O Globo
O superávit da balança comercial, puxado
pelas commodities, surpreendeu e pode repetir o bom resultado em 2024. É
preciso pensar a longo prazo nesta força da economia
Uma boa surpresa do ano — mas não a única — foi o aumento de mais de 50% no superávit da balança comercial. Foi US$ 62 bilhões em 2022, pode fechar perto de US$ 100 bilhões este ano. Há duas grandes questões. Será um fracasso se em 2024 o ano não for como este que passou? A outra dúvida é se será possível manter nos próximos anos essa tendência de o comércio exterior ser uma das forças do crescimento econômico. As perguntas têm boas respostas de dois bons economistas. O ex-secretário do Tesouro Mansueto Almeida, do BTG Pactual, diz que continuará alto, apesar da queda prevista no ano que vem. O ex-secretário de Comércio Exterior José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados, acredita que a permanência dos grandes saldos comerciais pode se estender por vários anos.
—Esse saldo comercial de mais de US$ 90
bilhões — temos US$ 96 bilhões de projeção, mas pode arredondar para a faixa
dos US$ 100 bilhões—, achamos que isso vai prevalecer nos próximos cinco anos,
apesar de no ano que vem ser um pouco mais baixo porque a safra agrícola será
menor — diz Mendonça de Barros.
— O Brasil é exportador de commodities e
quando os preços sobem é difícil o Brasil ir mal. Os preços caíram, mas houve
uma supersafra de grãos que ajudou na exportação. No começo do ano se achava
que a balança deveria chegar a US$ 75 bilhões, mas a gente está indo para
fechar o ano com saldo entre US$ 95 bilhões e US$ 100 bilhões, mais de 50% de
alta. No ano de 2024, vai cair para US$ 80 bilhões, que será o segundo maior da
história do Brasil — calcula Mansueto.
O resultado bom do comércio é, claro, devido
às commodities, mas pode estar havendo uma evolução nisso também. José Roberto
afirma que a alta do saldo não é um evento casual. Teve uma casualidade que foi
a supersafra. Mas as empresas têm investido mais em tecnologia e embutido maior
valor agregado, dando mais competitividade aos produtos que o Brasil exporta,
tanto na área agrícola quanto na área mineral. A energia mais limpa que em
outros países pode descarbonizar produtos de exportação, aumentando a atratividade
do produto brasileiro.
Há problemas no meio do caminho. Alguns
imediatos. O El Niño vai encolher a safra. José Roberto diz que a intensidade
desse evento climático afetará sem dúvida o agronegócio, reduzindo a produção
em algumas áreas do país. Mas também aqui, alertam os dois economistas, mesmo
com essa queda, será a segunda maior safra da história. A primeira foi este ano
com 317 milhões de toneladas. Mendonça de Barros conta onde ela vai encolher no
ano que vem.
—O El Niño poderoso fará o país perder um
pouco em muitos lugares. A perda absoluta já está acontecendo no Sul, que é
característica do El Niño, chuva demais nesta região. No Rio Grande do Sul e em
Santa Catarina, o retorno da chuva agora na época do plantio provocará uma
perda enorme no trigo, em qualidade e volume. Mas há prejuízos espalhados pela
seca no Norte e Nordeste e pela perda, em outros lugares, da janela de plantio
de determinadas safras, como algodão ou milho — calcula Mendonça de Barros, com
base nos dados do MBAgro.
O efeito positivo para o Brasil, da
abundância da safra e do saldo, foi recolhido no ano, lembra Mansueto, em queda
da inflação e do câmbio.
—Isso é muito positivo porque até outubro o
país não teve entrada de dinheiro de fora para aplicação no mercado financeiro,
por causa dos juros altos no exterior. Não teve muito fluxo para o mercado
brasileiro, mas o saldo foi tão grande que sustentou o câmbio. O dólar está num
nível mais baixo do que estava no começo do ano.
Mesmo se não for apenas um ano, é preciso
pensar com visão mais longa para essa força da economia brasileira. O Brasil, e
isso os bons economistas concordam, precisa de uma estratégia. Para continuar
nesse mundo exportando commodities, elas têm que ser mais sofisticadas, ter
maior valor agregado, e sua produção não poderá ser predatória. A mineração não
pode provocar as tragédias sociais e ambientais que já provocou no país, a era
do petróleo entrará em outra lógica agora, que inclui a forma de produção e o
ritmo de extração. O agronegócio, além de modernizar sua produção, o que tem
feito, tem que atualizar seus valores. A palavra “sustentável” tinha um
significado diferente na economia e na ecologia. Mas agora tudo se unificou. Só
será sustentado o desempenho econômico que for sustentável.
Excelente!
ResponderExcluirÉ verdade.
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