terça-feira, 17 de outubro de 2023

Míriam Leitão - Inflação na meta após três anos

O Globo

No início deste ano, poucos acreditavam que a inflação poderia ficar na meta. Agora o mercado já vê isto como realidade

Poucos acreditavam até recentemente que a inflação terminaria o ano na meta, mas ontem a mediana do mercado apostou nisso pela primeira vez em três anos. O economista José Roberto Mendonça de Barros vinha dizendo que esse cenário era possível há algum tempo. Agora a previsão da sua consultoria é a de que o IPCA terminará o ano em 4,71%. Perto do teto, mas dentro do espaço de flutuação permitido pelo regime de metas. Esse resultado se deve em grande parte à queda da inflação de alimentos. Do fim do ano passado até o fim deste ano pode ocorrer uma inversão de 17 pontos na inflação da alimentação no domicílio.

— No ano passado, este item terminou com uma inflação de 13,2%. Nossa projeção agora, junto com a MB Agro, é que chegue a dezembro de 2023 com -3,3%, uma virada de 17pp. Isso aí equivale a um abono salarial para as classes C e D. E é justamente a inflação de alimentos no domicílio que é a mais importante —diz Mendonça de Barros.

O Boletim Focus é apenas uma verificação do que está nos modelos dos economistas de mercado financeiro e consultorias. É semanal, portanto, o cenário pode ser outro daqui a sete dias. Mas essa é a primeira vez em mais de três anos que a mediana das projeções do mercado para 2023 é de inflação abaixo do teto da meta. A última vez que houve essa projeção foi em junho de 2020.

Em 2020, a inflação terminou em 4,52%, dentro do espaço de flutuação da meta, mas a alta de alimentos foi de 14%. Em 2021, o IPCA terminou o ano em 10%, para um teto da meta de 5,25%. Em 2022, o governo fez muitos artifícios, como a suspensão dos impostos sobre combustíveis, e conseguiu reduzir a taxa, mesmo assim ficou em 5,79% com o teto em 5%.

José Roberto Mendonça de Barros acha que nem mesmo o El Niño mudará a tendência este ano que é de inflação dentro do espaço de flutuação da meta, um resultado que poucos acreditavam ser possível. Há riscos do desequilíbrio climático, mas Mendonça de Barros avalia que o maior peso será no ano que vem. Essa é a mesma convicção do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC do Rio. Os riscos climáticos não terão efeito este ano.

—Os preços subiram um pouco, mas a alimentação no domicílio está ainda negativa, o IPA ( dos preços do atacado) tem estado negativo, parte pela soja, milho — diz Luiz Roberto.

Por outro lado, a guerra no Oriente Médio é um risco presente, porque pode afetar o petróleo e, por consequência, os combustíveis. A questão, explica Luiz Roberto Cunha, é que a desaceleração da economia mundial reduz essa pressão.

—O envolvimento muito grande numa guerra (dos países produtores) pode jogar o preço do petróleo a US$ 100, mas a desaceleração da economia mundial tem segurado muito o preço. Se tiver um conflito em grande escala a economia terá problemas — afirma Cunha.

A LCA mudou sua projeção para a inflação de 5% para 4,7%, na semana passada, porque tirou de cena a hipótese de um novo reajuste importante da gasolina no último trimestre, já que a defasagem caiu. De acordo com a Abicom, o combustível está com defasagem de apenas 1%. Em 14 de setembro, era de 12%. O economista Fábio Romão, da LCA, que desde o começo do ano previa deflação para o grupo de alimentos e bebidas, projeta queda de -2,6% no item alimentação no domicílio.

José Roberto Mendonça de Barros explica que a inflação deste ano caiu por causa do aumento de produção em diversos produtos. Leite, por exemplo, teve queda de preço, e os produtores culpam as importações. O economista diz que a compra do exterior foi pequena, o que realmente afetou foi que a produção de leite aumentou 10%.

— Para o ano que vem, o que dá para dizer é que não haverá uma ajuda especial vinda da agricultura. Se os preços ficarem mais ou menos como estão vai ser uma maravilha. O plantio vai ser bom, consistente com a safra colhida este ano, mas o potencial de perda pelo clima é bastante significativo. Dá para falar com firmeza que o ano de 2023, do ponto de vista do consumidor, mas também do ponto de vista do produtor, está sendo um ano excepcional no volume, na produtividade, na renda e no benefício ao consumidor. A exceção é o Rio Grande do Sul, que enfrentou seca no começo do ano e enxurrada agora. Por isso, um dos produtos que teve alta de preços e redução da oferta foi o arroz.

O ano de 2023 está no seu último trimestre confirmando um crescimento maior do que o esperado e uma inflação menor do que a prevista.

 

Um comentário: