclama do pedágio
chamado mensalidade porque vê educação como benefício familiar, não como atalho
para o futuro do Brasil; aqueles que têm os filhos em cursos públicos sem
qualidade não reclamam porque veem a escola como favor do Estado, sobretudo
pela merenda e a guarda da criança por algumas horas em cada dia, não um investimento
para o futuro de cada brasileiro e da nação. Não imaginamos a escola como
estrada para o futuro do país.
“A parcela que paga mensalidades vê a
educação como benefício familiar, não como atalho para o futuro”
Nos acostumamos com a ideia de que o Estado
deve construir e manter estradas geográficas para todos, independente de quem
as utiliza — mas a educação das crianças deve ser paga por seus pais ou mantida
pelos pobres municípios sem condições de assegurar a qualidade necessária.
Desejamos todas as estradas boas e públicas, mas aceitamos que a educação seja
privada e sem qualidade igual para todos. O Brasil já despertou até mesmo
contra o amargo pedágio da queima de florestas, mas ainda não para a constante
queima de cérebros em escolas sem qualidade. Não temos a percepção da educação
como alavanca do progresso, daí não sentirmos amargura no pedágio que alguns
desembolsam para a educação privada de seus filhos, nem no imenso custo da
omissão ao nos contentarmos com poucas crianças concluindo o ensino médio com
qualidade: alfabetizadas para o mundo moderno.
A escola não é vista com a nobreza de uma
estrada, uma ponte, aeroporto ou hidrelétrica. Além disso, cada criança é vista
isoladamente, não como parte do conjunto da inteligência que o país precisa
para construir seu futuro. Em consequência, o pedágio não parece amargo, uma
vez que os ricos se beneficiam privadamente, e a sociedade não considera o
desperdício de talento intelectual, por omissão com a educação de base.
Exige-se que as estradas para deslocamento
entre cidades devam ser públicas, mas tolera-se a privatização das escolas,
estradas para o futuro sem necessidade de qualidade para todos. A sociedade
brasileira aceita o pedágio para o futuro, por mensalidade privada ou por
omissão pública, sem a amargura sentida ao pagar pedágio em rodovias entre
cidades.
Se houvesse consciência da importância da
educação como o vetor do progresso, para a vida do aluno e o desenvolvimento do
país, o Brasil não aceitaria uma única escola sem qualidade: nem pedágio por
mensalidade para os filhos dos ricos, nem a perda do talento de cada criança.
Publicado em VEJA de 1º de setembro de
2023, edição nº
2857
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