quarta-feira, 17 de abril de 2024

Bernardo Mello Franco – Guerra perdida

O Globo

Pacheco apresentou proposta para confrontar STF e ganhar pontos com extrema direita

O Senado descobriu uma solução mágica para acabar com o problema das drogas. Vai mudar a Constituição para deixar claro que elas são proibidas.

Proposta aprovada ontem considera crime a posse e o porte de qualquer quantidade de entorpecente. Os bolsonaristas festejaram a votação como um feito patriótico.

“O Brasil é uma nação que preza pela moralidade e pela valorização da família”, celebrou Wilder Morais. “O país pode ficar tranquilo, porque nós não vamos permitir a liberação de drogas”, congratulou-se Plínio Valério.

A pretexto de endurecer com o crime, o texto dificulta ainda mais a distinção entre usuários e traficantes. Isso abre caminho para equiparar o jovem pego com um cigarro de maconha ao quadrilheiro flagrado com contêineres de cocaína.

Apesar das aparências, a chamada PEC das Drogas não é ideia da bancada da bala. Foi apresentada pelo presidente do Senado, que busca marcar posição contra o Supremo e ganhar pontos com a extrema direita.

Rodrigo Pacheco acelerou a votação para se contrapor à Corte, que estudava descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. O julgamento está paralisado por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

A proposta aprovada pelo Senado é puro populismo penal. Promete repressão e cadeia para o que deveria ser encarado como uma questão de saúde pública.

Criticado pela academia, o senador disse ontem que o usuário “não será jamais penalizado com o encarceramento”. Então não haveria por que criminalizar o porte de pequenas quantidades de droga.

A votação foi embalada por muitas frases de efeito e poucos argumentos racionais. O relator Efraim Filho garantiu que a descriminalização levaria “ao aumento do consumo e à explosão da dependência química”. Não citou um único estudo que embasasse a afirmação peremptória.

“Nós estamos numa guerra. Numa guerra contra as drogas”, pontificou a pastora Damares Alves. Se é assim, fatos e evidências científicas podem ficar para depois.

 

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