O Globo
Copom avisa que outro corte de meio ponto só
ocorrerá mais uma vez, mas a inflação baixa e a atividade não justificam isso
Em vez de dizer que fará cortes da mesma magnitude “nas próximas reuniões”, o Banco Central escreveu que é apenas “na próxima reunião”. O plural fez falta. Ninguém tinha dúvidas de que o Banco Central reduziria a taxa de juros em meio ponto, para 10,75%. A dúvida estava no comunicado e ele veio com essa novidade. Avisou que o ritmo de queda pode ser reduzido. Em 8 de maio, a taxa deve cair para 10,25%. Mas, em junho, a queda será menor que meio ponto. Se cumprir isso estará na seguinte situação, exatamente em junho quando se espera que o FED reduza os juros, o BC brasileiro pode estar fazendo o movimento no sentido contrário. “É um erro fazer essa mudança agora”, avalia o economista José Roberto Mendonça de Barros. “Tem muito chão para baixar a Selic mesmo que não chegue a 9%”.
A inflação subiu mais forte em fevereiro,
0,83%, mas por motivos absolutamente sazonais. Tanto que no cenário de
referência do BC, a inflação fica em 3,5% este ano e 3,2% em 2025. No horizonte
com o qual a política monetária trabalha a inflação estará muito perto do
centro da meta.
Na semana passada, o governo fez uma reunião
para discutir a inflação de alimentos, preocupado com os índices de
popularidade, mas na avaliação de Mendonça de Barros essa preocupação veio
tarde. Com a entrada da safra de verão, os preços de alimentos começarão a
cair.
— A gente pode ir de produto a produto, mas
no conjunto a tendência é de queda na ponta final. Um resumo: no arroz os
preços estão muito altos ainda no atacado, 30% mais altos que no ano passado,
mas na última semana caíram 14%, o feijão está com preço parecido com o do ano
passado, mas na última semana caiu 5,4%, o tomate também está caindo. A batata
está sim com os preços bem altos, mas começando a reduzir. Cebola está
pressionada porque acabou a safra do Rio Grande do Sul e não entrou a safra de
Santa Catarina, e ainda depende de importação. A carne no atacado está com
preço muito baixo, o varejo é que está mantendo a maior margem histórica. Mas
já começou a derrubar um pouco neste começo do ano. Na parte das hortaliças é o
de sempre, quando chove, sobe o preço, se normaliza volta a se equilibrar.
Banana está com preço muito alto por causa do calor. Chuvarada quando pega no
bananal perde tudo. No conjunto dá para dizer que entrando a safra de verão a
cesta de produtos de alimentação, começa a cair. O pessoal da MB Agro estima
este ano que a elevação de alimentação no domicílio ficará em 3,5%, para 3,6%
de inflação geral. Não é isso que vai puxar —diz o economista.
Este começo de ano tem trazido bons
indicadores de nível de atividade, exceto para a indústria que continua
encolhendo. Os serviços
cresceram 0,7% em janeiro e o comércio, 2,5%. Os dados da PNAD
mostraram um mercado de trabalho mais aquecido do que na virada de 2024.
Compilando dados publicados na imprensa, o Bradesco informou ontem que os
investimentos anunciados nas últimas semanas ultrapassam R$ 66,7 bilhões. Houve
um aumento forte de arrecadação em janeiro e fevereiro reduzindo a necessidade
de contingenciamento do orçamento.
Há um ambiente de moderado otimismo no país,
em que é muito frequente a aposta de que o crescimento será maior do que tem
sido projetado pelo Focus
que está em 1,8% e subindo a cada reunião. Uma alta do PIB de
2% a 2,5%, previsto por vários economistas, não chega a ser um ritmo que traga
ameaças inflacionárias, a ponto de se reduzir o ritmo de queda já na reunião de
junho.
A queda dos juros chegou a três pontos
percentuais em seis reuniões. Estava em 13,75% e agora está em 10,75%. Mas
aquela taxa de juros foi calibrada para uma inflação que estava em dois
dígitos. Por inúmeras razões da conjuntura, o BC demorou a começar a cortar. E
já está avisando, por decisão unânime, que corte de meio ponto só ocorrerá mais
uma vez. Isso indica que as reduções devem ficar em torno de 0,25 ponto
percentual daí em diante. Esse recado deve fazer com que os bancos e as
consultorias revejam suas previsões de até onde a Selic vai cair.
De qualquer maneira, o corte da magnitude que
ocorreu até agora e a indicação de que a queda continua, com mais meio ponto,
em maio, e cortes menores de junho em diante, mantêm o relaxamento do aperto
monetário. E em parte essa queda é que está permitindo um ano mais positivo do
que o previsto.
Ainda bem.
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