Folha de S. Paulo
Caminhões do Egito vão poder levar víveres
para palestinos, mas situação seguirá desesperadora
Um grande caminhão-pipa pode carregar 20 mil
litros d'água. Em uma situação de "emergência humanitária", um mínimo
do mínimo de água tratada por pessoa seria de 7,5 litros por dia, segundo
a OMS (Organização
Mundial de Saúde) —para beber e comer, basicamente.
Dada a população de Gaza, estimada em 2,23
milhões, seriam necessárias 835 viagens de caminhões-pipa, por dia, para que as
pessoas tivessem ao menos aquela ração mínima de água para situações de
catástrofe —guerra, terremoto, furacão etc.
Essa aritmética rudimentar do horror serve
para ilustrar um comentário sobre a possibilidade de que caminhões de ajuda
humanitária ora no Egito entrem em Gaza, por permissão
de Israel.
A tripa de terra sitiada tira quase toda sua água de poços e de dessalinização, parados porque a única usina elétrica do território parou, por falta de diesel industrial (que vinha de Israel); o fornecimento da empresa de água de Israel obviamente parou também.
Tira-se água de poços por gambiarras. Segundo
a agência da ONU para refugiados palestinos (UNRWA), a água nos mercados
(estocada) é "muito limitada" e vários abrigos da UNRWA estão a seco.
A agência da ONU diz que, nesta quarta-feira (18), abrigava 513.507 pessoas, um
quarto da população de Gaza.
O governo de Israel disse em nota desta
quarta que "não vai impedir assistência humanitária do Egito, desde que
seja apenas comida, água e remédios para a população civil que vive no sul
da Faixa de Gaza [ou
foge para lá] e desde que esses suprimentos não cheguem ao Hamas".
A nota dizia ainda que não vai permitir ajuda
de Israel para Gaza enquanto os reféns [do Hamas e da Jihad Islâmica] não forem
libertados. Essa concessão se deve ao fato de os Estados Unidos estarem dando
"vasto e vital apoio ao esforço de guerra [de Israel]" e porque Joe
Biden pediu, se lê no comunicado.
De acordo com vídeos, relatos locais, de
agências de notícias e do Crescente Vermelho, haveria de 170 a 200 caminhões
prontos para levar comida, remédio e água por meio da passagem de Rafah, que
fica nos 12,7 km da fronteira de Gaza com o Egito, a única que não é controlada
por Israel. Os pátios dessa passagem, que é uma espécie de alfândega e centro
de triagem de migração, têm disso sido bombardeados, assim como as avenidas que
dão acesso ao local.
De início, 20 caminhões do Egito entrariam em
Gaza, um "teste", disse Biden a jornalistas. Talvez cheguem lá na
sexta-feira (20), em viagens supervisionadas pela ONU. Segundo o governo do
Egito, é preciso consertar as instalações e ruas da passagem. Se funcionar,
estrangeiros também presos em Gaza poderiam sair para o Sinai, segundo o
ministro egípcio do Exterior, Sameh Shoukry, disse à TV Al Arabiya (de uma
empresa de mídia saudita).
Para quem está no desespero ou mesmo à beira
da morte, é algum alívio. Não está claro se Gaza vai receber combustível, que
talvez sirva para religar algum gerador e tirar água de poços. Gaza não tem
eletricidade além da fornecida por geradores de hospitais e serviços públicos,
ainda assim intermitente.
Não haverá "ajuda" que saia de
Israel, diz o governo de Netanyahu enquanto Hamas e Jihad Islâmica não soltarem
os reféns que capturaram durante os massacres em Israel, recorde-se. Não vai
acontecer, é uma aposta quase certa.
Logo, o bloqueio, o sítio, vai durar muito
tempo. Logo, será preciso que os palestinos fujam para o sul de Gaza, em massa.
Logo, será preciso que outros países forneçam ajuda em escala industrial, se é
que a logística permite tamanho fluxo. De qualquer modo, pode ser um meio de
facilitar a invasão da parte norte de Gaza. Quem quiser ajuda vai precisar
viver em um campo de refugiados hiperlotado, ainda à míngua.
Calamidade!
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