Valor Econômico
Dentro da equipe econômica, a declaração do
presidente Lula acendeu sinais de alerta, mesmo se tratando de fala política
Pode parecer estranho, neste momento em que
se fala em bloqueio de despesas do Orçamento, mas não é impossível que o
governo anuncie, em maio, uma expansão de gastos de R$ 15 bilhões a R$ 20
bilhões. Embora já previsto na lei do arcabouço, é algo que pode se misturar
com as reações do governo ao cenário negativo mostrado por recentes pesquisas
de opinião.
Se a arrecadação seguir forte como o visto
neste início de ano e se for possível projetar, até dezembro, um resultado
fiscal melhor do que um déficit de R$ 28 bilhões (o que indicará o cumprimento
da meta dentro da margem de tolerância), poderá haver um crédito suplementar ao
Orçamento.
São hipóteses bastante otimistas, mas consideradas factíveis por fonte da área técnica. É uma possibilidade válida apenas para este ano.
Essa expansão das despesas está no radar da
equipe econômica desde o ano passado. Atualmente, vigora um limite menor apenas
porque o Congresso não quis dar ao Executivo, de cara, a possibilidade de
aumentar seus gastos no máximo permitido pela nova regra fiscal: 2,5% sobre o
ano anterior
Numa interpretação camarada, integrantes do
governo dizem que era a esse dispositivo especial do arcabouço que o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva se referia quando disse, na semana passada, que
poderia discutir com o Congresso a elevação do limite de despesas. O uso dos
recursos extras passaria de fato pelo crivo do Legislativo.
Mas não foi todo mundo que entendeu assim.
Dentro da equipe econômica, a declaração do presidente acendeu sinais de
alerta, mesmo se tratando de uma fala política. Numa interpretação literal, ele
poderia estar sugerindo a revisão da regra geral para despesas do arcabouço - e
não sobre a especificidade de 2024. Nesse caso, teria atacado o ponto do
arcabouço que garante despesas crescendo ao ritmo de 70% das receitas.
“Lógico que nós temos um limite de gastos,
que quando a gente tiver mais dinheiro a gente vai ter que discutir com a
Câmara e o Senado esse limite de gastos e vamos ver como é que a gente pode
utilizar mais dinheiro para fazer mais benefício para o povo”, disse Lula.
A sombra de dúvida surge num momento em que
as medidas propostas para elevar receitas estão surtindo efeito e dando corpo à
regra fiscal. “Fundo exclusivo, que todos os governos tentaram desde 2017, veio
acima do esperado, e offshore deve vir forte também no mês de abril”, diz o
economista-chefe da AZ Quest, Alexandre Manoel. Ele avalia que o pacote para
elevação das receitas, direcionado para remover distorções do sistema
tributário, tem funcionado.
Também no governo, acredita-se que as novas
regras de tributação para fundos exclusivos e fundos offshore trarão aos cofres
públicos mais do que os R$ 20 bilhões previstos originalmente. Há quem fale em
R$ 30 bilhões.
No entanto, acrescenta Manoel, o ajuste
fiscal propiciado pelo novo arcabouço não pode ser feito só com receitas
adicionais. “Vão ter de segurar a despesa e reformar algumas delas; se não
fizer isso, arcabouço não se sustenta.”
Cortar despesas, porém, nada tem de popular.
Se até agora a realização de eleições municipais em 2024 era um obstáculo de
peso às pautas, o crescimento das avaliações negativas do governo pode
intensificar ainda mais as dificuldades. O Ministério do Planejamento sinaliza
com a revisão de programas como o Programa de Garantia da Atividade
Agropecuária (Proagro) e o seguro-defeso, além de um pente-fino nos benefícios
do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Do ponto de vista estrutural, porém, seria
necessário enfrentar debates difíceis, como a revisão dos gastos mínimos com
saúde e educação. Essas despesas crescem a um ritmo superior ao limite do
arcabouço, por isso tendem a comprimir as demais áreas de governo.
Mesmo pelo lado das receitas, há pontos de
dúvida. Houve frustração, por exemplo, com a arrecadação esperada com a volta
do desempate, a favor do governo, nas disputas no Conselho Administrativo de
Recursos Fiscais (Carf), aponta Manoel.
Além disso, as propostas mais recentes pelo
lado das receitas estão sendo renegociadas. Da Medida Provisória (MP) 1.202, o
governo já revogou a volta parcial da cobrança de contribuições previdenciárias
sobre 17 setores intensivos em mão de obra, para reapresentá-la como projeto de
lei. Parte da mesma MP, a revogação do Programa Emergencial para Recuperação do
Setor de Eventos (Perse) foi trocada por uma revisão de seu escopo, para
reduzir o valor da renúncia fiscal.
O único ponto que ainda não levantou
resistências mais fortes no Congresso Nacional foi a limitação das compensações
tributárias para empresas que têm mais de R$ 10 milhões a receber do governo.
No entanto, o tema é acompanhado com atenção pelas grandes empresas. A medida
já foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).
Embora o retrato de momento mostre um quadro
menos ruim do que o esperado para as contas públicas, o ajuste fiscal ainda
está por ser construído. Mesmo sutil, o lançamento de dúvida sobre um de seus
pilares de sustentação é mau sinal.
''Seguro-defeso'',vou procurar o que é isso,rs.
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