O Estado de S. Paulo
Bolsonaro destruiu a carreira e o nome de Mauro Cid; agora, está nas mãos dele
Como presidente, Jair Bolsonaro destruiu a
carreira, o nome e a honra do tenente-coronel da ativa Mauro Cid. Como ex-presidente,
está nas mãos dele. A cada dia aumenta o risco de trocar a glória de ter subido
a rampa do Planalto pelo vexame de descer os degraus de uma prisão, não por um,
mas por uma sucessão de crimes.
Cid não é santo, criança, ingênuo, nem freira no lugar errado. Fez o que fez em sã consciência, achando que o poder pode tudo, tirando casquinha e usando o slogan (com odor fascista) de Bolsonaro, “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, como Bolsonaro acima de tudo e de todos, pior que o repulsivo “Um manda, outro obedece” do general, então na ativa, Eduardo Pazuello.
Parece evidente, porém, que Cid cumpria
ordens do chefe e ninguém melhor e com mais conhecimento de causa e de fatos do
que ele para fazer delação premiada e montar o mapa dos desvios e desmandos do
governo do capitão reformado, onde as regiões são as várias frentes de
investigação. Ele, Cid, desbravou todas elas em posição de executormor. E quem
era o mandante?
Quatro meses preso por certificados falsos
de vacina, Cid também é pivô nas investigações sobre colares, relógios e
diamantes; venda e recompra de parte das joias no exterior; vazamento de
inquérito sigiloso da PF para divulgar fake news contra as eleições; milhões de
reais em contas e o dinheiro vivo que ia, por exemplo, para a então
primeira-dama, Michelle.
Por fim – ao que se sabe até agora – Cid
andava em péssimas companhias, falava e trocava mensagens por celular com um
amigo militar de Bolsonaro expulso do Exército e até na antessala do gabinete
presidencial. E guardava uma minuta de golpe à semelhança da encontrada pela PF
na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres – o outro homem-bomba de
Bolsonaro.
Cid sabe de tudo, participou de tudo e
percebeu que estava sendo jogado ao mar quando Bolsonaro declarou que “cada um
segue a sua vida”. A gota d’água para a delação premiada foi a operação da PF
contra seu próprio pai, general Mauro Lourena Cid, que integrou o Alto-Comando
do Exército. Jogou a toalha: a verdade ou a mentira, ele (Bolsonaro) ou eu.
Agora é saber também, por exemplo, como os “generais do Planalto” entram na
história.
Além da disputa entre PGR e PF pelas
delações, o que incomoda e pode embaçar a verdade é uma balança desequilibrada:
enquanto aperta o torniquete contra Bolsonaro, o STF, inclusive
monocraticamente, alivia contra todos os alvos da Lava Jato. Isso confunde a
sociedade e atiça golpistas, que lutam para deslegitimar o que é legítimo e legal:
a delação premiada de Cid.
Pois é.
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