segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

PGR mostra que plenário deve rever decisões de Toffoli

O Globo

Recurso de Gonet traz argumentos convincentes para que caso Odebrecht seja levado aos 11 ministros do STF

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, apresentou na semana passada recurso contra a decisão individual provisória do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender o pagamento de multas da Odebrecht (atual Novonor), previstas no acordo de leniência firmado em 2016 na Operação Lava-Jato. Gonet pede que a decisão seja reconsiderada por Toffoli ou avaliada com urgência pelos 11 ministros no plenário do STF, e não pela Segunda Turma, que reúne apenas cinco e julga os casos da Lava-Jato.

A Procuradoria-Geral da República(PGR) apresenta duas boas razões em seu recurso. Primeiro, aponta semelhança do caso com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1.051, que pede ampla suspensão de multas e já é analisada no plenário, sob a relatoria do ministro André Mendonça. Segundo, diz Gonet, não falta “relevância singular” ao tema, dada a importância dos acordos da Odebrecht no contexto de combate à corrupção.

Quando suspendeu os pagamentos da Odebrecht no fim de janeiro, Toffoli afirmou que a medida era necessária porque a defesa precisava ter acesso e tempo para analisar as mensagens entre o então juiz Sergio Moro e os procuradores de Curitiba, obtidas ilegalmente e investigadas na Operação Spoofing. A suspeita, segundo Toffoli, era ter havido pressão ilegal para o fechamento dos acordos de leniência. Havia, nas palavras dele, “dúvida razoável sobre o requisito da voluntariedade”. Gonet demonstra que o pedido não fazia sentido, pois a Odebrecht está em posse das mensagens desde setembro.

A PGR também rebate a tese da coação. Lembra que o grupo empresarial era um dos mais bem-sucedidos do país, auxiliado pelos melhores escritórios de advocacia. “Se viam ameaças de medidas constritivas injustas, certamente que ouviriam das bancas de renomados advogados as perspectivas de superação e correção de que a ordem jurídica dispõe”, escreve Gonet no recurso. Noutros trechos, reconhece que houve comportamentos censuráveis de agentes públicos, mas nega intimidação irresistível. Lembra também que sempre há pressão nesse tipo de situação.

No pedido de suspensão do pagamento das multas, a Odebrecht solicitou a extensão de uma decisão de 2020 do STF. Na ocasião, a Corte permitiu que o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva obtivesse acesso a provas do acordo de leniência da Odebrecht. Na visão de Gonet, falta pertinência à tentativa de vincular os dois casos. A intenção da defesa de Lula era conhecer os dados nos autos. A da Odebrecht agora é “encontrar subsídios que lhe socorram o intuito de impugnar o pacto”. O recurso da PGR lembra que a Odebrecht não argumenta ter mentido ao denunciar casos de corrupção. “A prática de crimes foi efetivamente reconhecida pela empresa e por seus executivos, em confissões e com entrega de documentos comprobatórios.”

Desde que assumiu a PGR, Gonet tem sido ágil nos recursos a decisões individuais de Toffoli em favor de empresas envolvidas em escândalos de corrupção. Já recorreu contra liminar que suspendeu o pagamento de multa de R$ 10,3 bilhões prevista no acordo de leniência do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, no âmbito da Operação Greenfield. As inconsistências apontadas por Gonet nas decisões de Toffoli deixam cada vez mais clara a urgência de os temas serem avaliados pelo plenário completo do STF.

Representação feminina em câmaras municipais traduz limite das cotas

O Globo

Apesar de lei exigir um mínimo de 30% de candidatas, nas capitais elas somam apenas 18% das vereadoras

Reportagem recente do GLOBO constatou a dificuldade de consolidar a representação das mulheres no Legislativo. Em nenhuma das câmaras municipais das 26 capitais brasileiras a bancada feminina chega a ocupar um terço dos assentos, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ao todo , elas somam 18% das vereadoras nessas cidades e 16% no Brasil todo. Isso apesar de a legislação obrigar os partidos a preencher uma cota de no mínimo 30% das candidaturas com mulheres.

Na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, as mulheres ocupam 30,5% das vagas, índice mais alto do país. O segundo lugar fica com Belo Horizonte, com 26,8%, ou 11 de 41 vereadores. São Paulo tem o maior número absoluto de vereadoras — 12, ou 23,6% do total. No Rio são dez, ou 19,6%. Em João Pessoa, Paraíba, apenas uma, ou 3,7%, percentual mais baixo em todo o país. Os índices mais altos de participação feminina estão no Sudeste e no Sul, os mais baixos no Norte e Nordeste.

A dificuldade de aumentar a representatividade feminina revela que a política de cotas nas candidaturas não tem sido suficiente. É certo que a cota também passou a ser financeira — por emenda constitucional, 30% do fundo eleitoral do partido precisa ser destinado a candidatas. Mas o incentivo se tornou nas últimas eleições uma usina de fraudes.

Ministério Público e Justiça eleitorais costumam impugnar diversas candidaturas falsas, lançadas apenas para driblar a lei. As candidatas laranjas têm algumas características comuns. Não fazem campanha, recebem votação baixíssima, e o dinheiro que recebem do fundo eleitoral costuma ser repassado a outros candidatos. Escândalos do tipo têm se repetido a cada eleição. É preciso tornar a fiscalização mais rigorosa e as punições mais duras.

No Brasil, só em 1932 o direito de votar foi dado à mulher. Ainda assim, mediante certas condições: ser casada, autorizada pelo marido e, se viúva ou solteira, ter condição de comprovar renda própria. Dois anos depois as restrições foram suspensas. O voto das mulheres só se tornou obrigatório em 1946, como o dos homens.

O que falta para ampliar a presença das mulheres na política? Não há fórmula pronta. Os limites revelados pelas cotas demonstram que, além dos incentivos legais, os partidos precisam ir a campo defendendo em seus programas causas que interessem à mulher, estimulando a militância partidária delas e atraindo jovens mulheres para seus quadros. Mas o mais importante vale para homens também: os partidos conquistarão maior adesão se tiverem legitimidade e souberem apresentar propostas com valor para a sociedade.

Novos conflitos aceleram a corrida armamentista

Valor Econômico

Guerra na Ucrânia aumentou os gastos globais com defesa em 9% no ano passado para um recorde de US$ 2,2 trilhões, o maior valor desde o fim da Segunda Guerra Mundial

A Rússia reforçou a exibição de seus músculos nas vésperas da reunião da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), realizada na semana passada, em Bruxelas. No dia do encontro, na quinta-feira, desfechou ataque maciço de mísseis na Ucrânia. Na semana anterior, havia disparado contra o país um míssil que Kiev acredita ser o hipersônico Zircon. Seria a primeira vez que esse tipo de míssil teria sido utilizado na guerra, próxima de completar dois anos. Por causa da velocidade, o Zircon seria praticamente imune às melhores defesas ocidentais, como o sistema Patriot, de acordo com a Missile Defense Advocacy Alliance (MDAA).

Outros motivos tornaram essa reunião da Otan importante. Ela ocorreu em um momento em que o Ocidente se esforça para obter recursos para apoiar a Ucrânia. Além disso, a organização sofre novas ameaças do ex-presidente americano Donald Trump. Virtual candidato do Partido Republicano, Trump disse que, caso seja eleito neste ano, não protegeria de um eventual ataque da Rússia membros da Otan que estivessem em atraso com suas contribuições para a aliança - os países têm a meta de destinar 2% do PIB com despesas militares, nível não atingido por vários membros do grupo. Em evento de campanha, Trump chegou a sugerir que incentivará a Rússia a “fazer o que quiser com eles”.

A Casa Branca e até alguns republicanos criticaram Trump por cogitar não se opor militarmente à Rússia em um eventual conflito contra o Ocidente. Com essas declarações, o ex-presidente americano coloca em xeque um ponto crucial do tratado, o de que a agressão a um membro da aliança é considerada um ataque a todos os integrantes, um fator que tem sido fundamental para dissuadir a Rússia de entrar em guerra com países da Otan. Na sexta-feira, a morte do dissidente Alexei Navalny, numa prisão russa na região ártica, após ele ter ficado quase três semanas com o paradeiro desconhecido, deixou evidentes mais uma vez os graves problemas do regime de Vladimir Putin e sua máquina de repressão.

Os EUA lideram os gastos globais com defesa, segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, na sigla em inglês), de Londres, que acaba de divulgar o Balanço Militar do ano passado. Em 2023, o país canalizou pouco mais de 3% do PIB para essa finalidade. Com isso, dominam 41% do gasto militar total do planeta, seguidos pela China, com 10%, e a Rússia, com 5%.

Em resposta a Trump, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, afirmou pouco antes do início da reunião que o bloco europeu aumentou em 11% o gasto militar em 2023, para níveis recordes de US$ 347 bilhões. Neste ano, os gastos devem atingir US$ 380 bilhões, o equivalente a 2% do PIB combinado do bloco. Ele manifestou ainda a expectativa de que 18 dos 31 membros da aliança atingirão a meta de gastar 2% do PIB em defesa, percentual que agora representa o piso. Em 2023, foram apenas 11.

Fortes críticas a Trump vieram do chefe de governo da Alemanha, Olaf Scholz. Segundo ele, questionar o princípio de defesa mútua da Otan, pilar fundamental da aliança, é “irresponsável e perigoso”. A insinuação de que os países da Otan não se defenderiam “afeta a segurança” de todos, incluindo a dos EUA, afirmou ele. A ameaça de Trump reforça a posição da França, que há anos argumenta que a Europa precisa de outra “apólice de seguro” além da Otan.

Segundo alguns analistas, mesmo que todos os membros europeus da Otan atinjam a meta, o continente estará dez anos atrasado para se defender sozinho. Há problemas em cadeias de suprimento e com o protecionismo. Já a Rússia poderia em apenas três anos lançar um ataque a sua vizinhança da Otan.

O balanço do IISS constatou que o conflito no Leste Europeu aumentou os gastos globais com defesa em 9% no ano passado para um recorde de US$ 2,2 trilhões, o maior valor desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Os membros da Otan respondem por metade desse total, com destaque para a Polônia, que se tornou um grande centro militar, investindo 4% do PIB em defesa em comparação com 1,6% da Alemanha. Excluindo os EUA, os membros europeus da Otan aumentaram 32% as despesas com defesa desde a invasão da Crimeia pela Rússia em 2014. O Brasil vem em 14º lugar, logo após a Ucrânia, com gastos de US$ 24,2 bilhões em defesa em 2023, segundo o Balanço Militar, o mesmo valor do Canadá. Os militares brasileiros gostariam de elevar o gasto com defesa para os 2% do PIB da Otan, praticamente dobrando o percentual atual. Mas o perfil de gastos da Otan difere do brasileiro, que destina 80% do valor a despesas com pessoal, ativo e inativo.

O relatório do IISS ainda não reflete totalmente o efeito do conflito no Oriente Médio, embora ressalte a assimetria visível na eficácia do ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro e dos houthis no Mar Vermelho. Em relação ao Leste Europeu, destaca que a Ucrânia tem sido bem-sucedida ao conter a atuação da Frota do Mar Negro da Rússia com o uso de drones, e ataques com aviões-robôs em pontos distantes do território russo. Já em relação à Rússia, contabiliza a perda de 3 mil tanques e o recurso a equipamentos antigos para repor os perdidos. A notícia do novo míssil hipersônico russo vai certamente provocar a revisão da análise do IISS a respeito do poderio do Kremlin e pode causar nova escalada dos gastos globais em defesa. A experiência indica que a corrida armamentista tende a continuar, sem um fim à vista, ainda mais estimulada pelas declarações de Trump.

O imperativo da energia limpa

Folha de S. Paulo

Reduzir emissão de carbono é único meio de evitar desastre planetário; Folha inicia campanha por transição energética

Difícil imaginar setor importante da atividade econômica que cresça com o dinamismo das energias limpas. Assiste-se a um frenesi de investimentos, ainda insuficientes, porém, para destravar uma transição energética capaz de conter o aquecimento global.

Só no ano passado se agregou o equivalente a 36 Itaipus de capacidade de geração de eletricidade por fontes de baixo carbono. A Agência Internacional de Energia prevê que o salto de aportes deva triplicar a geração potencial por fontes limpas até 2030.

Espera-se que energias solar e eólica venham a ser responsáveis por 95% da expansão. As modalidades limpas ultrapassarão o carvão mineral na geração, alcançando 42% da matriz elétrica global.

Eis aí boa notícia para o Brasil, que por seu clima oferece grande potencial de expansão dessas fontes. Espera-se que o país mais que duplique, até 2028, tudo que se instalou delas nos últimos cinco anos.

A matriz elétrica brasileira é uma das mais limpas do planeta, com 80% ou mais de renováveis. O panorama muda quando se considera a energia total, incluindo o setor de transportes, o que reduz essa parcela para 45% —ainda assim notável, diante dos quase 82% de combustíveis fósseis na matriz mundial.

Somente 23% das emissões nacionais de gases do efeito estufa provêm do consumo de energia. Dois terços se originam de desmatamento e agropecuária.

O cenário mundial, do ponto de vista da mudança do clima, é alarmante. Com o predomínio dos fósseis na produção de energia, apesar de todo o investimento, a trajetória atual não se mostra compatível com as metas do Acordo de Paris.

A transformação necessária, gigantesca, gera resistências em setores políticos e empresariais, perspectiva que pode anuviar-se com a ascensão de líderes negacionistas. Mecanismos de mercado, valiosos, serão insuficientes. São imprescindíveis a ação corajosa de governos e o apoio decidido da sociedade.

Esta Folha, que não vê alternativa à energia limpa para evitar um desastre planetário, dá início a uma campanha por sua expansão no país, que envolverá seminários, novas colunas e cobertura intensiva.

Pressão de servidores amplia distorções

Folha de S. Paulo

Negociações salariais no varejo criam benefícios sem estimular produtividade; reforma administrativa ampla é inevitável

A recusa do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em discutir uma ampla reforma administrativa vai se mostrando insustentável diante de demandas crescentes do funcionalismo, que busca benefícios com ameaça de paralisações.

As costumeiras negociações no varejo só ampliarão distorções sem que se resolva o problema de fundo —atender bem o cidadão e ampliar a produtividade do serviço.

O caso da Receita Federal é didático. Após 81 dias de paralisação, auditores do fisco foram vitoriosos e passarão a receber um bônus de produtividade. Mas a benesse pode induzir os servidores a efetuarem mais autuações, em direção contrária ao proclamado objetivo da autarquia de maior cooperação com contribuintes.

Ademais, o adicional é estendido a toda a categoria, não aos trabalhadores mais produtivos, e válido para aposentados e pensionistas —um disparate óbvio.

Mecanismos de incentivo são capturados por todos, quando deveriam ser direcionados aos bons servidores a partir de critérios objetivos de avaliação, que inexistem atualmente no serviço público.

A busca por complementos salariais desconectados dos objetivos do Estado vem se generalizando.

Funcionários do Banco Central ameaçam uma paralisação neste mês em busca de um bônus, que, sem métricas adequadas de avaliação, será mais um novo direito adquirido para toda a categoria.

O Poder Judiciário multiplica seus penduricalhos de forma pouco transparente e com governança viciada. Advogados da União recebem adicionais de sucumbência (quando a parte perdedora numa ação paga as custas), cujos valores deveriam ir para o Estado.

O Ministério da Gestão e Inovação concentra as negociações com as carreiras, mas não conseguirá escapar das pressões do funcionalismo se não abrir espaço para um amplo redesenho do setor.

As medidas necessárias são conhecidas. Unificação de carreiras para maior flexibilidade no uso de recursos humanos, corte nos salários de entrada, hoje elevados no caso do Executivo federal, redução do alcance da estabilidade e regulamentação da avaliação de desempenho prevista na Constituição.

No Legislativo tampouco se vê disposição efetiva. Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, chegou a dizer que o tema precisa avançar. Mas entre palavras e ações há uma grande distancia e, até agora, o foco de Lira está em ampliar seu poder sobre emendas parlamentares.

A reforma administrativa é urgente e uma demanda crescente da sociedade. O governo não pode se render a pressões corporativistas que só ampliam distorções.

Tempo no cárcere

Folha de S. Paulo

Restringir a progressão de pena agrava problemas do abarrotado sistema prisional

Em flerte com o populismo penal, governadores do Sul e Sudeste do Brasil inclinam-se ao endurecimento da legislação penal em preparação para reunião do Cosud, consórcio de Executivos estaduais das duas regiões, a ser realizada no final deste mês em Porto Alegre.

Entre os temas em debate estão "maiores restrições à progressão de regime", segundo o governador anfitrião Eduardo Leite (PSDB-RS). "Há casos de sujeitos que foram presos 20 vezes pelo mesmo crime, ou crime semelhante", afirmou.

Declarações do tipo visam saciar o apelo popular por uma solução fácil para a segurança pública. Contudo, embora fundadas em preocupações legítimas, desconsideram a realidade prisional no país.

O problema aqui não é de pouco encarceramento. Pelo contrário: encarcera-se muito e mal. Ao atingir a marca de 832 mil presos no final de 2022, o país tem a maior população carcerária de sua história, com alta de 257% desde 2000.

O inchaço das prisões não se traduz em melhoria em segurança. Na verdade, alimenta facções criminosas atuantes em penitenciárias por todo o território nacional.

O caráter progressivo da pena é um recurso usado para não manter em regime fechado, à custa do Orçamento público, condenados que não preenchem requisitos para privação de liberdade, além de estimular bom comportamento e facilitar a ressocialização —objetivo da execução penal previsto em lei.

Falhas em casos pontuais não deveriam ditar o fim da progressão e sim a sua melhoria, em especial com verificação do grau de periculosidade do preso. Governadores poderiam investir em mais vagas no regime semiaberto.

O fim da progressão retira um dos incentivos mais elementares para que o preso seja novamente integrado à sociedade. O mesmo se aplica à ideia de extinguir pura e simplesmente a saída temporária de detentos, que tem apoio considerável no Congresso.

Medidas drásticas tendem a ser contraproducentes. Nem a população, que busca segurança pública, nem governadores, que precisar alocar recursos públicos no sistema carcerário, deveriam almejar mais prisões abarrotadas.

O preocupante déficit das estatais

O Estado de S. Paulo

Pouco se sabe sobre o déficit dessas empresas. Uma avaliação mais profunda sobre estatais requer ampla transparência sobre suas receitas, despesas, investimentos e gastos com pessoal

As estatais voltaram a gerar prejuízo para os cofres públicos. Segundo dados divulgados pelo Banco Central (BC), as empresas públicas contribuíram para elevar o déficit primário do setor público consolidado em R$ 2,269 bilhões ao longo do ano passado, algo que não ocorria desde 2016, ano em que o saldo ficou negativo em R$ 1 bilhão. De acordo com o BC, as estatais federais geraram um rombo de R$ 656 milhões; as estaduais, de R$ 1,3 bilhão; e as municipais, de R$ 313 milhões.

Entre as estatais federais, o buraco diz respeito a 22 empresas que dispõem de receitas próprias, como Correios, Infraero, Dataprev, Serpro e PPSA. Embora não dependam do Tesouro para pagar despesas de custeio e pessoal, seu desempenho é levado em conta na apuração do resultado fiscal do setor público. Não fazem parte desse grupo a Petrobras, os bancos públicos e as estatais dependentes do Tesouro, cujas despesas já integram o Orçamento Geral da União (OGU), casos da Embrapa, da Codevasf e outras.

O resultado dessas 22 empresas, por si só, é pouco significativo perante o déficit do setor público consolidado, que atingiu R$ 249,12 bilhões, segundo o BC. O que preocupa é a tendência, que não é nada positiva. Afinal, no intervalo de apenas um ano, as estatais saíram de um superávit de R$ 6,1 bilhões em 2022 para um déficit de R$ 2,269 bilhões em 2023.

Não se sabe se uma estatal em específico teria sido a responsável por puxar os resultados gerais para baixo ou se a piora foi generalizada. Para isso, seria preciso consultar as demonstrações financeiras de cada uma das empresas. O BC, a quem cabe reunir os dados, informou apenas que as companhias precisaram de mais aportes governamentais para cumprir suas atividades e não geraram receitas suficientes para cobrir suas despesas.

Em novembro, a previsão do governo, segundo a ministra de Gestão e Inovação, Esther Dweck, era a de que essas empresas gerariam um déficit de R$ 4,5 bilhões – rombo que, segundo ela, seria bancado com recursos do caixa das próprias companhias, dispensando um socorro por parte do Tesouro.

À época, a ministra enfatizou que boa parte do resultado estaria relacionada à ENBPar, empresa remanescente da privatização da Eletrobras. A exemplo da Petrobras, o resultado da Eletrobras também era excepcionalizado da meta. A explicação da ministra tem sentido, mas não explica todo o quadro.

Somente os Correios, por exemplo, registraram prejuízo líquido de R$ 824,7 milhões nos nove primeiros meses do ano passado. Tampouco se sabe se as empresas que tiveram caixa para cobrir as despesas em 2023 ainda têm fôlego para o caso de os resultados ruins se repetirem neste ano.

Qualquer avaliação mais profunda sobre a real situação dessas empresas estatais demandaria ampla transparência sobre suas receitas, despesas, investimentos e gastos com pessoal. O governo Lula da Silva, no entanto, deixou de divulgar esses dados de forma segregada e individualizada desde que tomou posse.

Tal política não permite mais diferenciar quais empresas têm sido bem ou mal administradas ao longo dos anos, o que pode proteger os maus administradores e penalizar aqueles que fazem um bom trabalho e são julgados pelo resultado ruim do conjunto das estatais.

É bem possível que haja, entre essas empresas, quem possa justificar resultados negativos ocasionados por investimentos – como as embarcações produzidas pela Emgepron. Em outros casos, a própria natureza de sua atividade não visa ao lucro, sobretudo em caso de segurança nacional ou interesse coletivo. Mas, novamente, sem acesso a todas essas informações, é impossível fazer tal avaliação.

Até agora, a falta de dados sobre o déficit das estatais só serviu para alimentar o discurso de quem prega a privatização ou o fechamento de todas as empresas, sem considerar as especificidades ou a necessidade de cada uma delas. A oposição, por óbvio, aproveitou o ensejo para acusar o governo de retomar práticas de corrupção que marcaram a Petrobras no passado recente. Se esses argumentos não bastam, é bom lembrar que transparência não é favor, mas dever da administração pública.

Internet insegura

O Estado de S. Paulo

Número recorde de denúncias de abuso e exploração sexual infantil online no Brasil reforça a necessidade de regulação das plataformas digitais, sem ignorar a supervisão dos pais

O Brasil registrou um número recorde de denúncias de abuso e exploração sexual infantil, segundo dados da SaferNet, organização não governamental que trabalha contra crimes e violações aos direitos humanos na internet. Foram mais de 71 mil queixas em 2023, quase 80% a mais do que no ano anterior e o mais elevado patamar desde que a ONG abriu um canal de denúncias de crimes cibernéticos, 18 anos atrás – demonstração inequívoca de que há algo muito perturbador no ambiente digital do País. Ainda que tenham crescido de maneira significativa os crimes de ódio online (entre os quais xenofobia e intolerância religiosa), os dados emitem o alerta definitivo de que estamos falhando especialmente na proteção de crianças e adolescentes e no enfrentamento à violência sexual na internet.

O canal recebeu mais de 100 mil denúncias para pelo menos nove tipos de crimes na internet que envolvem direitos humanos, incluindo também xenofobia, apologia e incitação a crimes contra a vida, LGBTfobia e misoginia. Algo gravíssimo para um país que é um dos líderes globais em consumo de internet e presença digital, sendo o 5.º lugar em número de usuários de internet e o 2.º maior em tempo gasto online.

Segundo especialistas, o crescimento das denúncias de imagens de abuso e exploração sexual infantil online se deveu, sobretudo, a três fatores: demissões em massa anunciadas pelas chamadas Big Techs, que atingiram as equipes de segurança, integridade e moderação de conteúdo em algumas plataformas; a proliferação da venda de pacotes com imagens de nudez e sexo autogeradas por adolescentes; e a introdução da inteligência artificial (IA) generativa para a criação desse tipo de conteúdo, com o avanço de ferramentas que criam imagens por IA a partir de comandos de texto. Neste último caso, parte do conteúdo alvo de denúncias não é de crianças reais, mas reproduz menores de idade em situações de abuso.

Nem por isso menos grave. Infelizmente têm sido cada vez mais comuns episódios envolvendo crianças e adolescentes expostas, vítimas de colegas que usaram a IA para modificar as fotos das meninas. São situações que reafirmam a fragilidade dos mecanismos de segurança, integridade e moderação das plataformas digitais. Não à toa os CEOs das Big Techs foram chamados há algumas semanas para se explicar diante de congressistas norte-americanos e parentes de vítimas de abuso infantil cometido no ambiente digital. Documentos internos da Meta, empresa proprietária do Instagram, Facebook e WhatsApp, mostraram que o CEO, Mark Zuckerberg, rejeitou pedidos para aumentar recursos que assegurariam maior segurança infantil online.

Números, denúncias e relatos no Brasil, nos Estados Unidos ou na Europa demonstram a necessidade urgente de serem criados mecanismos mais claros de fiscalização e responsabilização das empresas pelo conteúdo publicado em suas plataformas. Se já era um problema grave antes, a revolução da IA requer pressa e atenção ainda maiores – com uma legislação que ao mesmo tempo permita o desenvolvimento dessa tecnologia em larga escala e proteja a sociedade. Apesar de ser uma tecnologia nova e o debate, incipiente, há iniciativas regulatórias propostas por organizações como a Unesco e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) visando a desenvolver e regular o uso da tecnologia, com respeito à privacidade e proteção dos dados pessoais, com a adoção de um regime de responsabilidade e requisitos de segurança e transparência.

Não é uma tarefa trivial e para ela estão convocados também pais e responsáveis por crianças e adolescentes. Como afirmou o presidente da SaferNet no Brasil, Thiago Tavares, “é quase como um abandono digital o ato de entregar um celular ou um tablet para uma criança sem supervisão”. Não se trata de criminalizar as redes sociais, muito menos de abolir ou reduzir seu uso, mas de regular e aperfeiçoar os mecanismos de controle e responsabilização contra crimes já previstos na legislação brasileira, dentro ou fora do ambiente digital. O que não pode é o mundo passar a enxergar nas redes sociais uma espécie de território sem lei ou propício a crimes de difícil punição.

Oposição irresponsável

O Estado de S. Paulo

STF contraria governantes bolsonaristas que insistem em sabotar a vacinação contra covid

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin suspendeu decretos de 19 municípios de Santa Catarina que haviam dispensado a exigência de vacina contra a covid-19 para a matrícula de estudantes na rede pública de ensino. A acertada decisão, em caráter liminar, se deu em uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), impetrada pelo PSOL.

A decisão era mais do que esperada. O STF já havia decidido sobre a questão em um julgamento de repercussão geral em 2021, que referendou a obrigatoriedade de vacinas que tenham sido incluídas no Programa Nacional de Imunizações (PNI). “Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar.”

É esse o caso da vacina contra a covid-19, incluída em dezembro no Calendário Nacional de Vacinação Infantil, parte do PNI. A decisão, do Ministério da Saúde, teve como base uma nota técnica que recomendou a aplicação prioritária em crianças de seis meses a cinco anos de idade, grupo que tem registrado o maior número de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e cujo índice de mortalidade tem aumentado desde 2022.

Fossem tempos normais, seria de impressionar que tantos prefeitos estivessem dispostos a violar escancaradamente princípios constitucionais e disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ignorando inclusive que a função de proteger crianças e adolescentes cabe a toda a sociedade e, em especial, ao Estado.

Mas não é coincidência ou acaso que os decretos ora impugnados tenham sido publicados por tantos prefeitos. Eles foram orquestrados pelo governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), que anunciou, em suas redes sociais, que a vacinação não seria mais obrigatória para alunos e professores no Estado.

O oportunismo político de Jorginho Mello só não é maior que o medo de ser responsabilizado juridicamente por seus atos. Não por acaso, embora tenha divulgado o vídeo, o governador não publicou qualquer ato para tornar seu anúncio oficial, deixando a operacionalização da medida aos prefeitos de sua base. Limitou-se a dizer que as escolas não poderiam recusar a matrícula de alunos que não estivessem com as vacinas em dia, algo que, por sinal, elas nunca fizeram – nem poderiam fazer.

Jorginho Mello não foi a única autoridade a fazer proselitismo com uma questão de saúde pública. O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), foi às redes sociais para fazer um pronunciamento semelhante. Zema disse que as crianças teriam a oportunidade de aprender ciência nas escolas para então decidir, no futuro, se seriam ou não vacinadas.

Por mais que essas declarações não tenham qualquer efeito prático, não deixa de ser melancólico que tantas autoridades públicas tenham feito da vacinação um inimigo. Mais do que isso, parece proposital que os governadores criem polêmicas desnecessárias para desviarem de problemas reais que cabem aos Estados resolver, sobretudo a segurança pública. A sociedade merece uma oposição mais responsável.

A dengue segue seu caminho

Correio Braziliense

Embora a vacina tenha sido incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS) em dezembro do ano passado, é bem provável que o calendário vacinal não seja totalmente coberto até o final deste ano

Distrito Federal, Minas Gerais, Acre, Paraná e Goiás concentram os maiores coeficientes de incidência de dengue no país, que ao todo registrou 555.583 casos prováveis da doença, segundo o Painel de Monitoramento das Arboviroses do governo federal, divulgado no último sábado (17). Somente no estado de São Paulo são mais de 90 mil pessoas que podem ter sido contaminadas pelo Aedes aegypti.

Mais uma vez vamos passar por todo aquele processo que já estamos cansados de saber: agentes de saúde nas ruas e nas casas das pessoas, governos e prefeituras organizando campanhas informativas, a imprensa cobrindo os números de casos e óbitos e a população que combina quem leva a sério o chamado e quem não está nem aí para a água parada e os lotes malcuidados.

Há, ainda, a parte científica em andamento, ou seja, vários estudos de nobres cientistas brasileiros, que fazem um trabalho magnífico na tentativa de combater a proliferação do mosquito, com algum sucesso, mas nada ainda vultuoso. Uma das pesquisas, inclusive, completou uma década há pouco.

As autoridades de saúde estão tão assustadas com a inclinação da linha que contabiliza os casos em tão pouco espaço de tempo, a ponto de o secretário de estado de Saúde de Minas afirmar que "este será o pior ano da dengue da nossa história", disse em coletiva, na sexta-feira (16).

A japonesa Qdenga, segunda vacina aprovada pela Vigilância Sanitária (Anvisa) — a primeira foi a francesa Dengvaxia, mas além de mais cara —, tem três doses e é destinada apenas a quem já teve dengue pelo menos uma vez, terá quantidade restrita no Brasil e, por isso, tem sido fornecida lentamente pelo Ministério da Saúde.

Embora a vacina tenha sido incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS) em dezembro do ano passado, é bem provável que o calendário vacinal não seja totalmente coberto até o fim deste ano. Mesmo porque, são necessárias duas doses da vacina, com intervalo de três meses entre uma e outra para que ela surta efeito. E os casos estão crescendo exponencialmente agora. Não há mais tempo.

Além disso, os infectologistas afirmam que a contaminação pode ocorrer entre três a 10 dias e, diante do carnaval, que acabou há menos de uma semana (tem gente ainda se despedindo da folia) na maior parte do país, a previsão dos especialistas é que as próximas semanas sejam de intenso contágio, já que os foliões podem ter sido infectados sem que nem tenham percebido durante a festança.

Vários estados estão em alerta. Diante desse cenário, é fundamental ficarmos atentos aos sinais da doença, como febre alta de início repentino, dor nas articulações e atrás dos olhos, apatia, náusea, falta de apetite e manchas espalhadas pelo corpo. Caso sejam registrados dois ou mais sintomas, procure o médico. Não deixe a dengue tomar conta. Em breve, saberemos como o mosquito vai se comportar. De resto, as águas de março estão próximas e as altas temperaturas se mantêm, combinação perfeita para que novos criadouros de Aedes aegypti se formem.

 

2 comentários:

  1. Bolsonaristas continuam CONTRA AS VACINAS
    "O ministro do STF Cristiano Zanin suspendeu decretos de 19 municípios de Santa Catarina que haviam dispensado a exigência de vacina contra a covid-19 para a matrícula de estudantes na rede pública de ensino. ... Mas não é coincidência ou acaso que os decretos ora impugnados tenham sido publicados por tantos prefeitos. Eles foram orquestrados pelo governador de SC, Jorginho Mello (PL), que anunciou, em suas redes sociais, que a vacinação não seria mais obrigatória para alunos e professores no Estado. ...
    O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), foi às redes sociais para fazer um pronunciamento semelhante. Zema disse que as crianças teriam a oportunidade de aprender ciência nas escolas para então decidir, no futuro, se seriam ou não vacinadas. ...
    Não deixa de ser melancólico que tantas autoridades públicas tenham feito da vacinação um INIMIGO. Mais do que isso, parece proposital que os governadores criem polêmicas desnecessárias para desviarem de problemas reais que cabem aos estados resolver, sobretudo a segurança pública."

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  2. Li tudo,fica até difícil comentar tantos assuntos,obrigado pelo post.

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