Folha de S. Paulo
Atropelos do STF exigem mudanças, mas
congressistas só querem evitar contrapeso incômodo a seu poder
Quando um país desenha sua estrutura
política, está criada a arquitetura institucional que deve equilibrar as
relações de poder. Um presidente pode vetar um projeto de lei, o Congresso pode
derrubar esse veto, e um ministro do STF, indicado
pelo presidente e aprovado pelo Senado,
pode restabelecer tudo como estava.
A ideia é que cada lado tenha ferramentas que sirvam como contrapesos aos demais para impedir abusos e produzir estabilidade. Vez ou outra, alguma autoridade se sentiria prejudicada. Haveria choro e ranger de dentes, mas, ao final, os objetivos estariam garantidos no agregado.
A investida do Congresso para restringir o
poder do STF indica que essa arquitetura se deformou nos últimos tempos e tende
a ficar ainda mais desfigurada. O Senado
aprovou nesta quarta-feira (22) a proposta que limita decisões
individuais e cria regras para dificultar os pedidos de vista, que interrompem
julgamentos no tribunal.
A corte não é inocente. Muitos atropelos
cometidos pelo Supremo tiveram a marca da vontade particular de alguns
ministros, que sequestraram processos em suas gavetas ou soltaram canetadas sem
submetê-las ao crivo do plenário.
De fato, o tribunal estaria melhor se agisse
apenas de forma colegiada. O próprio STF caminhou nessa direção ao estabelecer
prazos para que decisões individuais sejam levadas aos demais ministros. Mas
seria ingenuidade acreditar que o Congresso resolveu melhorar o desenho da
corte num impulso desinteressado.
O Senado só decidiu se mexer depois que o
tribunal acabou com a
farra bilionária das emendas de relator e abriu caminho para
descriminalizar o uso de maconha. Os casos envolveram julgamentos colegiados,
mas deram
combustível para a retaliação dos parlamentares.
Na prática, os congressistas querem
neutralizar um daqueles incômodos contrapesos que limitam seu poder. O
tribunal, por sua vez, quer manter uma autoridade inchada. O mais provável é
que, no fim das contas, o edifício continue torto.
Pois é.
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