terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Eliane Cantanhêde - Taí, uma guerra transparente

O Estado de S. Paulo

Toffoli dobra a aposta e leva o escândalo da suspensão de multas à mídia internacional

O ministro do STF Dias Toffoli deu de ombros para a repercussão fortemente negativa à suspensão do pagamento de multas bilionárias da J&F e da Novonor/Odebrecht por corrupção e dobrou a aposta com uma briga para lá de audaciosa: contra a Transparência Internacional (TI), ONG respeitada no mundo inteiro por seu monitoramento justamente da... corrupção. Um escândalo que parecia doméstico agora é internacional.

No Índice de Percepção da Corrupção de 2023, feito pela TI, o Brasil caiu dez posições, para o pior desempenho desde 1995, em 104º lugar entre 180 países. O relatório, que atribui a culpa ao governo Jair Bolsonaro e ao primeiro ano do terceiro mandato de Lula, cita Dias Toffoli nove vezes.

“Talvez os exemplos mais graves tenham sido as ações do ministro Dias Toffoli, que decidiu, monocraticamente e com fortes evidências de conflitos de interesses e outras heterodoxias processuais, sobre demandas que tiveram imenso impacto sobre a impunidade de casos de corrupção que figuram entre os maiores da história mundial”, acusa o documento. Os “conflitos de interesses” seriam porque o ministro foi citado nas delações premiadas de Marcelo Odebrecht, e sua mulher, advogada, atua na defesa do grupo J&F.

Toffoli reagiu usando a Procuradoria-Geral da República (PGR) para investigar a TI por suposta apropriação de recursos recuperados pela Lava Jato.

“Ao invés da destinação dos recursos ser orientada pelas normas legais e orçamentárias, destinava-se a uma instituição privada, ainda mais alienígena e com sede em Berlim”, acusou, referindo-se à ONG.

Seguiu-se uma intensa troca de notas, enquanto vinha à tona uma informação constrangedora para Toffoli e importante para a Transparência Internacional: a PGR já tinha analisado as suspeitas de eventuais desvios da TI e concluído que não havia nada de errado. A ONG apenas teria dado consultoria sobre a destinação dos recursos da Lava Jato para projetos e entidades de combate à corrupção.

As decisões de Toffoli, escandalosas desde o início, só pioram. Têm reflexos nos acordos de leniência das duas empresas dentro e fora do Brasil, abriram a porteira para a OAS e outras empresas também pedirem anulação de multas e acabam de virar uma guerra com a Transparência Internacional, despertando a atenção da mídia mundial.

Além disso, o escândalo ocorre na volta do Congresso após o recesso, com as armas voltadas não só para o Executivo, mas principalmente para o Judiciário. E não é que um dos projetos prioritários é para limitar decisões monocráticas, como foram as de Toffoli? Lula e o governo estão calados. Até quando?

 

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