domingo, 10 de março de 2024

Cacá Diegues - A esplêndida história da Humanidade

O Globo

Somos constantemente ameaçados pelas mudanças climáticas que nós mesmos provocamos, a população do planeta segue crescendo e não temos como evitá-lo, as guerras destrutivas como as da Ucrânia e no Oriente Médio se repetem por toda parte, parece até que curtimos essas desgraças 

Acabo de mandar uma mensagem eletrônica para um grande amigo meu que sabe dessas coisas. Eu lhe dizia que os sinos da Academia estão batendo até agora com grande euforia por causa da eleição de Lilia Schwarcz. Ela é a mais nova acadêmica e ocupa a cadeira nº 9, onde esteve o querido Alberto da Costa e Silva, que nos honrou e ensinou durante anos com seus conhecimentos obtidos com a Diplomacia, na Literatura e na História do Brasil. “Minha candidatura é uma homenagem ao dr. Costa e Silva”, disse ela com modéstia, “ele sempre foi meu pai espiritual, meu pai intelectual, gostaria muito de seguir seus passos, e a ABL é fundamental para isso, como é fundamental para nossa memória nacional”. Os sinos continuam portanto a bater.

Lilia traz para a Academia, além desse olhar novo e ao mesmo tempo respeitoso, um espírito original que ela desenvolveu bastante com seus estudos de Antropologia e seus livros sobre a História do país, visto como um território de futuro. Uma nação que tinha (e tem) o dever de uma enorme correção social para o bem de todos.

Tenho a impressão de que a Academia se atualiza com esses problemas como os que Lilia expunha em sua campanha e seus interesses culturais que ela confirma até hoje. A chegada dela na Academia corresponde ao mesmo ímpeto. Uma instituição que perdeu recentemente uma pessoa como Nélida Piñon não pode seguir reclamando do destino diante de conquistas como as de Heloisa Teixeira e, agora, Lilia Schwarcz.

Mas está também na hora de se parar para pensar no destino da Humanidade. Ou para ser mais específico no destino do Homo Sapiens. Nosso sucesso como espécie não pode ignorar nosso futuro incerto, as dificuldades com que convivemos depois de milênios de vitórias incontestáveis diante dos neandertais ou dos denisovanos.

Deixamos a África modestamente, de barco ou a nado, fomos enfrentar nossos parecidos na Ásia e no Mar da China, fomos até a insípida e sombria Europa para garantir e confirmar essas vitórias, em 40 mil anos derrotamos todos eles. Temos agora que resolver esse problema crucial: como vencer mais essa etapa, não se trata mais de superar um inimigo presente ou futuro, mas de se estabelecer no mundo real como somos agora. Não queremos mais passar a perna em ninguém, mas simplesmente garantir nosso futuro nesse mundo em que podemos desaparecer.

Somos constantemente ameaçados pelas mudanças climáticas que nós mesmos provocamos, a população do planeta segue crescendo e não temos como evitá-lo, as guerras destrutivas como as da Ucrânia e no Oriente Médio se repetem por toda parte, parece até que curtimos essas desgraças todas porque deixamos que elas aconteçam sem reagir. Enquanto isso o progresso de nossa passagem pelo mundo parece se interromper na injusta divisão social dos países. Mesmo as nações mais ricas não conseguem resolver a questão interna crucial para a sobrevivência de todos eles.

Enfim, nossa Lilia não tem nada a ver com isso, ela segue no rumo correto de sua participação no conhecimento e na cultura, brilhará certamente com esses instrumentos à mão e se tiver que afundar nessas histórias todas vai afundar sem culpa e sem restrições. Somos nós todos que temos que pensar no futuro incerto, nessa incapacidade de resolver a questão central: o que fazer para manter o Homo Sapiens no planeta, sem subestimar seu papel em tudo isso?

Podemos imaginar as gerações futuras reunidas em torno da batalha por um novo projeto humanista, como podemos simplesmente vê-las sem saber o que fazer diante do que necessitam. A ABL, agora com nossa Lilia, seguirá seu rumo ajudando-nos no que for possível. Os sinos não vão parar de bater!


Um comentário:

  1. Agora eu sei por quem os sinos dobram.Em tempo,não sabia da morte de Nélida Piñon.

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