sábado, 10 de fevereiro de 2024

Luiz Gonzaga Belluzzo* - Guido Mantega e tropeços da mídia

CartaCapital

Os dados não confirmam a narrativa dos mercadistas, mas atestam o êxito da gestão do ex-ministro

Sábado, 27 de janeiro, entrego-me à leitura do jornal Folha de S.Paulo. A manchete de primeira página anunciava: “Reação negativa faz Lula desistir de ter Mantega na Vale”. À estrondosa manchete seguiam-se comentários dos jornalistas incumbidos de produzir a matéria.

Nessas deambulações, os profissionais da mídia oferecem aos leitores considerações a respeito das circunstâncias que cercaram as desistências do presidente Lula e do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Lá pelas tantas, o leitor é abalroado por uma informação que não se coaduna com os fatos.

Vamos a um excerto do texto exibido pela Folha: “Após a reação negativa do mercado financeiro e do Conselho da Vale à pressão do presidente Lula para colocar Guido Mantega à frente da mineradora, o ex-ministro da Fazenda decidiu, em conjunto com o presidente, que não irá buscar a nomeação”.

Mais adiante os gentis jornalistas da Folha tropeçam nas armadilhas dos preconceitos espargidos pelos finórios dos mercados financeiros: “O ex-ministro foi um dos responsáveis pela política econômica dos anos Dilma Rousseff (PT, ­2010-2016) no poder, que levou à recessão”.

Certamente movido por opiniões preconceituosas de muitos de seus articulistas de então, o jornal permitiu-se divulgar que o desastre de 2015-2016 contou com a participação de Guido Mantega.

Mantega despediu-se do governo ­Dilma em 2014, substituído pelo economista Joaquim Levy. Ostentando os sábios ensinamentos da Escola de Chicago, Levy empenhou seus saberes no “ajustamento da economia”.

Na eleição de 2014, os mercados e seus súditos na academia e na mídia proclamavam o “desastre” dos governos Lula e ­Dilma. As desgraças, diziam eles, foram incitadas por um ímpeto gastador que teria destroçado as finanças públicas.

Os “especialistas mercadistas” que proclamavam as desgraças têm o hábito de enfrentar as formulações de seus êmulos desenvolvimentistas com increpações muito peculiares. Acusam os adversários de desconsideração com os dados e utilização de “narrativas”.

Vamos aos dados: Ver abaixo

Tenho a impressão de que os dados não confirmam a narrativa dos mercadistas, mas afirmam duas constatações. Primeiro, a gestão de Guido ­Mantega no Ministério da Fazenda foi exitosa: elevada taxa média de crescimento do PIB e Superávit Primário, o que não atesta gastança, mas afirma ensinamentos elementares de macroeconomia.

Produzido pela crise do subprime, o choque externo de 2009 foi enfrentado por um conjunto de medidas anticíclicas. A elevação do gasto foi movida, sobretudo, pelo impulso dos financiamentos do BNDES. Capitalizado (sic) pelos títulos do Tesouro, o banco disparou o crédito direcionado e suscitou a elevação da Formação Bruta de Capital para 21% do PIB.

As tabelas acima também informam uma desaceleração do crescimento no período 2011-2014, quando as crises na Zona do Euro deflagraram temores e incertezas na economia internacional.

A encrenca de 2015-2016 foi produzida, certamente, pela “narrativa” que afirmava o excesso de gasto no período ­Lula-Dilma. Um “excesso” curioso e singular do ponto de vista da macroeconomia elementar. O comportamento abusivo do gasto provocou um excelente desempenho do resultado fiscal, expresso nos elevados superávits primários (também declinaram ao longo da desaceleração da economia).

Vitoriosa na eleição de 2014, Dilma sucumbiu ao terrorismo dos gestores e economistas acasalados na Faria Lima e permitiu que Joaquim Levy produzisse uma depressão econômica. O ajuste de Levy fez a economia brasileira desabar 3,8% em 2015 e 3,3% em 2016.

Em 2017, escrevi aqui com Gabriel ­Galípolo que, “após o crescimento de 0,5% em 2014, a economia do País descambou para dois anos de depressão. A trapalhada de 2015-2016 perpetrou a interação entre um choque de tarifas, a subida da taxa de juros, a desvalorização do real e o corte dos investimentos públicos. 

*Publicado na edição n° 1297 de CartaCapital, em 14 de fevereiro de 2024.




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