terça-feira, 3 de outubro de 2023

Marcelo Godoy - Os generais que disseram não a Jair Bolsonaro

O Estado de S. Paulo

‘Inaceitável’

O então presidente quis entrar com uma motociata pelo portal monumental da Aman. General barrou

Descontentes com a atuação do Tribunal Superior Eleitoral no pleito que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva, generais do Comando de Operações Terrestres (COTer) teriam produzido um estudo sobre a intervenção no Judiciário, com o afastamento de ministros considerados hostis a Jair Bolsonaro. Havia, ainda, oficiais dos Comandos Militares do Norte e do Oeste que se manifestavam contra o presidente eleito em redes sociais ou em abaixo-assinados. No Alto-Comando, uma minoria simpatizava com ideias exóticas.

No Exército, descobertas da PF implicando militares em suspeitas de irregularidades aumentaram ainda mais a distância entre legalistas e defensores do ex-presidente. Aqui vão dois casos de generais que disseram não a Bolsonaro.

O primeiro aconteceu na maior crise militar da Nova República, a que levou à demissão do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e dos comandantes das três Forças. A gravidade do momento pode ser aferida pela história da decisão tomada pelo general José Luiz Dias Freitas. Então chefe do COTer, Freitas recebeu a visita do general Braga Netto, recém-nomeado ministro da Defesa.

Ele queria convidá-lo a assumir a Força Terrestre. “Não posso. Não vou durar uma semana no cargo”, disse. A razão era que ele não se sujeitaria aos caprichos do presidente. Sábia decisão? Um mês depois, o Exército se viu às voltas com o caso de Eduardo Pazuello, general da ativa que discursou em comício de Bolsonaro, no Rio. Freitas passou à reserva e foi viver no interior do Paraná, onde começou a prestar serviço voluntário em uma Santa Casa. Pazuello se elegeu deputado pelo PL em 2022.

MOTOCIATA

Em 2021, o general Paulo Roberto Rodrigues Pimentel comandava a Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) quando Bolsonaro começou suas motociatas. O presidente teve então a ideia de entrar com uma delas, vinda de Resende (RJ), pelo portal monumental da Academia no dia da cerimônia de entrega dos espadins. Era a primeira vez, desde o início da pandemia, que a tradicional festa teria a presença de familiares e autoridades na escola.

Pimentel, um Força Especial, foi abordado pelos ministros Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto. Os dois contaram a intenção do presidente. E tentaram convencê-lo. Ele respondeu que era inaceitável e só havia um jeito de Bolsonaro entrar com a motociata na Aman: nomeando outro general para comandar a escola.

SOLUÇÃO

O general recebeu apoio de outros oficiais. Uma solução foi encontrada: a motociata se concentrou fora dos muros da Aman. A espada do general não tinha partido. Servia aos governos como representantes do Estado e não a um líder. Terminada a cerimônia, o presidente deixou a academia de helicóptero. Pimentel acabou promovido e foi comandar a 3.ª Divisão do Exército, a Divisão Encouraçada, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

Ele é irmão de Carlos Alberto Rodrigues Pimentel, o general que comandava a Brigada de Operações Especiais. Era Carlos que o exmajor Ailton Barros queria convencer a participar de um golpe, conforme registrado em mensagem encontrada pela PF. Nenhum dos irmãos se deixou levar pelo canto da sereia que terminou no 8 de janeiro.

Assim também foram os comportamentos dos generais Tomás Paiva, Richard Nunes, Guido Amin, Valério Stumpf e outros, chamados de melancia pelos radicais bolsonaristas. O Exército não era monolítico, como reconhecem analistas como o historiador Francisco Carlos Teixeira da Silva, professor da UFRJ. Nem seus generais em conjunto estavam à disposição de Bolsonaro para qualquer tipo de aventura. 

Um comentário:

  1. Interessante e informativo. É bom saber que generais foram corajosos e se posicionaram contra as atitudes e tentativas ilegais ou criminosas de Bolsonaro.

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