O Globo
A situação política levou a que o STF ficasse muito poderoso, poderoso em excesso. Como foi a política que levou a isso, a consequência foi a atuação do Supremo ter se politizado.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal
(STF) deveriam entender que é a força do seu colegiado que lhe dá poder para
defender a Constituição, e, em consequência, a democracia. A decisão
monocrática dá força individual a cada um dos ministros, que têm seus
interesses, seus pensamentos, suas tomadas de decisões individuais. O país fica
à mercê da opinião e da posição ideológica de um ministro, muitas vezes
escolhido por um algoritmo, e das circunstâncias que definem o seu voto. Melhor
seria se errassem por último, mas colegiadamente.
O fato é que a situação política levou a que o STF ficasse muito poderoso, poderoso em excesso. Como foi a política que levou a isso, a consequência foi a atuação do Supremo ter se politizado. Toma medidas que não poderia tomar, como o ministro aposentado Ricardo Lewandowski monocraticamente abrir brecha na lei das Estatais para os políticos poderem nomear diretores nas estatais - e ninguém reclamou.
O Supremo foi um guardião da democracia nos
tempos bolsonaristas, mas não pode usar esse argumento para exigir dos demais
poderes uma submissão política. Por que, depois de a crise iniciada com a
votação da PEC que restringe ações do STF, o presidente Lula teve uma conversa
reservada com o presidente do Supremo, ministro Luis Roberto Barroso? Por que
Barroso não foi conversar com o presidente do Senado, e do Congresso, Rodrigo
Pacheco?
Por que o presidente da República dá um
jantar em sua residência oficial e convida dois dos ministros do Supremo mais
visados pelos congressistas, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes? Por que o
Supremo cobra a solidariedade dos políticos, citando as decisões que permitiram
que Lula fosse solto e concorresse à eleição, ou a campanha contra a operação
Lava Jato, como se essas e outras decisões não tivessem sido tomadas de acordo
com a Constituição, mas dependentes da boa vontade do Supremo com os políticos?
Está em curso uma disputa de poder, com o
Executivo no meio deste confronto sem forças para mediar. Não há dúvida de que
o projeto bolsonarista sempre foi enfraquecer o Supremo, que tem poderes para
barrar gestos autoritários de governantes, de qualquer espectro político. Se
esta PEC estivesse em vigor no governo Bolsonaro, ele teria feito muito mais
coisas do que fez, e o STF não poderia segurá-lo.
Mas há exemplos do outro lado. A nomeação do
então ex-presidente Lula para a chefia do Gabinete Civil da presidente Dilma,
que estava às voltas com um processo de impeachment, foi barrada por uma
decisão do ministro Gilmar Mendes. Se não a tivesse vetado naquele momento,
Lula tomava posse e nunca mais ninguém o tirava dali, nem tirava Dilma da
presidência. Recentemente, o presidente da Câmara, Arthur Lira foi livrado de
investigação criminal de corrupção por decisão monocrática de Mendes, e ninguém
se levantou contra.
O poder político que o STF tem, para o bem,
ou para o mal – ele não quer perder, e os outros Poderes querem que perca, pelo
menos em parte. No fundo, esta é a discussão. O ministro Gilmar Mendes na
guerra é bom, encarna a defesa do Supremo, só que não encaminha uma solução.
Quando o senador petista Jacques Wagner votou a favor da PEC, quebrou a ideia
de que ela era simplesmente um golpe de bolsonaristas.
Na verdade, tudo é briga de poder, cada um
querendo acertar o seu lado, especialmente porque, na política brasileira,
ainda profundamente dominada pela corrupção, a função do Supremo de tratar de
questões criminais de membros das instituições com foro privilegiado dá a ele
poderes de vida ou morte sobre os atores políticos.
O maior exemplo é Lula, preso por decisão do
Supremo, e liberado por decisão do mesmo Supremo. Durante os debates sobre o
mensalão, houve a proposta de se criar um Tribunal criminal separado para os
com foro privilegiado, ficando o Supremo com a tarefa de controle
constitucional. Vários ministros foram contra, e a alegação cândida foi de que
os membros da nova Corte teriam um peso político muito maior que o do Supremo.
Seriam superministros.
O Supremo é o Supremo,uai!
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