Valor Econômico
Supressão do artigo que permite ampliar terceirização no serviço público pode ter o condão de descongestionar o debate
Está em gestação na Câmara dos Deputados uma fórmula para tentar destravar a tramitação da reforma administrativa.
Na cúpula da Casa, acredita-se que a supressão do artigo 37-A da proposta de emenda constitucional pode ter o condão de descongestionar o debate sobre o tema. É o trecho da PEC que permite ampliar a terceirização no serviço público. Nas palavras dos articuladores da iniciativa, o bode que pode ser retirado da sala para que o projeto ganhe adesões entre parlamentares governistas.
Ou, pelo menos, reduzir as resistências ao texto atual: articuladores políticos do Palácio do Planalto têm prometido mobilizar todas as forças possíveis da base para barrar a reforma administrativa encaminhada pelo governo anterior em 2020. Até porque ela foi deixada à própria sorte por Jair Bolsonaro (PL) quando o ex-presidente abandonou de vez a fantasia de liberal que vestiu durante a campanha eleitoral de 2018, ponderam autoridades do governo.
Na semana passada, o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, afirmou que a reforma administrativa em tramitação no Congresso é um “lixo”. Sua declaração deve ser lembrada por adversários, caso o ministro seja indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF) e no futuro tenha que julgar a constitucionalidade de algum dispositivo da matéria.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defende prioridade na aprovação do projeto que veda supersalários. Mas é a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, quem tem tomado a frente nesse debate.
Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, argumentou que a estabilidade do servidor protege o Estado “no sentido de evitar perseguições políticas ou retaliações contra quem denunciar malfeitos”. E reiterou que, em vez de uma proposta de emenda constitucional, o governo Lula trabalhará para aprovar projetos de lei que tratem da reestruturação de carreiras, mudanças nos concursos para diminuir a judicialização e avaliação de desempenho do servidor com metas.
Dessa forma, o debate seria reiniciado a partir do zero. Já a PEC 32/20 passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, por uma comissão especial e, em tese, pode ser colocada em votação no plenário.
Seus defensores argumentam que ela não alcança os servidores atuais. Olha para frente, com o objetivo de modernizar o Estado, adequar seu tamanho e, com isso, reduzir despesas obrigatórias. De fato, a proposta tenta acabar com privilégios como férias superiores a 30 dias por ano, adicionais por tempo de serviço, aumentos retroativos, promoções baseadas exclusivamente no tempo de serviço, concessão de licença-prêmio e a redução de jornada sem redução de remuneração.
Em outra frente, busca estabelecer carreiras com ciclos de promoções mais extensos, salários de ingresso comparáveis ao mercado e um menor ritmo de reposição de servidores aposentados. Seus autores justificam que isso seria possível diante da perspectiva de aumento de produtividade dos funcionários em atividade e da transformação digital do serviço público. Tenta, também, abrir caminho para a realização de demissões por baixo desempenho em avaliações periódicas.
Em relação ao artigo 37-A, o texto diz que União, Estados, Distrito Federal e municípios poderiam “firmar instrumentos de cooperação com órgãos e entidades, públicos e privados, para a execução de serviços públicos, inclusive com o compartilhamento de estrutura física e a utilização de recursos humanos de particulares, com ou sem contrapartida financeira”.
Tais instrumentos de cooperação seriam regulamentados por uma lei federal específica, mas, até a edição dessa norma, os entes subnacionais poderiam legislar sobre essa matéria. Atividades privativas de cargos típicos de Estado não poderiam ser exercidas por terceiros, como a de auditor fiscal ou diplomata.
Nunca se soube com precisão a economia que a reforma encaminhada por Bolsonaro ao Legislativo promoveria. Em um primeiro momento, o governo anterior projetou a cifra de R$ 300 bilhões em dez anos.
Depois, mencionou-se R$ 450 bilhões no mesmo período. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chegou a divulgar um estudo com vários cenários de redução das despesas com pessoal da União, dos Estados e dos municípios, os quais variavam dependendo de eventual congelamento de vencimentos e da implementação de medidas relativas à reposição de funcionários, instituição de novos salários iniciais e regras de progressão das carreiras. O astronômico cálculo chegava a R$ 816 bilhões em dez anos, se consideradas outras medidas de ajuste fiscal.
Dificilmente o governo escapará da discussão sobre a redução de despesas. A cúpula da Câmara tem recebido de interlocutores do mercado a mensagem de que é necessário sinalizar a disposição de equilibrar o Orçamento, diante das potenciais dificuldades de aumento permanente de receitas. Mas, para que a discussão ocorra de forma mais pragmática, os cálculos sobre os benefícios da reforma deveriam ser atualizados pela área técnica do Congresso e especialistas independentes.
Pois é.
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