sexta-feira, 22 de setembro de 2023

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Ataque do PT ao TSE é cínico e oportunista
Eleitoral tem garantido a democracia e organizado os pleitos de forma exemplar 
Já era constrangedora a aliança pluripartidária — incluindo os rivais PT e PL — para chancelar a PEC da Anistia, que promove o maior perdão da História a partidos que tenham cometido toda sorte de irregularidade na última eleição. Pois agora, para desqualificar as multas aplicadas pela Justiça Eleitoral no estrito cumprimento da lei, o PT patrocina um ataque aos tribunais eleitorais, fiadores da lisura do último pleito e bastiões de resistência das instituições democráticas. 

Antes, petistas se esmeravam em elogios ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelo papel crítico na defesa das urnas eletrônicas e na realização de um pleito cujo resultado é inquestionável. Agora, em discurso na Câmara, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, chegou a questionar a própria existência da Justiça Eleitoral. “Não pode haver uma Justiça Eleitoral”, afirmou. “Isso já é um absurdo e custa três vezes mais do que o financiamento de campanha.” Não é uma declaração muito diferente das proferidas às vésperas das eleições por próceres bolsonaristas — à época criticados com razão pelo PT. 

Em julho, depois que o TSE tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível até 2030, sob acusação de usar o cargo para disseminar desinformação sobre as urnas eletrônicas, Gleisi se desdobrou em elogios. Afirmou que a decisão era “pedagógica” por impor limites ao extremismo bolsonarista. Quer dizer: quando a Justiça Eleitoral toma decisões que agradam ao PT, é incensada. Quando não, sofre ataques. 

Gleisi sustenta que as multas fixadas pelos tribunais eleitorais são inexequíveis e representam apenas a visão subjetiva da equipe técnica, “que sistematicamente entra na vida dos partidos políticos, querendo dar orientação, interpretando a vontade de dirigentes, a vontade de candidatos”. Para ela, isso torna as legendas inviáveis. Mas não diz uma só palavra sobre o dever que cabe a todo partido: respeitar a lei eleitoral e as decisões da Justiça. 

Não faz sentido acusar a Justiça Eleitoral de inviabilizar os partidos. As legendas foram agraciadas no ano passado com quase R$ 6 bilhões dos fundos eleitoral e partidário. Dinheiro, não custa lembrar, dos cofres públicos. Por isso é natural que se olhe para onde vai. E o que se tem visto é preocupante. A análise das equipes técnicas revelou o uso do dinheiro em churrascadas, construção de piscina, aluguel de frotas milionárias e por aí vai. Quem inviabiliza os partidos, portanto, são os próprios partidos, com seus descaminhos. 

Ainda que sempre se deva prestar atenção ao custo dos tribunais, o mais relevante é o papel da Justiça Eleitoral na democracia. Não se pode esquecer o que ocorreu há menos de um ano, com ataques às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral. Com o decorrer das apurações, um dia se conhecerá a extensão da trama golpista que pôs em risco a democracia, desaguando no 8 de Janeiro. Já se sabe, porém, que a firmeza do TSE nos momentos críticos foi fundamental para o país resistir à tormenta. 

Graças ao TSE e à Justiça, o Brasil tem combatido ataques à democracia com mais eficácia que os Estados Unidos, país que enfrentou ameaça similar. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao ser diplomado, destacou a coragem do Supremo e do TSE, “que enfrentaram toda sorte de ameaças, ofensas e agressões para fazer valer a soberania do voto popular”. 

Correção da ‘pedalada climática’ aumenta a credibilidade do Brasil 

O Globo 

Decisão põe fim à manobra de Bolsonaro que permitia ao país afrouxar meta de emissão de gases 

No encontro em Nova York com o americano Joe Biden, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ressaltou o compromisso brasileiro com a questão climática. Enquanto os dois conversavam, a ministra do Meio AmbienteMarina Silva, anunciou que o Brasil corrigirá a manobra que ficou conhecida como “pedalada climática”. Já não era sem tempo. 

Firmado em 2015 na COP21, o Acordo de Paris estipula condições para manter, até o final deste século, o aquecimento global abaixo de 2°C em relação ao período pré-industrial, idealmente em 1,5°C. Para buscar o objetivo, os signatários anunciaram na época metas de redução de suas emissões de gases. O Brasil comprometeu-se a cortá-las em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo como base 2,1 bilhões de toneladas de carbono emitidas em 2005. 

Só que a estimativa de quanto fora emitido em 2005 foi mudando. Em 2020, no governo de Jair Bolsonaro, o número havia subido para 2,4 bilhões de toneladas. Para se manter fiel ao compromisso firmado em Paris, portanto, Bolsonaro deveria ter elevado os percentuais de corte, de modo a preservar a garantia de que a reavaliação do número de 2005 não resultasse na autorização para mais emissões no futuro. Em vez de 37% até 2025, deveria ter se comprometido com 46%. Em vez de 43% até 2030, 51%. Assim, as metas em termos absolutos — toneladas de gases lançadas no ar — se manteriam as mesmas. 

Mas Bolsonaro tinha outras ideias. O então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, optou por uma manobra contábil. Até elevou o percentual, mas não para o patamar correto. A medida criou uma brecha para o Brasil emitir mais poluentes. Felizmente, o anúncio de Marina nesta semana corrige esse erro com folga. As novas metas anunciadas são: 48% até 2025 e 53% até 2030. 

Para entregar o que promete, o país terá de avançar no combate ao desmatamento. Na região amazônica, a destruição da floresta caiu 43% de janeiro a julho, na comparação com os sete primeiros meses de 2022. No Cerrado, as notícias são negativas. Lá o desmatamento ainda não parou de crescer — subiu 22% entre janeiro e julho. O governo Lula atribui a devastação à omissão dos governos locais. Ainda que isso possa ser verdade, não exime o governo federal de tomar providências. 

O Brasil sediará em Belém daqui a dois anos a COP30, “a mais importante desde Paris”, segundo Marina. É esperado que todos os países apresentem uma nova rodada de compromissos para combater o aquecimento global. Até lá, o governo precisará avançar ainda mais na agenda da preservação, um dos pilares da política externa de Lula. 

O aviso do BC 

Folha de S. Paulo 

Como aponta o órgão, queda dos juros a níveis adequados depende de metas fiscais 

O Banco Central confirmou as expectativas e cortou a taxa básica de juros em 0,5 ponto percentual, para 12,75% ao ano. A decisão unânime e a descrição do cenário por parte do Comitê de Política Monetária sugerem a continuidade desse ritmo nas próximas reuniões. 

Em tese, pelas projeções divulgadas no comunicado, a redução da Selic pode ir até 9%, patamar que manteria a trajetória de convergência da inflação para perto da meta de 3% no ano que vem. 

Entretanto há incertezas, talvez crescentes, que decorrem de fatores locais e externos. 
Há progresso notável no controle da alta dos preços. A queda dos chamados núcleos do IPCA, indicadores das tendências do índice, tem sido consistente e sugere que a política monetária apertada está cumprindo seu papel. 

Já a atividade econômica tem se mostrado resistente, com alta continuada nas projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto neste 2023. No início do ano, elas rondavam 0,7%; agora, são 2,9%. 

Se o PIB tiver expansão no terceiro trimestre, como apontam os primeiros dados relativos a comércio e serviços em julho, o avanço no ano poderá até ser maior. Certamente não é só a boa safra de grãos que justifica o desempenho. A forte expansão dos gastos públicos tem peso importante. 

A continuidade da tendência do governo petista a gastar sempre mais, porém, dificultará o trabalho da política monetária e pode comprometer a atividade mais à frente. 

Não por acaso, o BC apontou o risco de que o descumprimento das metas fiscais em 2024 eleve as pressões inflacionárias e o prêmio cobrado pelo mercado para a rolagem da dívida pública. 

No exterior, da mesma forma, há dúvidas importantes que vêm se acentuando nos últimos meses. A força da economia americana e a alta dos preços de energia têm elevado os juros internacionais. 

Embora o Fed, o banco central americano, tenha mantido os juros estáveis entre 5,25% e 5,5% ao ano, sua indicação para 2024 foi de menos cortes —em vez de 1 ponto percentual, apenas 0,5. Com isso o dólar voltou a se valorizar e houve queda nas Bolsas globais. 

Maior restrição monetária no centro financeiro mundial aumenta a possibilidade de uma recaída recessiva, que pode atingir países em desenvolvimento. 

Daí a necessidade de prudência na condução doméstica da política econômica, que deve levar em conta as grandes incertezas ainda existentes no cenário externo. 

O melhor agora seria conter despesas públicas e assim oferecer mais espaço para que os juros do BC possam cair de forma sustentável. Taxas de 9%, afinal, ainda seriam demasiadamente altas. 

Desafios da longevidade 

Folha de S. Paulo 

Governos precisam criar políticas que se antecipem à alta de casos de demência 

Segundo a Organização das Nações Unidas, 9,6% dos 8 bilhões de habitantes do planeta têm mais de 65 anos e, em 2050, serão 16,5% de 9,7 bilhões. Tal processo de envelhecimento da população provoca impacto direto no sistema de saúde, e governos precisam se antecipar aos desafios vindouros. 

Dentre as mazelas que atingem os idosos, destacam-se as síndromes que causam déficit progressivo na função cognitiva. Mais de 55 milhões de pessoas vivem com demência no mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Em 2050, serão cerca de 140 milhões. 

No Brasil, pesquisa da Associação Brasileira de Alzheimer, com dados de 2019, aponta 1,7 milhão de brasileiros com algum tipo de demência —55% dos casos são de doença de Alzheimer. Em 30 anos, projetam-se mais de 5,5 milhões. 

Evidências mostram que a prevenção exige políticas interdisciplinares de médio e longo prazo. 

Cerca de 40% dos casos de demência poderiam ser evitados por meio de ações mirando 12 pontos: educação (antes dos 45 anos), hipertensão, obesidade, perda auditiva, traumatismo cranioencefálico, abuso de álcool, tabagismo, depressão, sedentarismo, isolamento social, diabetes e poluição do ar (acima dos 65 anos). 

Especialistas apontam que o primeiro gargalo no Brasil é o diagnóstico: tardio e precário na abrangência, principalmente do Alzheimer. 

O tratamento também é multifatorial e não se restringe à terapia medicamentosa. Envolve, além de neurologistas, psicólogos, nutricionistas, enfermeiros, cuidadores, reabilitação e cuidados paliativos. 

O custo social das demências é elevado. O gasto médio no tratamento de um paciente é de US$ 1.379 por mês (R$ 6.798, segundo a cotação mais recente). 

Ademais, a síndrome também afeta a família, notadamente as mulheres —9 em cada 10 cuidadores informais são do sexo feminino, de acordo com pesquisa do ambulatório de geriatria da Unesp. 

Dentre os responsáveis pelo cuidado do paciente, 62,2% relatam sofrer com algum transtorno psicológico, como depressão e ansiedade. No curto prazo, é preciso criar uma rede de apoio para as famílias. 

Políticas públicas que se antecipem ao aumento de casos de demência devem se basear não apenas em fatores propriamente médicos mas também em ações de combate à desigualdade social —a baixa escolaridade, por exemplo, é o principal fator de risco da doença.

Quem decide sobre aborto é o povo 

O Estado de S. Paulo  

Não há nada na Constituição que deslegitime a legislação vigente nem que impeça sua mudança. Mas alteração manejada pelo Judiciário seria intolerável violação da soberania popular 

 

A ministra Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), pautou para hoje o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442, interposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em 2017, com a pretensão de que a Corte declare a inconstitucionalidade dos artigos 124 e 126 do Código Penal e descriminalize a interrupção da gravidez até a 12.ª semana de gestação. Quando a ação foi ajuizada, Rosa Weber, sua relatora, afirmou que o tema precisava de “amadurecimento”, 

mas prometeu que o tribunal não deixaria a sociedade sem resposta. À época, como agora, contudo, a única resposta que a sociedade espera da Corte é que ela respeite a decisão dessa mesma sociedade. 

Os termos da disputa sobre o aborto são bem conhecidos. Resumidamente, os favoráveis alegam o direito das mulheres de dispor do próprio corpo. Sem negar essa liberdade, os contrários afirmam que ela termina quando começa o direito à integridade de outro corpo, no caso do nascituro. Cada um é livre para advogar quem deveria ter direito a quê. O que é incontroverso é que, num Estado Democrático de Direito, quem determina quem efetivamente tem direito a que é o povo, seja indiretamente, através de seus representantes eleitos, seja diretamente, através de plebiscito. 

A determinação em vigor, consagrada pelo Legislativo no Código Penal de 1940, estabelece a prevalência do direito à vida do feto em detrimento do direito de escolha da mulher, exceto quando a gravidez é não só indesejada, mas forçada (estupro), ou quando há risco de vida da gestante. Posteriormente, o STF autorizou o aborto de fetos anencefálicos, dada a inexistência de expectativa de vida extrauterina. 

A Constituição não dispôs especificamente sobre o aborto. Não se trata de descuido do Poder Constituinte. Sua decisão foi delegar ao legislador infraconstitucional a competência sobre o tema, mas, ao assegurar a inviolabilidade do direito à vida, recepcionou a tipificação dos crimes contra a vida do Código Penal. Para contornar esse inconveniente, o PSOL pariu a hermenêutica bastarda de que o ser humano, antes de nascer, não teria direitos fundamentais, porque não seria uma “pessoa constitucional”, só uma “criatura humana intrauterina”. O Código Civil, porém, estabelece que “a personalidade civil da pessoa começa no nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. 

Um eventual deferimento da ação traria como consequência incontornável o acréscimo de mais uma excludente de ilicitude às já estabelecidas na lei. 

Ou seja, o Judiciário estaria legislando, em flagrante violação à prerrogativa do Legislativo. 

A única resposta cabível da Corte à ação deveria ter sido dada já em 2017, pela própria Rosa Weber: negar conhecimento para que a questão fosse tratada pelo Poder Legislativo. De lá para cá, intensificaram-se, frequentemente com razão, as críticas ao Judiciário por intrometer-se na competência dos outros Poderes. Agora, a Corte tem mais uma vez a oportunidade concreta de demonstrar respeito ao princípio da separação dos Poderes. Mas o risco de que, mais uma vez, o desrespeitará não é pequeno. 

De fato, alguns ministros até se anteciparam. Já em 2016, num caso pavoroso de teratologia jurídica, o ministro Luís Roberto Barroso extrapolou o objeto de um julgamento sobre um habeas corpus e extraiu a fórceps da Constituição um período de três meses de gestação dentro do qual o aborto não seria ilegal, no que foi seguido por Edson Fachin e pela própria Rosa Weber. 

Não há nada na Constituição que deslegitime a legislação vigente. Tampouco há algo que impeça a sua eventual mudança. O aborto pode ser legalizado, assim como a sua proibição pode ser constitucionalizada, e inclusive há várias propostas num sentido e no outro tramitando no Congresso. Nesse debate, cada 1 dos 11 ministros do STF certamente tem sua convicção sobre o que deve ou não ser normatizado. Mas essa convicção vale exatamente o mesmo que a de cada um dos mais de 150 milhões de eleitores brasileiros, não menos e, sobretudo, não mais. 

O comedimento do Banco Central 

O Estado de S. Paulo  

Após reduzir os juros, Copom reforça a importância de que as políticas monetária e fiscal convirjam. Só ações concretas do governo e apoio efetivo do Congresso podem acelerar a queda 

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) reduziu a taxa básica de juros a 12,75% ao ano. A decisão já era esperada, mas havia alguma dúvida sobre o ritmo de queda da Selic, sanada com o apoio unânime ao corte de 0,5 ponto porcentual nesta semana e encomendado para as reuniões de novembro e dezembro. 

Ao explicar a decisão, o comitê destacou, no cenário externo, as incertezas em relação à inflação nos Estados Unidos e na Europa e as perspectivas de menor crescimento econômico da China. No mesmo dia, o Federal Reserve (Fed) manteve as taxas inalteradas no intervalo entre 5,25% e 5,50% anuais e sinalizou que a política monetária ficará em terreno restritivo por mais tempo do que se esperava. Assim, a redução do diferencial entre os juros norte-americanos e os brasileiros pode vir a tornar-se mais um fator de risco a ser considerado pelo BC. 

Internamente, não houve novidades. O Copom destacou que as expectativas de inflação permanecem acima da meta no horizonte dos próximos três anos. A resistência da inflação de serviços e o vigor da atividade econômica continuam a ser monitorados. A exemplo do que faz em todos os comunicados, o BC reiterou a disposição em perseguir as metas de inflação. Por isso mesmo, não passou despercebida a menção à importância da política fiscal para ancorar as expectativas de inflação. 

Para surpresa e incômodo de alguns analistas acostumados a ver o Banco Central bater nessa mesma tecla nos últimos anos, não houve qualquer menção a questões de cunho fiscal no comunicado divulgado em agosto, quando o colegiado voltou a reduzir os juros. Agora, o assunto voltou a ser mencionado, mas uma única vez. “Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reforça a importância da firme persecução dessas metas”, disse o BC. 

Ainda que sucinto, o trecho foi interpretado como um apoio à disposição do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em buscar o equilíbrio das contas públicas. De um lado, a meta de zerar o déficit no ano que vem tem sido boicotada pelo Congresso e por parlamentares do próprio PT. De outro, o ministro tem sido pressionado por parte do mercado a esclarecer suas projeções para as receitas e despesas do Orçamento do ano que vem. 

Nesse sentido, o comunicado do BC reforçou a importância de as políticas monetária e fiscal remarem para a mesma direção. Embora o comportamento dos preços tenha de fato arrefecido nos últimos meses, trazendo alívio para os consumidores, as expectativas para a inflação de 2025, segundo o boletim Focus, permanecem estagnadas em 3,5% desde o fim de julho. 

É, certamente, um patamar mais confortável que a inflação de dois dígitos com que o País teve de lidar no passado recente, mas ainda está acima do centro da meta definida para 2025, de 3%. E são as expectativas, não a inflação corrente, que norteiam os juros futuros, as apostas do mercado financeiro e a própria atuação do Banco Central. 

Com a sanção do arcabouço e o avanço da reforma tributária sobre o consumo na Câmara, o governo Lula colheu bons resultados no Congresso no primeiro semestre. A retomada dos trabalhos no Legislativo após o recesso, no entanto, veio acompanhada de dificuldades para aprovar medidas para recuperar receitas. 

O plano para rever subsídios e gastos tributários até agora não saiu, e as demandas financeiras de Estados e municípios são crescentes. Sem alternativa, o Executivo se viu obrigado a acomodar o Centrão na Esplanada dos Ministérios para tentar formar uma base firme no Congresso. 

Por enquanto, o discurso de Haddad tem sido suficiente para manter a aposta nos cortes graduais esperados para a Selic nos próximos meses. Ações concretas do governo para comprimir despesas, bem como um apoio efetivo do Legislativo às propostas para garantir novas receitas, eventualmente poderiam acelerar os movimentos do Banco Central. Até o momento, porém, ambos parecem bastante improváveis. 

Mais uma oportunidade 

O Estado de S. Paulo  

Aproximação com os Estados Unidos, ainda que pontual, é boa notícia depois de tantas chances perdidas 

O sucesso do encontro entre os presidentes Lula da Silva e Joe Biden em Nova York, no último dia 20, não deve ser mensurado pela anunciada carta de intenções contra a precarização do trabalho, mas sim pelo campo que pode ser aberto para uma relação mais profunda entre as duas economias. Para isso, contudo, é preciso que o pragmatismo prepondere de lado a lado e que o diálogo seja preservado da contaminação ideológica. O desafio comum a ambos os países, de transformação sustentável de suas economias, assinala a oportunidade de construção de uma aliança econômico-comercial mais robusta – que não pode e nem deve ser perdida. 

A conversa nada garante por enquanto, além das imagens eternizadas do aperto de mãos. Seria ingênuo esperar anúncios bombásticos de uma reunião realizada às margens da Assembleia-Geral das Nações Unidas. A anunciada Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras serve para mostrar que o diálogo construtivo é possível, embora incerto. 

O histórico da relação do Brasil com os EUA traz uma coleção de oportunidades desperdiçadas nas últimas duas décadas, prova de que uma conversa afinada entre os presidentes não é suficiente para alavancar uma maior integração da produção, do comércio e dos investimentos entre os países, com base no respeito e em seus genuínos interesses. Em 2007, o resultado mais palpável da prosa amistosa entre Lula da Silva e o então presidente americano, George W. Bush, foi um protocolo para fazer do etanol uma commodity, algo que mal passou do papel. Perdeu-se entre os atritos de Brasília com Washington e ressurge agora, com enorme atraso, como contribuição para a transição energética mundial. 

Da conversa azeitada entre Donald Trump e Jair Bolsonaro, restou a lamentável declaração de amor incondicional do segundo ao primeiro nos bastidores da Assembleia-Geral da ONU de 2019. A política externa disruptiva do então presidente brasileiro não só envergonhou o País mundo afora, como foi incapaz de construir uma mínima aliança econômica com os EUA – ou com qualquer outra Nação – para enfrentar os desafios do comércio global, da fragmentação política e das ameaças ambientais e sanitárias, como a pandemia. 

Ao lado de Biden, em Nova York, Lula afirmou que aquele encontro significava o “renascer” da parceria bilateral. Não é grande coisa, mas é melhor do que a protocolar visita oficial ao presidente americano na Casa Branca, em fevereiro, quando o brasileiro se perdeu em seus devaneios sobre a agressão da Rússia contra a Ucrânia. 

Em raro momento de convergência, o Brasil busca investimentos estrangeiros para uma reindustrialização focada em sua matriz energética limpa, e os EUA reorientam suas importações de manufaturas para países próximos também no âmbito da defesa da democracia. 

EUA e Brasil têm diferenças marcantes em suas visões geopolíticas e sobre a aplicação das regras do direito internacional, mas sempre é possível encontrar pontos em comum para questões urgentes – desde que, para começar, Lula não permita que o feroz antiamericanismo petista mais uma vez prevaleça sobre o interesse nacional. 

Saúde mental na juventude 

Correio Braziliense  

Embora conceitos como diversidade, inclusão e quebra de tabus sejam reforçados em grande parte por grupos minoritários da sociedade, a aparência ganha cada vez mais relevância 

 

Duas pesquisas divulgadas recentemente mostram que a autoimagem está intimamente ligada ao bem-estar emocional das pessoas, assim como estereótipos de beleza são cada vez mais marcados como padrões. Embora conceitos como diversidade, inclusão e quebra de tabus sejam reforçados em grande parte por grupos minoritários da sociedade, a aparência ganha cada vez mais relevância, afetando em cheio nossos adolescentes e jovens, além de mulheres e o público LGBTQIAPN+. 

A começar pelos adolescentes e jovens, a Pesquisa Nacional de Saúde Infantil, divulgada pelo CS Mott Children's Hospital, da Universidade de Michigan Health, nos Estados Unidos, publicada no final de 2022, aponta que dois terços dos pais dizem que os filhos são inseguros sobre algum aspecto da aparência e um em cada cinco diz que seus adolescentes evitam situações em que se considerem expostos, como, por exemplo, estar em fotos. O levantamento contou com a resposta de 1.653 pais com, pelo menos, um filho com idade entre oito e 18 anos. 

Aspectos como o peso corporal, o visual dos cabelos ou da pele (acne) estão entre os fatores mais comuns de insegurança, bem como a estatura (baixa ou alta demais), características faciais ou vergonha dos seios (obviamente, no caso das meninas). A pesquisa mostra também que o excesso de preocupação com a aparência ou insatisfação corporal pode levar a uma autoimagem equivocada, além de impactos quanto à saúde mental, aumentando assim o risco de problemas como distúrbios alimentares (bulimia, anorexia ou obesidade), depressão e baixa autoestima. 

Outro estudo — “(des)Encanto: bem-estar e o impacto das marcas em um mundo imprevisível” —, divulgado pela MindMiners, plataforma que combina expertise em pesquisa, tecnologia e inteligência de dados, contou com 2 mil respondentes de todo o país e apresentou resultados sobre bem-estar e saúde. Entre as respostas obtidas no estudo, 65% dos entrevistados afirmaram que não estão completamente satisfeitos com seus corpos, sendo que a maioria desse percentual é composto por mulheres, geração Z (nascidos entre 1997 e 2010) e público LGBTQIAPN+. 

Para a CEO da plataforma, Danielle Almeida, o fenômeno de distorção da imagem está se tornando prevalente, especialmente entre os jovens, e muitas vezes é exacerbado não apenas pelo uso de filtros, mas também devido ao conteúdo amplamente divulgado na internet, que incentiva a busca pela perfeição e as comparações incessantes, “o que pode ser implacável”. Não é à toa que, especialmente nessa fase, os jovens manifestem condições como anorexia, bulimia, obesidade, síndrome do pânico, ansiedade, entre outros, chegando até a ideações suicidas. 

O estudo levanta a questão de como trazer de volta o “encanto perdido” e a importância de começar esse trabalho de forma individual, e, posteriormente, em grupo. Cuidar do corpo e da mente deixa de ser um discurso teórico e passa a se revelar como uma ação fundamental para se conquistar uma vida equilibrada e plena. Nesse contexto, além do núcleo familiar, é fundamental que profissionais de educação estejam atentos e aptos a darem o suporte necessário ao jovens. Melhor ainda se puderem contar com o suporte de políticas públicas voltadas à saúde mental, tema que tem cada vez mais despertado a atenção da sociedade. 

Em meio a incertezas, Copom mantém corte gradual de juros 

Valor Econômico 

O cenário externo, que era “incerto”, tornou-se “mais incerto”, porque as taxas de juros de longo prazo estão subindo nos EUA e o crescimento da China perde fôlego 

A política monetária não deve apresentar surpresas até o fim do ano, como indica o comunicado da reunião de setembro do Copom do Banco Central. Restam dois encontros até 2023 terminar, e o Copom assinalou que neles será apropriado manter cortes da Selic em 0,5 ponto percentual, o que garantiria taxas suficientemente contracionistas para empurrar a inflação para a meta em 2024. A menos que os números subsequentes ponham em xeque a avaliação do BC, no curto prazo não há ainda motivos para ampliar as reduções de juros. 

Há duas mudanças entre os comunicados da reunião anterior e a de agora. O cenário externo, que era “incerto”, tornou-se “mais incerto”, porque as taxas de juros de longo prazo estão subindo nos EUA e o crescimento da China perde fôlego. Ambos afetam diretamente o Brasil, de várias formas. 

A decisão do Federal Reserve divulgada na quarta-feira apontou mais um possível - e derradeiro - aumento de 0,25 ponto dos juros, o que levaria a taxa a 5,75% e, mais importante, à manutenção dos juros em nível alto por um período maior de tempo. O gráfico dos pontos, no qual os membros do comitê de mercado aberto do banco aponta a trajetória futura de algumas variáveis, sugere que os juros começarão a cair em 2024, mas de forma bem mais lenta do que os investidores esperavam - dois cortes. Se essa intenção se mantiver, os fed funds pagarão ainda 5,25% ao fim do ano que vem, ainda a maior taxa em 22 anos. 

Os juros de longo prazo, que já vinham em alta, subiram um pouco mais ontem, para o maior nível em 16 anos. O título do Tesouro de 10 anos atingiu 4,48% e o de 20 anos, 4,56%. O diferencial de juros é hoje favorável aos EUA em relação à zona do euro, ao Japão, à China e a outros parceiros comerciais, assim como a taxa de crescimento econômico. Com isso, o dólar se valorizou em relação às moedas dos principais países com os quais comerciam e chegou ontem a seu maior valor desde março. Quanto menor o diferencial de juros entre EUA e Brasil, maior é atratividade do mercado americano para investidores externos. Enquanto o BCB mantém em velocidade de cruzeiro os cortes de juros, o Fed ainda pode elevá-los um pouco mais e promete não baixá-los por um bom tempo. 

O dólar tem se valorizado em relação ao real por isso e ontem subiu mais 1%. Isso torna as importações brasileiras mais caras e pressiona em especial os preços do petróleo, que exibem altas significativas no mercado externo desde junho. Ou seja, há uma pressão combinada para elevar os preços domésticos da gasolina e do diesel, caso a Petrobras mantenha alguma relação entre eles e as cotações externas para seus reajustes. O dólar mais forte atinge todas as commodities, e a combinação de ambos em alta contribuiu muito para levar o IPCA a dois dígitos em 2021 (10,06%) ao promover um choque de preços dos alimentos. 

Nesse ponto, a redução do crescimento chinês age como um amortecedor das cotações das commodities - exceto petróleo, por enquanto -, o que suaviza o impacto sobre os alimentos, que internalizam as cotações externas. Mas a menor expansão chinesa priva a economia global de um impulso preponderante há mais de uma década, o que, combinado ao aperto das políticas monetárias na zona do euro, EUA e Reino Unido, esfriará o crescimento mundial. 

O balanço de riscos do BC não se alterou, e coloca como fator baixista da inflação uma desaceleração global mais forte do que o previsto e impacto dos juros altos sobre a inflação maiores que o antecipado. Os riscos altistas parecem, por enquanto, mais plausíveis: maior persistência das pressões inflacionárias globais, o que tem se verificado, e, no caso doméstico, maior resistência dos preços dos serviços diante de um hiato do produto mais fechado - economia crescendo perto do potencial. 

A outra mudança no comunicado diz respeito à volta da menção da política fiscal. Em curto parágrafo, o Copom “reforça a importância da firme persecução dessas metas” por seus efeitos importantes sobre as expectativas inflacionárias. A política fiscal expansionista do primeiro ano de governo Lula vai na direção contrária do esforço fiscal e retira parte de sua eficácia. Com o déficit zero prometido para 2024, a política fiscal deixaria de ser estimulativa (ver artigo abaixo), facilitando o combate à inflação. 

O cenário de referência do BC piorou marginalmente, com o IPCA estimado subindo de 4,9% para 5% em 2023, 3,5% em 2024 e 3,1% em 2025. A piora se deve ao avanço dos preços administrados, que podem chegar a 10,5% no ano, ante 9,4% no cenário anterior. Os preços livres, por seu lado, estarão rigorosamente na meta do BC, oscilando muito perto dos 3%. Se as projeções do Relatório de Inflação do BC de junho estiverem corretas, o hiato do produto ainda é negativo em 1,2% e o crescimento acima do esperado da economia até agora é compatível com o declínio da inflação. Se a avaliação mudar, o BC terá de ser ainda mais cauteloso e paciente do que vem sendo no manejo dos juros. A ata da reunião e o relatório de inflação de setembro, que serão divulgados em breve, poderão dar pistas valiosas sobre a temperatura das atividades e a trajetória dos juros. 

 

 

 

 

 

 

 

 

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