O Globo
Governo do território desviou fundos de
agências internacionais e de países árabes para erguer uma infraestrutura
militar
A Irmandade Muçulmana nasceu no Cairo em
1928. O Hamas é
o galho palestino da árvore egípcia. A organização assumiu o controle
incontestável da Faixa de Gaza em 2007,
transformando-a aos poucos em fortaleza militar. A ditadura do Hamas no
território reprime qualquer dissidência política. Diferentemente, porém, dos
regimes de força comuns, é uma ditadura ideológica assentada sobre a
interpretação fundamentalista da sharia (lei islâmica).
Hassan al-Banna, um modesto mestre-escola, criou a Irmandade Muçulmana para reunir as associações religiosas numa organização devotada a superar a cisão entre religião e política e a instaurar um governo islâmico no Egito. Seu discípulo Ahmed Yassin, um filho de refugiados palestinos do Nakba (a “catástrofe” da guerra árabe-israelense de 1948) que se tornou tetraplégico acidentalmente aos 12 anos, fundou na Faixa de Gaza, em 1973, o Mujama al-Islamiya (Centro Islâmico). Da costela da associação religiosa beneficente surgiria, em 1987, o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica).
A carta de fundação do Hamas explicita o
objetivo de destruir Israel por meio de uma jihad, a fim de implantar um Estado
Palestino baseado na sharia em toda a região que se estende do Mediterrâneo ao
Rio Jordão. Os atentados terroristas iniciais da organização pontuaram a
“primeira intifada”, uma revolta civil desarmada nos territórios palestinos
ocupados. O Hamas denunciou o reconhecimento de Israel pela Organização para a
Libertação da Palestina (OLP) e os Acordos de Paz de Oslo de 1993 como
“traição” da causa palestina.
Nas eleições autônomas realizadas em Gaza, em
2006, o Hamas derrotou o Fatah, maior corrente da OLP e espinha dorsal da
Autoridade Palestina (AP). A popularidade da organização decorria tanto de sua
extensa rede de entidades beneficentes quanto da percepção de ineficiência e
corrupção que cercava a AP.
No ano seguinte, os combatentes do Hamas
atacaram os representantes da AP e os expulsaram de Gaza. De lá para cá, ao
longo de confrontos limitados com Israel, o governo do território desviou
fundos de agências internacionais e de países árabes para erguer uma
infraestrutura militar que abrange arsenais de foguetes e uma labiríntica rede
de túneis.
Um relato, colhido por uma ONG de direitos
humanos, sobre o interrogatório de um prisioneiro do Fatah por agentes do Hamas
ilustra trágicos paradoxos. No ápice da sessão de tortura, o interrogador
começa a gritar ameaças histéricas — mas em hebraico, não em árabe. É que o
agente havia sido, ele mesmo, supliciado anos antes numa prisão israelense.
“Palestina livre, do rio até o mar” e “Glória
aos nossos Mártires” — estudantes da Universidade George Washington, na capital
dos Estados Unidos, projetaram sobre a fachada da biblioteca os slogans
preferidos pelo Hamas. Há uma triste ironia no entusiasmo provocado pela
organização entre parcelas da esquerda universitária ocidental. A ditadura do
Hamas prende e sevicia gays, além de praticar sistemática discriminação de
gênero. Segundo a carta do Hamas, o papel principal das mulheres é “manufaturar
os homens”. A participação feminina na força de trabalho em Gaza situa-se ao
redor de 22%, uma das menores do mundo.
Ditaduras comuns usam a repressão para colher
o silêncio. Ditaduras ideológicas buscam outra coisa: adesão. O Hamas nunca
deixou de cultivar seus traços de origem, inspirados em iniciativas da
Irmandade Muçulmana. Sua rede de serviços beneficentes organiza-se em torno da
tríade mesquita/escola/clínicas médicas.
O pessoal que trabalha na rede — imãs (guias
espirituais), professores, médicos, enfermeiros — é selecionado entre adeptos
ou simpatizantes da organização. Muitos deles recebem bolsas de estudos para
períodos em universidades da Arábia Saudita geridas pela seita fundamentalista
puritana Wahab, que mantém uma tensa aliança com a monarquia saudita.
As alas militar e social do Hamas não estão
separadas. Ambas obedecem ao comando da direção política. Israel acusa o Hamas
de usar hospitais e escolas como anteparos para centros militares, fábricas de
foguetes e depósitos de armas. Nem todas essas acusações são propaganda de
guerra.
O texto de Magnoli transforma Gabeira num bocó pacifista. MAM
ResponderExcluirNo último mês, o Hamas matou 31 crianças israelenses, sendo algumas destas mortes exploradas pelos "diplomatas" de Israel comentados ontem por Elio Gaspari. Neste período, Israel matou mais de 4.500 crianças palestinas. Também estes dados não são apenas propaganda de guerra. Mas este tipo de dado não interessa ao colunista que substitui o finado e inigualável Olavo de Carvalho. Ainda assim, Magnoli segue na trilha do seu mestre!
ResponderExcluirMatar uma só criança é imperdoável.
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