segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Maria Cristina Fernandes - Ato de Bolsonaro na Paulista traz disputa por espólio e vírus resistente do negacionismo

Valor Econômico

No alto do pódio da disputa pelo espólio ficou ex-primeira-dama Michele Bolsonaro

ato em que Jair Bolsonaro carregou nas tintas de mártir, pedindo anistia para os presos do 8 de janeiro e reconhecendo a minuta golpista que poderá levá-lo à prisão, evidenciou tanto a disputa por seu espólio quanto a tentativa do ex-presidente de pegar carona numa “pacificação”, capaz de “passar uma borracha no passado”.

No alto do pódio da disputa pelo espólio ficou ex-primeira-dama Michele Bolsonaro com sua fala emocionada de fé e família para enfrentar a injustiça, ante um público mais velho, afluente e a exibir símbolos evangélicos, como as bandeiras de Israel e do leão de judá (metáfora bíblica de Cristo), vendidas por R$ 60.

Dos quatro governadores presentes – Jorginho Mello (SC), Romeu Zema (MG), Tarcísio Freitas (SP) e Ronaldo Caiado (GO) – o último é o mais focado. Sua determinação não deixa dúvidas de que a direita vai se dividir.

Tarcísio, com quem Bolsonaro e Michelle almoçaram, no Palácio do Bandeirantes, foi o único a quem foi franqueado o microfone para saudar o legado do ex-presidente. Sua Polícia Militar, que sofreu um expurgo da ala resistente ao endurecimento da segurança pública, ganhou saudação especial no discurso do ex-presidente.

Entusiasta da primeira dama, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, subiu ao palanque antes de Bolsonaro chegar, em cumprimento à decisão judicial que impede seu encontro, para agradecer pelos votos que transformaram o PL no “maior partido do Brasil”.

Nenhum discurso foi mais agressivo do que o do pastor Silas Malafaia, promotor do evento. Alvejou o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, “juiz que tem lado”, e, dirigindo-se a Bolsonaro, antecipou a estratégia: “Se eles te prenderem você vai sair de lá exaltado”.

Ao sair em defesa de Valdemar Costa Neto pela multa ao seu partido, penalidade que não havia sido aplicada ao PSDB, “partido de Alexandre de Moraes”, que também questionou o resultado eleitoral em 2014, Malafaia exibiu a dobradinha com o presidente do PL em defesa do casal Bolsonaro.

Bolsonaro ganhou a foto de multidão que desejava para mostrar que não está isolado. Precisa dela tanto para evitar que sua bancada no Congresso seja atraída pelo governismo quanto para impressionar o Supremo com o que seria a resistência à sua prisão. Uma das camisetas expostas à venda na avenida trazia a frase “Não tenhais medo” sobre as fotos de Cristo e da bandeira brasileira.

Não mudou em nada o cerco da Polícia Federal sobre si, mas levou de volta às ruas o eleitor verde-amarelo que estava acabrunhado. Da evangélica M.S., que desceu a escada rolante do metrô com as mãos em prece pelo “senhor que há de nos proteger” ao empresário de telemarketing S.I., que saiu de Belo Horizonte e o fará tantas vezes Bolsonaro os convocar.

São eleitores que acreditam em infiltração petista no vandalismo do 8 de Janeiro, sustentam que a urna foi fraudada e ignoram qualquer avanço deste governo, ao qual atribuem queda nas suas vendas, preços em disparada e a volta da corrupção. Uma multidão impregnada pelo vírus do negacionismo, que volta com uma cepa de contágio amplo e resistente.

 

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