O Globo
Bispo emérito de Duque de Caxias apoiou movimentos sociais, incomodou governos e ajudou a fundar a Ação pela Cidadania
A notícia passou quase batida entre tiros e
bombas no Oriente Médio. Morreu na segunda-feira dom Mauro Morelli, bispo
emérito de Duque de Caxias. Com ele, vai-se um pedaço da história da luta pela
democracia e contra a fome no país.
Dom Mauro foi ordenado padre em abril de 1965, quando a ditadura completava um ano. Em pouco tempo, entraria na mira dos órgãos de repressão. Relatórios militares se referem ao religioso como “progressista radical” e defensor de “subversivos”. “Desde seu tempo de seminário, está voltado para ideias marxistas”, sentenciou o Centro de Informações do Exército, em 1973.
Nomeado bispo auxiliar de São Paulo,
aproximou-se de dom Paulo Evaristo Arns, o cardeal dos direitos humanos. Apoiou
as comunidades eclesiais de base, as greves operárias, a campanha contra a
tortura e pela Anistia.
Em 1981, tornou-se o primeiro bispo de Duque
de Caxias, na Baixada Fluminense. Passou a conviver de perto com a fome, a
violência, a miséria nas favelas. Inconformado com a inércia do poder público,
incentivou movimentos sociais e organizou um mutirão para combater a
desnutrição infantil. A causa o acompanharia até o fim da vida.
Dom Mauro nunca parou. A convite de Itamar
Franco, foi o primeiro presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar.
Em parceria com Herbert de Souza, o Betinho, fundou o Movimento pela Ética na
Política e a Ação da Cidadania.
Mais tarde, participou do Comitê Permanente
de Nutrição da ONU e ajudou a formular o programa Fome Zero. A quem esperava
indulgência com Lula, respondeu com críticas ácidas à gestão do PT. “O grande
equívoco de um governo é achar que recebeu o mandato e se afastar do povo”,
advertiu, em 2004.
No ano seguinte, dom Mauro voltaria a
surpreender. Renunciou à diocese de Caxias e passou a se dedicar integralmente
à luta pela segurança alimentar. “A prioridade da minha vida será incomodar
todos os que governam”, avisou.
Nos últimos tempos, o bispo levou sua militância cidadã para as redes sociais. Continuou ativo e engajado, sem se vincular a políticos ou partidos: “A Igreja não deve ser aliada do poder, mas cooperar com o bem comum e a defesa da vida”.
Exatamente.
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