terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

Joel Pinheiro da Fonseca – Agradando o Hamas

Folha de S. Paulo

Fala de Lula nos isola do mundo democrático e fortalece a oposição no Brasil

A fala do presidente caiu como uma bomba: "O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu: quando o Hitler resolveu matar os judeus".

Não sei se era sua intenção, mas foi o que Lula conseguiu: esfriou ainda mais as relações do Brasil com o mundo democrático e fez com que o assunto central do debate público brasileiro nas últimas 24 horas voltasse a ser o conflito Israel-Palestina.

E com razão. A comparação é esdrúxula. A campanha de bombardeios israelenses na Faixa de Gaza é desproporcional, deve ser publicamente denunciada —como tantos bombardeios em tantas guerras presentes e passadas—, mas genocídio não é.

Israel está numa campanha de bombardeios incessantes contra um inimigo que o atacou, sempre tem combatentes como alvos e tem tomado medidas para reduzir a inevitável morte de civis. Ou ao menos é o que alega, sem que nenhum daqueles que acusam-no de genocídio —inclusive África do Sul e Brasil— tenham até agora tentado refutar. O genocídio nazista, ademais, teve características únicas —como a organização industrial do morticínio em massa— que o tornaram ainda mais monstruoso.

Para completar, é evidente que usar a comparação com Hitler para o Estado de Israel seria sentido como ofensivo pelos israelenses e para muitos judeus por todo o mundo. Lula conseguiu, com uma fala apenas, ser declarado "persona non grata" em Israel e receber os elogios efusivos de ninguém menos que o Hamas, grupo terrorista que comanda a Faixa de Gaza e quer exterminar Israel.

Supostamente, a linha-mestra da nossa política exterior era manter a neutralidade pragmática, dialogar com todos. Não está parecendo muito neutro agora. Será que Lula e seus assessores internacionais querem exercer o papel de mediadores no conflito Israel-Palestina, quem sabe selando a paz quando tantos outros falharam? Esperam ser mais bem-sucedidos nisso do que foram na mediação entre Rússia e Ucrânia?

Janja e Celso Amorim adoraram a fala de Lula. O chanceler israelense chamou-a de "ataque antissemita". Eu fico com o diagnóstico do diplomata francês Gérard Araud —ex-embaixador em Washington— que definiu assim a posição do Brasil na política internacional: "Um terceiro mundismo tão caricatural que defende até a Coreia do Norte". Verdade seja dita, Lula e Amorim ainda não chegaram a isso. Ainda.

Se no mundo a reação não foi boa, aqui no Brasil foi péssima —para o governo. Segundo dados coletados pela agência de pesquisa Quaest, 90% das menções sobre o assunto —que tomou as redes nos últimos dois dias— foram negativa para o presidente. A oposição deitou e rolou, falou até em impeachment (é claro que não acontecerá), e Bolsonaro deve estar até agora agradecendo Lula por ter tirado a trama golpista dos holofotes.

Lula venceu as eleições por uma fina margem. Nessa polarização de dois grandes blocos, o pequeno contingente de liberais e independentes acabou sendo o fiel da balança que lhe garantiu a vitória. Ao se indispor com a maioria para alegrar uma base radicalizada que votará na esquerda de qualquer maneira, Lula cava um pouquinho mais a rejeição junto aos moderados. Se da oposição surgir alguma liderança que não atente contra a democracia como fez Bolsonaro, esse tipo de posicionamento irresponsável pode cobrar um alto preço lá na frente.

 

5 comentários:

  1. O texto é até razoável, mas o título é pra lá de infeliz, tanto que nem foi quase desenvolvido na coluna. Mas como o objetivo do colunista é chamar a atenção, polemizar, escolheu-o. Lula pode ter alguns motivos pra ter feito sua manifestação (ou até não tê-los), mas agradar o Hamas certamente não é um deles.

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  2. Daniel é petralha; como tal, maníaco. O problema do maníaco, quando lê,
    é que interpreta segundo a sua psiquê, e não o escrito. O título é "Agradando o Hamas", e o maniaco indignado interpretou como "Lula discursou para agradar o Hamas"! Então, correu pra ler o texto e não entendeu nada.O que o missivista disse foi que o discurso de Lula agradou sobremaneira o Hamas; tanto é verdade, que os terroristas agradeceram oficialmente. Algo inédito e, até agora, único!

    Dito isso, é preciso acabar com esse papo furado de bombardeio desproporcional; ou então que se diga qual seria o nº proporcional. Por exemplo, no Estadão, um vagabundo com sobrenome árabe teve a ousadia de me dizer que seria 1:1. E detalhou: um árabe-muçulmano p/ um judeu-israelense. Percebeu a manha? Não disse palestino!!! Afinal, são centenas de milhões de árabes-muçulmanos, para milhões de judeu-israelenses. Se Israel seguir essa lógica, ele acaba. Mas se trocar por palestino, a Palestina acaba e o problema também.

    Então, até por isso mesmo,tem que bombardear feroz.

    MAM

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  3. A questão é simples: por que tal título se isto quase não aparece no texto? O título simplesmente não reflete o conteúdo (razoável) da coluna. Se o colunista considerasse isto importante (agrado de Lula ao Hamas) deveria ter argumentado mais sobre isto e explorado tal tema no seu texto. O colunista faz diversas suposições sobre a política externa brasileira, e sobre outros assuntos, mas NADA APROFUNDA sobre a relação (quase inexistente) entre Hamas e Lula, exatamente o que ele DESTACA no seu título!
    Por outro lado, Míriam Leitão na sua coluna de hoje (mostrada neste blog) faz uma análise profunda e muito equilibrada da questão, o que me fez comentar e comparar (lá) a coluna dela (densa e embasada) e esta fraquinha e muito opinativa do Joel. É lógico que ele tem todo o direito de opinar, mas dum colunista PROFISSIONAL eu espero MUITO MAIS! Acho que Míriam Leitão deu um baile no franguinho...

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  4. Concluindo: o título é tipicamente APELATIVO, como vários do Magnoli! O Hamas só é mencionado no final do quinto parágrafo, e nada sobre ele aparece nos outros 7 parágrafos. Joel não consegue nem dar um título decente pra sua coluna!

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  5. Estão fazendo tempestade em copo d'água com a fala do Lula,a tempestade existe lá na faixa de Gaza.

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