quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

William Waack - Assim somos?

O Estado de S. Paulo

O Equador é o mais recente exemplo da expansão do crime em países latino-americanos

Países latino-americanos são muito diferentes entre si e muito similares em pelo menos dois pontos. Não conseguem frear a expansão do crime organizado. Não conseguem promover de forma sustentável a expansão da economia.

A relação entre uma coisa e outra não deve ser estabelecida como causalidade mecânica (do tipo “menos prosperidade na economia significa mais prosperidade do crime organizado”). A complexidade da situação está no fato de serem comuns a esse enorme conjunto de países o desarranjo institucional e a incapacidade das diversas sociedades de se organizarem em torno de desafios percebidos.

Se pobreza e desigualdade foram sempre identificadas como graves problemas “estruturais” que o baixo crescimento relativo das economias não consegue resolver, agora acrescente-se o crime a essas mazelas. Segurança pública virou elemento importante em eleições recentes até em países como Chile e Argentina, que exibiam taxas de criminalidade mais “aceitáveis”.

Os atuais eventos no Equador são mais um exemplo da durabilidade, amplitude e penetração do crime organizado. E evidenciam como um “pico” de violência (exacerbado pela força de imagens) se transforma rapidamente em ameaça percebida ao próprio Estado. É como se uma grave doença “de repente” se tornasse conhecida, e então vem o medo dela.

Na verdade, é longa e se espalha por quase toda a região (há pequenas exceções, como o Uruguai) a história de episódios de enfrentamento aberto entre crime organizado e a autoridade estatal. Basta lembrar a guerra de Pablo Escobar na Colômbia nos anos 90, o Sendero Luminoso no Peru, a sucessão de vários cartéis do narcotráfico e sua contestação de governos mexicanos, a dissolução da política na América Central trazida pelas “maras” e, não por último, a ampliação das facções criminosas e milícias no Brasil.

Há exemplos também bemsucedidos de recuperação da autoridade do Estado – o mais famoso deles é o da cidade de Medellín, na Colômbia. Mas permanecem como eventos “isolados” numa paisagem de incapacidade generalizada de sociedades de países latinoamericanos de se mobilizarem frente a fenômenos – como economias de crescimento insuficiente e crime organizado de crescimento exuberante – que, no fundo, corroem brutalmente essas mesmas sociedades.

O problema, diria uma antiga escola de historiadores, é cultural no sentido mais amplo da palavra. Cultura entendida como a intrincada soma de tudo: história, geografia, economia, política, sociedade. É assim que somos?

 

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