domingo, 1 de outubro de 2023

Bruno Boghossian - Oposição procura gatilho ultraconservador para despertar eleitorado

Folha de S. Paulo

Direita bolsonarista tenta inflar de maneira artificial itens adormecidos da chamada guerra cultural

Há pouco mais de uma semana, deputados bolsonaristas aproveitaram uma sexta-feira morna e lançaram uma isca falsa para seus seguidores. Em tom indignado, espalharam o alerta de que Lula havia instituído o "banheiro unissex" no Brasil.

A gritaria não fazia sentido. O alvo era uma resolução contra a discriminação em instituições de ensino, recomendando a "instalação de banheiros de uso individual, independente de gênero, para além dos já existentes masculinos e femininos". Além de não citar espaços compartilhados, o texto havia sido editado por um conselho que não tem nenhum poder de decisão.

Aquela não foi uma distorção inocente. A direita bolsonarista abusa de gatilhos ultraconservadores para replicar o pânico moral das últimas eleições e inflar de maneira artificial o peso de itens adormecidos da chamada guerra cultural.

Uma tática semelhante foi usada no Senado nos últimos dias. O líder da oposição, Rogério Marinho, propôs um plebiscito sobre a descriminalização do aborto e convocou um protesto nas ruas "a favor da vida".

A movimentação foi vendida como uma reação ao STF, mas o objetivo da tropa é mobilizar eleitores que parecem dispersos na oposição ao governo Lula. Sem acesso aos cofres públicos e sem o megafone da Presidência, o bolsonarismo perdeu fôlego para exercer influência econômica e controlar a pauta política.

A agenda de costumes é um atalho porque desvia o eleitor de uma avaliação objetiva sobre seu bem-estar. Na ausência de uma crise ou de uma deterioração do padrão de vida, a oposição tenta despertar medos abstratos ou provocar confusões turbinadas por informações falsas.

Essa é uma questão sensível para Lula. Na campanha, ele tentou frear a adesão em massa de evangélicos a Jair Bolsonaro desqualificando boatos como aquele do "banheiro unissex". Além disso, os últimos meses mostraram que a hesitação do presidente em relação a uma rota progressista é um fator capaz de abalar a coesão de sua base à esquerda.

 

2 comentários: