Folha de S. Paulo
Comércio, serviços, emprego, mercado de
capitais e receita do governo vão melhor do que o previsto
O jorro de provas
de que Jair Bolsonaro tramava o golpe ofuscou notícias de surpresas
positivas na economia.
Parece mais provável que se chegue neste 2024 pelo menos a um crescimento
melhorzinho do que o previsto no final do ano passado: 2% em vez de 1,5%.
São dados apenas de janeiro, sim. Também não
podemos nos acostumar a tão pouco —mais sobre isso mais adiante.
O crescimento de 2% parece bom porque somos
um paciente que apenas tenta se levantar da cama, muito doente faz dez anos,
alguns deles em coma, ainda cheio de males que precisam de tratamento profundo.
Mas vamos falar das notícias de que podemos dar mais uns passinhos claudicantes
neste ano.
As vendas do comércio e o faturamento do
setor de serviços em janeiro cresceram
mais do que a previsão mais otimista.
Foi assim também com a criação
de empregos formais, pelos registros do Ministério do Trabalho. Os dados do
IBGE, sobre o total de empregos e salários, haviam saído faz duas semanas, bons
também. A nota negativa ficou com a queda da produção industrial, no entanto
nem tão ruim quanto a prevista.
A arrecadação do governo deve ter aumentado de novo, segundo estimativa do Ipea, o instituto federal de pesquisa econômica. Em fevereiro, a receita líquida do governo teria crescido mais de 20% em relação a fevereiro do ano passado, em termos reais (acima da inflação).
No primeiro bimestre, o crescimento teria
sido de 8,6%. É tanto um sinal de atividade econômica razoável quanto
perspectiva de redução de déficit.
As empresas voltaram a tomar mais dinheiro
emprestado no mercado de capitais, indício de que têm alguma expectativa de
melhoras. O primeiro bimestre de 2023 havia sido desastroso por causa dos
crimes na Americanas,
do medo de calotes de empresas, juros horríveis
e sururu nos EUA.
Na semana passada, a previsão de crescimento
do PIB dos
economistas do Itaú passou de 1,8% para 2% em 2024, a mesma estimativa dos
economistas do Bradesco.
Os motivos mais novos e imediatos desse
desempenho melhorzinho podem ser o pagamento de precatórios (caloteados pelo
governo das trevas, 2019-2022), a redução do endividamento das famílias (graças
a aumentos de renda em 2023 e a renegociação de dívidas) e juros algo menores.
Uma grande incógnita é o que será do
investimento em novas casas, instalações produtivas, máquinas, equipamentos,
"softwares" etc. Depende de taxas de juros, mas também de
estabilidade política e econômica, de perspectiva de crescimento. É em parte
insondável, mas daí pode sair um crescimento maior do PIB. No mais, dependemos
de preços de commodities e dos juros nos EUA.
Crescer 2%, porém, é alegria de pobre. De
2017 a 2019, crescemos a 1,4% ao ano. O crescimento de 2021 (4,8%) e 2022 (3%)
apenas levou o PIB ao nível em que estaria se continuasse no ritmo miserável de
2017-2019, interrompido pelo tombaço da epidemia em 2020.
Apenas em 2023 ficamos um pouco acima dessa
"curva" de aumentinhos do PIB. Mas é um ritmo ainda inferior ao da
média mundial. Muito abaixo da média aritmética de 4,1% ao ano de Lula 1 e 2.
Vivemos da mão para a boca.
Nossa infraestrutura de transporte é tão
escassa ou primitiva que não temos propriamente um mercado nacional, uma
economia integrada. Ainda por muitos anos teremos um sistema de impostos e
subsídios que limita essa integração e que estimulou muito investimento
ineficiente.
O gasto público cresceu muito e estamos
queimando recursos naturais (petróleo, minérios) sem aumentar a taxa de
investimento. O PIB grosso modo flutua com o preço de commodities (comidas,
petróleo, minérios). A economia ainda é fechada para exterior. Não falamos a
sério de educação de crianças e de pesquisa científica. O de sempre.
É melhor, claro, que o doente tenha acordado
e dê uns passinhos. O tratamento da recuperação ainda mal começou.
Verdade.
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