quarta-feira, 17 de abril de 2024

Bruno Boghossian - O pedágio ficou mais caro

Folha de S. Paulo

Programa baseado em receitas e cobiça no governo e no Congresso ajudam a explicar mudança de meta

Na semana passada, o governo e a Câmara negociaram uma gambiarra para liberar um espaço de R$ 15,7 bilhões no Orçamento. Parte do dinheiro saiu da votação fatiada. Uma parcela engordaria as emendas parlamentares, outra seria usada para desbloquear a verba de ministérios, e um naco era reivindicado para aumentar salários de servidores.

As metas de Fernando Haddad para ajustar as contas do governo sobreviveram enquanto o ministro conseguiu sustentar um arranjo caro. Era preciso equilibrar o veto de Lula a um corte amplo de despesas, controlar o apetite de ministros por mais gastos e pagar pedágios constantes à base que ajudava a manter de pé o plano no Congresso.

O custo político desse acerto se tornou alto demais nos últimos meses. A insistência num modelo de ajuste baseado no aumento de receitas, alguns erros de cálculo de Haddad e a cobiça permanente de integrantes do governo e do centrão ajudam a explicar a decisão do ministro de rever a trajetória fiscal, adiando o aperto das contas do governo.

Lula nunca autorizou um ajuste à base de tesouradas. Até aí, o ranger de dentes em quase todos os cantos do mercado financeiro era previsível. Mesmo assim, Haddad se pendurou numa meta considerada ousada para segurar as contas, a partir de um quebra-cabeças de medidas que lhe dariam algum conforto pelo lado da arrecadação.

Cada centavo que pingava no cofre do ministro ressoava no restante da Esplanada e nos gabinetes parlamentares. O som passou a ecoar mais alto no início de um ano com eleições municipais, ameaças de greve no governo federal, popularidade presidencial aos soluços e um Congresso disposto a cobrar sua fatura.

Haddad decidiu afrouxar a meta por puro realismo, é verdade, mas também porque essa seria a única maneira de manter controle sobre o que entra e o que sai daquele cofre. Para azar do ministro, seus colegas no governo e no Congresso já conseguem ouvir o tilintar que os novos números podem proporcionar.

 

Um comentário: