O Globo
Há diversos experimentos, especialmente nos
Estados Unidos, para tentar superar a polarização política e fazer com que o
resultado das urnas espelhe realmente o desejo amplo dos eleitores.
Num momento em que vivemos uma realidade
política radicalizada, que não dá espaço para a expressão de um centro
político, calcificando posições extremas, buscam-se caminhos para impedir que o
poder do dinheiro, ou de promessas populistas, formem uma “maioria aparente”.
Na semana passada escrevi que é uma falácia dizer que a composição da Câmara
representa a sociedade brasileira, contrariando uma tese amplamente divulgada
para justificar atitudes de deputados, e mesmo resultados de votações.
Há diversos experimentos, especialmente nos Estados Unidos, para tentar superar a polarização política e fazer com que o resultado das urnas espelhe realmente o desejo amplo dos eleitores. Ronaldo Lemos, especialista em tecnologia do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio), lembrou outro dia que a mudança nos critérios de votação para o Big Brother Brasil (BBB) mostra que qualquer eleição pode ser influenciada por diversos fatores que desvirtuam a vontade real da maioria.
Dois desses experimentos, sobre os quais já
escrevi em 2018 — as mudanças custam a acontecer —, já são usados em
localidades nos Estados Unidos para definição de orçamento público ou mesmo
escolha de candidatos. Um dos tipos testado é o voto ranqueado (ranked choice
voting), em que os eleitores escolhem quantos candidatos quiserem, dando-lhes
uma ordem de preferência.
Candidatos que obtêm mais primeiras escolhas,
mas também aparecem como segunda ou terceira opção dos eleitores, têm melhor
pontuação, maior chance de se eleger. Se um candidato receber a maioria de
votos de primeira escolha, está eleito. Caso contrário, o candidato com menor
número de primeiras escolhas é descartado, e seus votos redistribuídos. O
processo continua até que algum candidato obtenha maioria, como já ocorreu em
San Francisco, nos Estados Unidos.
Os defensores do voto ranqueado acham que ele
muda as campanhas e a própria eleição em várias medidas, além de incentivar a
alternância de poder. Os eleitores também têm menos estímulo para não votar,
pois podem dar sua primeira escolha a seu candidato preferido, mesmo que ele
tenha pouca chance de ganhar, mas distribuir os demais votos estrategicamente
para barrar um candidato ou fazer com que sua segunda escolha saia beneficiada.
Outra vantagem é desencorajar a campanha
negativa, pois os candidatos pretendem obter o segundo ou terceiro votos do
eleitor. Várias cidades dos Estados Unidos, como Minneapolis, San Francisco e
Santa Fé, já adotam o ranqueamento, permitindo que os eleitores, em vez de
votar contra alguém, possam votar naqueles que realmente refletem seu desejo,
acabando com o voto útil, a escolha do “mal menor”, muito em voga no Brasil.
Outro tipo de voto tem um nome péssimo:
quadrático. Procura dar ao eleitor a condição de exprimir a intensidade da sua
preferência, que o levou a votar neste e não naquele candidato ou proposta.
Cada eleitor recebe um determinado número de “créditos” que deve utilizar para
influenciar a aprovação ou desaprovação de determinada decisão.
Se quiser aumentar seu poder de influência, o
eleitor pode “comprar” votos adicionais. O “preço” de cada voto adicional é
determinado por regras definidas pela autoridade eleitoral e aumenta à medida
que o eleitor “compra” mais votos. Ele pode carregar todo o seu crédito num
candidato ou assunto, mas sua influência é reduzida por critérios matemáticos
que envolvem o quadrado do número de votos (daí o nome “voto quadrático”).
A ideia é reduzir a possibilidade de que uma
minoria se imponha artificialmente. Um eleitor que seja militante a favor do
casamento gay poderia gastar todo o seu estoque de votos a favor, ou até
“comprar” mais votos de eleitores que não se importem muito com a questão. O
mesmo podem fazer os que são militantemente contra. O ITS Rio e o
RadicalxChange dos Estados Unidos, patrocinados pela Fundação Rockefeller, já
testaram o voto quadrático tanto no Brasil, em Gramado (RS), quanto em Denver,
no Colorado.
Muito do que relato acima sobre o
funcionamento dos votos é repetição literal do que escrevi em 2018.
Foi zoado e zombado na época,lembro bem.
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