Folha de S. Paulo
Imprensa deve ser cuidadosa ao divulgar
material problemático, mas não pode se tornar censora
Em sua coluna do domingo passado, o ombudsman José Henrique Mariante fez algumas reflexões interessantes sobre imagens e não imagens que são utilizadas como propaganda de guerra e como a imprensa deve lidar com isso. O terreno é dos mais pantanosos. O jornalismo precisa equilibrar-se entre objetivos muitas vezes contraditórios. Um exemplo? A imprensa não pode deixar de veicular informações relevantes que tenha conseguido confirmar, por mais chocantes que sejam, mas deve tomar muito cuidado para não se deixar manipular, servindo de megafone para agentes políticos interessados em promover agenda própria.
É relativamente fácil descrever os princípios
que estão em jogo e bem mais difícil resolver os casos concretos que surgem no
dia a dia. Um vídeo-manifesto de teor moralmente questionável (racista ou
terrorista) cujas imagens sejam autênticas deve ser disponibilizado na íntegra
ou sofrer edições para eliminar seu caráter apologético?
Não tenho uma solução pronta para essas
questões, mas tenho algumas ideias. Uma coisa que os jornalistas não têm é
mandato divino para decidir o que é certo e o que é errado. Quando eu assino um
veículo, estou comprando uma curadoria, isto é, delego aos editores a cada vez
mais árdua tarefa de selecionar o que é importante e de organizar esse
material. Mas não dou a eles o direito de determinar o que eu posso ou não
posso ver. Se o jornalista teve condições de assistir a um vídeo altamente
problemático e chegar às conclusões moralmente corretas, não há nenhum motivo
para achar que o leitor não possa fazer o mesmo.
Até o mais infame dos livros, o "Minha
Luta", de Adolf Hitler, embora não deva ser distribuído nas escolas e
estações de metrô, também não pode desaparecer das bibliotecas e outros
registros públicos, porque fazê-lo configuraria censura à história e bloquearia
pesquisas perfeitamente legítimas.
O mundo é um lugar perigoso.
Viver é perigoso,alguém já disse.
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